Fica proibido, no território do Estado do Ceará, o
corte de energia elétrica e/ou de água por motivo de inadimplência.
A ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ
DECRETA:
Art.
1.° Fica proibido, no território do Estado do Ceará, o corte de energia
elétrica e/ou de água por motivo de inadimplência, através da Companhia
Energética do Ceará – COELCE, e Companhia de Água e Esgoto do Ceará – CAGECE, a
que se referem os arts. 22 e 42 do Código de Defesa do Consumidor e art. 16,
inciso VIII da Constituição Estadual.
Parágrafo
único. O corte de energia elétrica e/ou somente poderá ser efetivado por Ordem
Judicial.
Art.
2.° O Ministério Público do Estado do Ceará, por intermédio do Programa Estadual
de Proteção e Defesa do Consumidor – DECON, fiscalizará o cumprimento do artigo
anterior conforme a Lei Complementar Estadual n.° 30, de 26 de julho de
2002.
Parágrafo
único. A Agência Reguladora dos Serviços Públicos Delegados do Estado do Ceará
– ARCE, também fiscalizará o cumprimento desta Lei sobre os serviços públicos
delegados à Companhia Energética do Ceará – COELCE e Companhia de Água e Esgoto
do Ceará – CAGECE nos termos do art. 3.° e
art.
5.° incisos II e V da Lei n.° 12.786, de 30 de dezembro de 1997, aplicando-lhes
as penalidades previstas em lei.
Art.
3.° Em caso de descumprimento do disposto do art. 1.° desta Lei serão aplicadas
as penalidades previstas na Lei Complementar n.° 30, de 26 de julho de 2002,
que reverterão ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos do Estado do Ceará –
FDID, nos termos do art. 3.° da Lei
Complementar Estadual n.° 46, de 15 de julho de 2004.
Art.
4.° Está Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art.
5.° Revogam-se as disposições em contrário.
SALA
DAS SESSÕES, 27 de março de 2006.
Presidente da CDC
Pacificou-se
o entendimento nas agências reguladoras, através da Resolução n.° 456, de 29 de
novembro de 2000, editada pela Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL de
que as concessionárias dos serviços públicos de água e energia elétrica
poderiam efetuar corte de seus serviços por motivos de inadimplência.
No
entanto, o Brasil tem o Código de Defesa do Consumidor, como norma protetora e
de equilíbrio nas relações de consumo que preceitua nos arts. 22 e 42 o
seguinte:
“Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas,
concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento,
são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos
essenciais, contínuos.”
Art.
42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a
ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.”
Ora,
nobres parlamentares, a simples leitura dos textos acima não deixa qualquer
dúvida quanto a ilegalidade no corte dos serviços essenciais como água e luz,
tanto quanto a ilegalidade de dubiedade na aplicação de sanções por
inadimplência, pois o consumidor, além de pagar os acessórios de multa e juros
moratórios, tem o serviço cortado.
Além
do que, é simples a aplicação da sanção do corte do serviço, quando legalmente
essas concessionárias deveriam buscar a cobrança dos valores devidos por
intermédio de ações judiciais, sejam elas de execução ou de cobrança. A partir
daí, poderia arrestar ou penhorar bens dos inadimplentes.
Por outro lado, essa medida impositiva e coercitiva dificulta o
pagamento do débito pelo consumidor inadimplente, pois é praxe das
concessionárias exigirem o pagamento inicial de 30% (trinta por cento) do valor
do débito para firmarem qualquer acordo, conforme testemunhamos no
PROCON/Assembléia.
Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça já assentou
entendimento jurisprudencial no sentido de que:
“ ADMINISTRATIVO . CORTE NO FORNECIMENTO DE ENERGIA
ELÉTRICA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTE JURISPRUDENCIAIS. AGRAVO REGIMENTAL.
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTOS PARA INFIRMAR A DECISÃO AGRAVADA. DESPROVIMENTO.
1.
O corte
no fornecimento de energia elétrica, como forma de compelir o usuário ao
pagamento da tarifa ou multa, extrapola os limites da legalidade e fere a
cláusula pétrea que tutela a dignidade humana. Precedentes do STJ. 2. Ausência
de motivos suficientes para a modificação do julgado. Manutenção da decisão
agravada. 3. Agravo regimental desprovido. (STJ Acórdão AGA 478911/RJ, 1ª
Turma, Relator: Ministro Luiz Fux, DJ, 19/05/2003, pg 144).”
“ SERVIÇO PÚBLICO - ENERGIA ELÉTRICA - CORTE NO
FORNECIMENTO - ILICITUDE.
I - É viável, no processo de ação indenizatória,
afirmar-se, incidentemente, a ineficácia de confissão de dívida, à míngua de
justa causa.
II
- É defeso à concessionária de energia elétrica interromper o suprimento de
força, no escopo de compelir o consumidor ao pagamento de tarifa em atraso. O
exercício arbitrário das próprias razões não pode substituir a ação de
cobrança. REsp 223778/RJ; RECURSO
ESPECIAL
1999/0064555-3 Relator: Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS (1096) Órgão Julgador
T1 - PRIMEIRA TURMA Data do Julgamento 07/12/1999 Data da Publicação/Fonte DJ
13.03.2000, p.143
RSTJ vol. 134 p. 145).”
Portanto, constata-se pelas decisões do Superior Tribunal de
Justiça que o Código de Defesa do Consumidor é uma norma de ordem pública e
interesse social (art. 5.°, inciso XXXII e art. 170, inciso V da Constituição
Federal), razão pela qual as Resoluções das Agências Reguladoras não podem
hierarquicamente sobrepujarem o citado código.
Ademais, o art. 24, inciso VIII da Carta Federal e o art. 16,
inciso VIII da Constituição Estadual, permitem aos Estados legislarem
concorrentemente sobre dano ao consumidor, e não existe dano maior ao ser
humano do que ter o meio indispensável de sobrevivência e saúde, a água, bem
como o meio que fornece segurança e bem-estar ao cidadão, a energia elétrica,
cortados.
Não se quer com essa lei fomentar a inadimplência, mas estabelecer
regras claras, legais e anti-abusivas em favor do consumidor.
Alfim, essa é uma luta incessante dos organismos de defesa do
consumidor no nosso Estado e País, visando, principalmente, o equilíbrio nas
relações de consumo e protegendo o consumidor hipossuficiente (inciso VII do
art. 6.° do CDC).
Portanto, peço apoio aos meus pares parlamentares para a discussão
e aprovação do presente Projeto de Lei.
Deputado Moésio Loiola
Presidente da CDC