PROJETO DE LEI N.° 53/2023
CRIA O PROTOCOLO ESTADUAL DE COMBATE À VIOLÊNCIA E A IMPORTUNAÇÃO SEXUAL CONTRA MULHERES EM BARES, BOATES, RESTAURANTES E ESTABELECIMENTO CONGÊNERES E DÁ OUTRAS PROVIDENCIAS.
A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ DECRETA:
Art. 1º. Fica instituído o PROTOCOLO ESTADUAL DE COMBATE À VIOLÊNCIA E À IMPORTUNAÇÃO SEXUAL CONTRA AS MULHERESem bares, boates, restaurantes e estabelecimentos congêneres e dá outras providencias.
Parágrafo único. O PROTOCOLO ESTADUAL DE COMBATE À VIOLÊNCIA E À IMPORTUNAÇÃO SEXUAL CONTRA AS MULHEREStambém deverá ser seguido em locais de realização de eventos esportivos profissionais.
Art. 2º.Para os efeitos desta lei, se considera como violência sexual e importunação sexual as condutas previstas, no que couber, no Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940; na Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 e na Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009.
Art. 3º.Constituem princípios do presente protocolo:
I – A celeridade na atenção primária a pessoa vítima da violência;
II – O respeito às decisões da mulher vítima da violência;
III – A preservação da imagem, da honra, da dignidade e da intimidade da vítima;
IV – A clara rejeição à violência por todos;
V – Evitar informações que gerem boatos ou mentiras.
Parágrafo único. A aplicação do presente protocolo deverá levar sempre em consideração o melhor interesse da vítima, sendo vedada a aplicação de quaisquer medidas que violem a dignidade, a saúde ou sua integridade física e psicológica, ou outras condutas que agravem seu sofrimento.
Art. 4º.São garantias das mulheres vítimas de violência ou importunaçãosexual:
I – Respeito às suas decisões;
II- Ser prontamente atendida por funcionárias e funcionários do estabelecimento para relatar a agressão, resguardar provas ou qualquer evidência que possa servir a responsabilização do agressor;
III – Ser acompanhada por pessoa de sua escolha;
IV - Ser imediatamente protegida do agressor;
V - Acionar os órgãos de segurança pública competentes com auxílio do estabelecimento;
VI - Não ser atendida com preconceito;
VII – Ser atendida de acordo com o Decreto Nacional nº 7.958 de 13 de março de 2013 quando se dirigir a estabelecimento de saúde ou segurança pública quando for o caso.
Art. 5º.São deveres dos estabelecimentos abrangidos pela presente Lei:
I – Manter funcionários e funcionárias capacitados e treinados para agir em caso de denúncia de violência ou importunação sexual a mulher;
II – Disponibilizar recursos para que a denunciante possa se dirigir aos órgãos de segurança pública, serviços de assistência social, atendimento médico ou mesmo o regresso seguro ao lar;
III – Na hipótese de haver sistema de vídeo monitoramento e serviço de filmagem interna e externa do estabelecimento ou evento, deverá ser preservado e disponibilizado os registros e filmagens que tenham flagrado o possível ato de violência para entregar aos órgãos de segurança pública competentes;
IV – Criar um código próprio para que as mulheres e outras pessoas possam alertar as funcionárias e os funcionários sobre a situação de violência para que possam tomar as providências necessárias sem conhecimento do agressor;
V – Manter em locais visíveis, nas áreas principais e banheiros, placas com informações sobre o protocolo estadual de combate à violência e à importunação sexual contra mulheres, com telefones e outras informações para acesso imediato pelas vítimas;
VI – Manter um ambiente onde a denunciante possa ficar protegida e afastada, inclusive visualmente, do agressor;
VII – Conduzir a denunciante a local tranquilo e procurar familiares e/ou amigos presentes no local para que possam acompanhá-la;
VIII – Preservar qualquer prova que possa contribuir para a identificação e responsabilização do agressor.
§1º. Todos os membros da equipe do estabelecimento devem ter treinamento, comprovado, para serem capazes de detectar e distinguir os vários tipos de importunação e agressão sexual e conhecer o circuito interno de encaminhamento, bem como o papel que cada um dos profissionais do local desempenha.
§2º. Os estabelecimentos que não instituírem o protocolo estadual de combate à violência e à importunação sexual contra mulheres poderão estar sujeitos à multas, além de outras sanções administrativas posteriomentes estabelecidas pelo Poder Público .
Art. 6º.Após a identificação da violência, os membros do estabelecimento deverão agir para:
I – Ouvir, confortar e respeitar a decisão da denunciante;
II – Identificar o agressor ou agressores e afastar a vítima deste(s) ;
III – acionar as autoridades policiais competentes;
IV - Procurar pelos familiares e/ou amigos da denunciante e direciona-los para o local protegido onde a denunciante estiver;
V – Garantir e viabilizar os direitos da denunciante previsto nos termos desta lei, de acordo com a vontade da denunciante;
VI– Preservar as eventuais e potenciais provas ou evidências da violência cometida, até a chegada ao local das autoridades policias compentes;
VII – Apurar com o rigor as informações sobre o acontecido;
VIII – Identificar possíveis testemunhas da agressão;
IX – Adotar outras medidas que julgar cabíveis para preservar a dignidade da denunciante.
Art. 7º.O Poder Público estadual e municipal promoverá campanhas educativas de respeito à mulher em locais públicos e/ou de grande circulação de pessoas.
§1º. O Poder Público auxiliará os estabelecimentos referidos no Art. 1º desta Lei na implantação do PROTOCOLO ESTADUAL DE COMBATE À VIOLÊNCIA E À IMPORTUNAÇÃO SEXUAL CONTRA MULHERES.
§2º. O Poder Público empregará esforços junto à rede estadual de proteção a mulher para integrar o protocolo estadual de combate à violência e à importunação sexual contra mulheresos seus serviços de atendimento a mulher.
Art. 8º.As despesas públicas decorrentes da execução da presente lei, correrão a conta de dotações orçamentárias próprias, suplementadas se necessárias.
Art. 9º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
JO FARIAS
DEPUTADA
JUSTIFICATIVA
A violência sexual no Brasil é, atualmente, um ato tipificado como um crime hediondo sendo previsto pela Lei 12.015/2009, que alterou o Código Penal Brasileiro e incorporou o seguinte artigo, veja-se:
Art. 213 – Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.
No mesmo sentido, a referida legislação acima, com o intuito de proteger a integridade física e a liberdade sexual de qualquer indivíduo em território brasileiro, trouxe em seu corpo um outro artigo que visa tratar da Violação Sexual mediante fraude, para definir:
Art. 215 – Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima.
Em 2013, a Lei 12.845, que dispõe de atendimento obrigatório e integral de pessoas em situação de violência sexual, em seu Artigo 2º, dita:
Art. 2º – Considera-se, para efeitos desta Lei, qualquer forma de atividade sexual não consentida.
No Ceará, apenas nos primeiros quinze dias de 2023, cerca de 13 mulheres foram assassinadas[1], sendo que, somente entre os meses de janeiro e maio do ano anterior, já havia registrado mais de 7.568 casos de violência contra às mulheres[2] no Ceará.
Segundo a jurisprudência firmada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, as mulheres que se encontram em situação de violência domesticam constituem um grupo em situação de hipervulnerabilidade, merecendo, desta forma, proteção especial em razão de sua condição[3].
Para além do âmbito doméstico, as mulheres se encontram em situação de hipervulnerabilidade em diversos outros locais, sendo vítimas, também, de violências em outros ambientes, como ocorre com a violência sexual e a importunação sexual.
As referidas violências sexuais constituem crimes tipificados no Código Penal, sendo o crime de estupro e o crime de importunação sexual, previstos no artigo 213 e 215-A do Código, respectivamente.
Inegável que as mulheres, entre as possíveis vítimas do crime de violência sexual, são submetidas com maior frequência a essas violações vis. Daí a necessidade de lhe assegurar um protocolo de proteção para o seu maior momento de vulnerabilidade, logo após ser vitimada pela violência sexual.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que pelo menos 8,9% das mulheres brasileiras já sofreram algum tipo de violência sexual na vida, em que, destas, 50,3% foram forçadas ou ameaçadas a ter relações ou quaisquer atos sexuais contra a sua vontade[4]
Recentemente, dois famosos jogadores brasileiros deram ainda mais destaque à temática da violência sexual contra mulheres nestes locais, por, supostamente, terem praticado a conduta, sendo que um destes já teve condenação transita em julgado pelo crime de estupro. O mais recente destes, ocorrido em Barcelona, na Espanha, deu visibilidade a medidas efetivas de coibição da violência sexual contra mulheres ocorridas nos referidos locais de lazer.
Chamado “no callem”, o Protocolo de segurança contra as violências sexuais em ambientes de lazer, foi criado em 2018, após um caso de estupro que chocou o país. Não se trata de uma Lei especificamente, mas de uma cartilha criada pela Câmara de Barcelona onde constam recomendações de como os funcionários de tais estabelecimentos devem agir em relação à vítima e ao suspeito em casos de violência sexual.
O protocolo vem servindo de inspiração para o mundo dado o sucesso em identificar e coibir a violência sexual contra as mulheres, ao exemplo da Inglaterra, que, a partir de 2023, passou a estabelecer um protocolo parecido ao “no calem”, denominado “ask for Angela”.
É salutar, ainda, que, no Estado do Ceará, foi criado o “Drink La Penha”, instituído pela Lei nº. 17.816, de 10 de dezembro de 2021, estabelecendo que bares, restaurantes e estabelecimento congêneres devam oferecer o drink, que, em verdade, se trata de um pedido de socorro.
Desta forma, o presente projeto visa ampliar a proteção de mulheres em bares, restaurantes, discotecas, boates e demais estabelecimentos, criando um mecanismo de atuação dos funcionários e donos dos referidos estabelecimentos para prevenir e coibir tais violências. Entretanto, diferentemente de como ocorre na Espanha, onde o protocolo é facultativo, pretende-se que o presente protocolo seja obrigatório nos ambientes a que se destina.
Pelo exposto, é de suma importância a aprovação do presente projeto de Lei, considerando que o referido busca de forma clara reforçar a proteção das mulheres cearenses contra qualquer ato de violência sexual.
JO FARIAS
DEPUTADA
[1]https://www.opovo.com.br/noticias/ceara/2023/01/15/corpo-em-ubajara-sobe-para-13-n-de-mulheres-assassinadas-em-2023-no-ce.html.
[2]https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2022/06/21/ceara-tem-mais-de-7500-casos-de-violencia-contra-mulher-de-janeiro-a-maio.ghtml.
[3]STJ – RHC: 100446/MG, Relator: Ministro Marco Aurélio Belizze, julgado em 27/11/2018, T3 – Terceira Turma.
[4]https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2021/05/11/9percent-das-mulheres-brasileiras-sofreram-violencia-sexual-alguma-vez-na-vida-diz-pesquisa-de-ibge-e-ministerio-da-saude.ghtml.