PROJETO
DE LEI N° 07/2023
“ASSEGURA
ÀS MULHERES O DIREITO À PRESENÇA DE ACOMPANHANTE EM CONSULTAS E EXAMES NOS
ESTABELECIMENTOS PÚBLICOS E PRIVADOS DE SAÚDE NO ESTADO DO CEARÁ”.
A ASSEMBLEIA
LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ APROVA:
Art.
1º Fica assegurado às mulheres o direito à presença de acompanhante em
consultas e exames nos estabelecimentos públicos e privados de saúde no estado
do Ceará.
§1º
O direito previsto no caput poderá ser exercido pela mulher mediante indicação
de uma pessoa por sua livre escolha, sendo obrigatória a presença de
acompanhante em casos que envolvam sedação.
§2º
O direito à presença de acompanhante deverá observar a norma técnica que dispõe
sobre os procedimentos para garantir a atenção humanizada às pessoas em
situação de violência sexual.
Art.
2º Os estabelecimentos de saúde deverão afixar cartaz ou painel digital, de
forma visível e de fácil acesso, para informar o direito a que se refere esta
lei.
Art.
3º O descumprimento do disposto nesta lei implicará:
I
– quando praticado por funcionário público, as penalidades previstas em lei
específica;
II
– quando praticado por funcionários de estabelecimentos de saúde privados, as
seguintes penalidades, aplicáveis, conforme a responsabilidade, de forma
gradativa:
a)
advertência;
b)
multa de 200 (duzentas) UFIRCE a 1000 (mil) UFIRCE, sendo o valor dobrado em
caso de reincidência.
§1º
Fica a autoridade fiscalizadora autorizada a elevar em até 5
(cinco) vezes o valor da multa cominada, quando se verificar que, ante a
capacidade econômica do autuado, a pena de multa resultará inócua.
§2º
A multa arrecadada será destinada a financiar as políticas de enfrentamento à
violência contra a mulher no estado do Ceará.
Art.
4º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
RENATO ROSENO
DEPUTADO
JUSTIFICATIVA:
A
prática de violências contra as mulheres no ambiente hospitalar é,
infelizmente, bastante recorrente no Brasil. Neste ano, o caso do médico
anestesista colombiano AndresOñate,
residente no estado do Rio de Janeiro, é ilustrativo de tal realidade. Ele foi
preso no dia 16 de janeiro por abusar sexualmente pacientes sedadas em salas de
cirurgia[1]. O estado do Ceará não está alheio a esses
lamentáveis acontecimentos: em julho de 2022, o ginecologista Ricardo Teles
Martins foi preso por suspeita de ter abusado pacientes durante consultas no
município de Hidrolândia, após 6
(seis) mulheres o denunciarem para a Polícia[2]. A repressão célere e assertiva
aos crimes sexuais contra as mulheres é medida imprescindível para o
enfrentamento a esse tipo de violência, bem como o fortalecimento de medidas
preventivas institucionais, objeto deste projeto de lei que ora apresento.
O
estabelecimento às mulheres do direito à presença de acompanhante em
procedimentos de saúde, como cirurgias, consultas e exames, não é tema novo no
país, tampouco alheio ao ordenamento jurídico. A popularmente conhecida “lei do
acompanhante”, lei federal nº 11.108/05, alterou a legislação do SUS para
garantir às parturientes o direito à presença de
acompanhante durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato, no âmbito
do Sistema Único de Saúde. O artigo introduzido pela norma dispõe que os
serviços de saúde são obrigados a permitir a presença de 1
(um) acompanhante, mediante indicação pela parturiente.
Transcorridos
quase 20 (vinte) anos da publicação da norma, a lei do acompanhante possui
importância reconhecida pela literatura especializada, mães e comunidade afeta
à área da saúde. A presença de acompanhante indicado pela mulher busca
concretizar os ditames do chamado “parto humanizado”, em observância às
recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) para que a parturiente
tenha conforto e segurança em um momento tão importante de sua vida.
Os
casos relatados na presente justificativa, assim como outros
inúmeros que cotidianamente são noticiados nos jornais, apontam que o
direito à presença de acompanhante é garantia necessária não só durante o
parto, mas em todos os procedimentos de saúde aos quais as mulheres estão
submetidas. Em face disso, o legislador deve ampliar o escopo protetivo previsto na legislação mediante extensão do
direito a outras hipóteses de procedimentos de saúde, tais como exames e
consultas. Esse esforço, ressalta-se, vem se dando em
várias unidades da federação.
Atualmente,
há pelo menos 3 (três) estados que editaram leis
semelhantes com o projeto de lei ora protocolizado. Após prisão de um médico
anestesista que estuprou uma mulher na hora do parto, o estado do Mato Grosso
aprovou a lei nº 11.852/22, que dispõe sobre o direito de toda mulher a ter
acompanhante nas consultas e exames nos estabelecimentos de saúde. Também no
ano passado, outros estados aprovaram legislação semelhante, a saber: Distrito
Federal – lei nº 7.062/22, cuja ementa é a mesma da lei mato-grossense; e Rio
de Janeiro – lei nº 9.878/22, publicada em outubro do ano passado. Cumpre
asseverar que projetos de lei em sentido similar vêm sendo apresentados em
várias assembleias legislativas, a exemplo do estado
do Amazonas, Maranhão, Pernambuco e Roraima, bem como em câmaras municipais,
tais como Porto Velho, Vitória e Recife.
Em
Fortaleza, também foi apresentado um projeto de lei que busca garantir às
mulheres o direito à presença de acompanhante em consultas e exames. O projeto
de lei ordinária nº 391/22, de autoria da vereadora Cláudia Gomes, cita na
justificativa que o PLO busca “garantir à mulher maior segurança e conforto
durante consultas e exames” bem como “salvaguardar o direito ao acompanhante às
consultas em geral, não se limitando àquelas de caráter ginecológico.”[3]
No
contexto de publicação da lei no âmbito do Distrito Federal, o Conselho
Regional de Medicina (CRM) emitiu importante posicionamento favorável, aduzindo
que “o direito ao acompanhante é consagrado na prática médica e já é exercido
naturalmente (…). A Lei, portanto, está regulamentando algo que o exercício da
medicina realiza prontamente.” Ainda, a entidade reforça “que o direito de o
paciente ter um acompanhante deverá ser acatado não só para consultas
ginecológicas, mas em qualquer tipo de atendimento (…).”[4]
Percebe-se
nitidamente, portanto, o problema a ser enfrentado, os
avanços que a lei do acompanhante trouxe nos casos de parto, o esforço
institucional empreendido pelos Poderes da República em todos os entes
federativos, notadamente pelo Poder Legislativo, e o consenso existente dentro
da comunidade afeta à área da saúde sobre a importância de garantir o direito à
presença de acompanhante como medida para resguardar a dignidade das mulheres,
sobretudo a dignidade sexual.
Por
último, cumpre asseverar que o projeto de lei em comento não cria cargos
públicos, não versa sobre o regime jurídico dos servidores da Administração
Pública estadual, não altera competências de secretarias de estado ou outros
órgãos públicos tampouco trata sobre direito financeiro, orçamentário ou tributário,
razão pela qual o projeto de lei se insere plenamente nas matérias cuja
propositura pode ser exercida por iniciativa parlamentar, conforme o artigo 60,
§3º da Constituição do estado do Ceará.
[1]
Disponível em: <https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2023/01/16/andres-onate-quem-e-o-medico-preso-por-abusar-de-pacientes-sedadas-e-investigado-por-pornografia-infantil.ghtml>.
Acesso em 31/01/23.
[2]
Disponível em: <https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2022/07/15/o-que-se-sabe-sobre-o-ginecologista-preso-por-abuso-durante-atendimentos-no-ceara.ghtml>.
Acesso em 31/01/23.
[3]
Disponível em: <https://www.cmfor.ce.gov.br/2022/11/10/projeto-que-assegura-a-mulher-o-direito-a-acompanhante-durante-consultas-e-exames-e-enviado-as-comissoes/>.
Acesso em 31/01/23.
[4]
Disponível em: <https://crmdf.org.br/noticias/mulher-tera-direito-a-acompanhante-em-consultas-e-exames/>.
Acesso em 31/01/23.
RENATO ROSENO
DEPUTADO