PROJETO DE LEI N.°38/06

 

Fica proibido, no território do Estado do Ceará, o corte de energia elétrica e/ou de água por motivo de inadimplência.

 

A ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ

 

DECRETA:

 

Art. 1.° Fica proibido, no território do Estado do Ceará, o corte de energia elétrica e/ou de água por motivo de inadimplência, através da Companhia Energética do Ceará – COELCE, e Companhia de Água e Esgoto do Ceará – CAGECE, a que se referem os arts. 22 e 42 do Código de Defesa do Consumidor e art. 16, inciso VIII da Constituição Estadual.

 

Parágrafo único. O corte de energia elétrica e/ou somente poderá ser efetivado por Ordem Judicial.

 

Art. 2.° O Ministério Público do Estado do Ceará, por intermédio do Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor – DECON, fiscalizará o cumprimento do artigo anterior conforme a Lei Complementar Estadual n.° 30, de 26 de julho de 2002. 

 

Parágrafo único. A Agência Reguladora dos Serviços Públicos Delegados do Estado do Ceará – ARCE, também fiscalizará o cumprimento desta Lei sobre os serviços públicos delegados à Companhia Energética do Ceará – COELCE e Companhia de Água e Esgoto do Ceará – CAGECE nos termos do art. 3.° e

art. 5.° incisos II e V da Lei n.° 12.786, de 30 de dezembro de 1997, aplicando-lhes as penalidades previstas em lei.

 

Art. 3.° Em caso de descumprimento do disposto do art. 1.° desta Lei serão aplicadas as penalidades previstas na Lei Complementar n.° 30, de 26 de julho de 2002, que reverterão ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos do Estado do Ceará – FDID, nos termos do art. 3.° da  Lei Complementar Estadual n.° 46, de 15 de julho de 2004.

 

Art. 4.° Está Lei entra em vigor na data de sua publicação.

 

Art. 5.° Revogam-se as disposições em contrário.

 

SALA DAS SESSÕES, 27 de março de 2006.

 

 

 

 

Deputado Moésio Loiola

Presidente da CDC

 

 

 

JUSTIFICATIVA

 

 

Pacificou-se o entendimento nas agências reguladoras, através da Resolução n.° 456, de 29 de novembro de 2000, editada pela Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL de que as concessionárias dos serviços públicos de água e energia elétrica poderiam efetuar corte de seus serviços por motivos de inadimplência.

 

No entanto, o Brasil tem o Código de Defesa do Consumidor, como norma protetora e de equilíbrio nas relações de consumo que preceitua nos arts. 22 e 42 o seguinte:

 

“Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.”

 

Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.”

 

Ora, nobres parlamentares, a simples leitura dos textos acima não deixa qualquer dúvida quanto a ilegalidade no corte dos serviços essenciais como água e luz, tanto quanto a ilegalidade de dubiedade na aplicação de sanções por inadimplência, pois o consumidor, além de pagar os acessórios de multa e juros moratórios, tem o serviço cortado.

 

Além do que, é simples a aplicação da sanção do corte do serviço, quando legalmente essas concessionárias deveriam buscar a cobrança dos valores devidos por intermédio de ações judiciais, sejam elas de execução ou de cobrança. A partir daí, poderia arrestar ou penhorar bens dos inadimplentes.

 

Por outro lado, essa medida impositiva e coercitiva dificulta o pagamento do débito pelo consumidor inadimplente, pois é praxe das concessionárias exigirem o pagamento inicial de 30% (trinta por cento) do valor do débito para firmarem qualquer acordo, conforme testemunhamos no PROCON/Assembléia.

 

Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça já assentou entendimento jurisprudencial no sentido de que:

 

    ADMINISTRATIVO     . CORTE NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTE JURISPRUDENCIAIS. AGRAVO REGIMENTAL. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTOS PARA INFIRMAR A DECISÃO AGRAVADA. DESPROVIMENTO.

1.      O corte no fornecimento de energia elétrica, como forma de compelir o usuário ao pagamento da tarifa ou multa, extrapola os limites da legalidade e fere a cláusula pétrea que tutela a dignidade humana. Precedentes do STJ. 2. Ausência de motivos suficientes para a modificação do julgado. Manutenção da decisão agravada. 3. Agravo regimental desprovido. (STJ Acórdão AGA 478911/RJ, 1ª Turma, Relator: Ministro Luiz Fux, DJ, 19/05/2003, pg 144).”

 

“ SERVIÇO PÚBLICO - ENERGIA ELÉTRICA - CORTE NO FORNECIMENTO - ILICITUDE.

I - É viável, no processo de ação indenizatória, afirmar-se, incidentemente, a ineficácia de confissão de dívida, à míngua de justa causa.

II - É defeso à concessionária de energia elétrica interromper o suprimento de força, no escopo de compelir o consumidor ao pagamento de tarifa em atraso. O exercício arbitrário das próprias razões não pode substituir a ação de cobrança. REsp 223778/RJ;  RECURSO ESPECIAL
1999/0064555-3 Relator: Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS (1096) Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA Data do Julgamento 07/12/1999 Data da Publicação/Fonte DJ 13.03.2000, p.143
RSTJ vol. 134 p. 145).”

 

Portanto, constata-se pelas decisões do Superior Tribunal de Justiça que o Código de Defesa do Consumidor é uma norma de ordem pública e interesse social (art. 5.°, inciso XXXII e art. 170, inciso V da Constituição Federal), razão pela qual as Resoluções das Agências Reguladoras não podem hierarquicamente sobrepujarem o citado código.

 

Ademais, o art. 24, inciso VIII da Carta Federal e o art. 16, inciso VIII da Constituição Estadual, permitem aos Estados legislarem concorrentemente sobre dano ao consumidor, e não existe dano maior ao ser humano do que ter o meio indispensável de sobrevivência e saúde, a água, bem como o meio que fornece segurança e bem-estar ao cidadão, a energia elétrica, cortados.

 

Não se quer com essa lei fomentar a inadimplência, mas estabelecer regras claras, legais e anti-abusivas em favor do consumidor.

 

Alfim, essa é uma luta incessante dos organismos de defesa do consumidor no nosso Estado e País, visando, principalmente, o equilíbrio nas relações de consumo e protegendo o consumidor hipossuficiente (inciso VII do art. 6.° do CDC).

 

Portanto, peço apoio aos meus pares parlamentares para a discussão e aprovação do presente Projeto de Lei.

 

 

 

Deputado Moésio Loiola

Presidente da CDC