PROJETO DE LEI N.° 377/2023
“DISPÕE SOBRE A INSTITUIÇÃO DA POLÍTICA ESTADUAL DE TRABALHO COM APOIO PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO ÂMBITO DO ESTADO DO CEARÁ E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.”
A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ DECRETA:
Art. 1º - Fica instituída no âmbito do Estado do Ceará a Política Estadual de Trabalho com Apoio, para pessoas com deficiência, compreendendo o conjunto de conceitos, objetivos, princípios, diretrizes e instrumentos discriminados nesta Lei.
§ 1º Esta Lei tem como base a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, ratificados pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 186, de 9 de julho de 2008, em conformidade com o procedimento previsto no § 3º do art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, em vigor para o Brasil, no plano jurídico externo, desde 31 de agosto de 2008, e promulgados pelo Decreto no 6.949, de 25 de agosto de 2009, data de início de sua vigência no plano interno.
§ 2º Esta lei fundamenta-se e vem a complementar, no âmbito da inserção no mercado de trabalho da pessoa com deficiência, o estabelecido no Estatuto das Pessoas com Deficiência, Lei Federal 13.146, de 06 de julho de 2015, que dispõe sobre a colocação competitiva da pessoa com deficiência por meio do trabalho com apoio.
§ 3º A Política Estadual de Trabalho com Apoio tem por objetivo fundamental contribuir com a inclusão no mercado de trabalho formal de pessoas com deficiência de forma a terem acesso a um trabalho digno nos termos da legislação brasileira, e nele se manter e progredir.
Art. 2º - Para efeitos da presente Lei, o Trabalho com Apoio é constituído por serviços de mediação para a colocação competitiva no mercado de trabalho, englobando um conjunto de ações de assessoria, orientação, formação, treinamento e acompanhamento personalizado, dentro e fora do local de trabalho, realizadas por profissionais especializados, cujo objetivo consiste em conseguir que as pessoas com deficiência encontrem e mantenham trabalho nos termos da legislação brasileira, em igualdade de oportunidades e nas mesmas condições que os demais trabalhadores que desempenham funções equivalentes.
§ 1º - São ações prévias ao momento do contrato de trabalho:
I. Elaboração do Plano Personalizado de Ação Laboral e do Perfil Profissional da pessoa com deficiência, que procuram trabalho nos termos da legislação brasileira;
II. Prospecção do mercado de trabalho, que consiste na busca ativa de postos de trabalho compatíveis com o Perfil Profissional mencionado na alínea acima;
III. Assessoria, orientação e informação à empresa sobre as necessidades de apoio do trabalhador, inclusive sobre os processos de adaptação do posto ou local de trabalho, sobre a acessibilidade e sobre a tecnologia assistiva, quando sejam detectadas estas necessidades.
§ 2º - São ações no posto de trabalho:
I. Apoio técnico ao trabalhador com deficiência e formação ou treinamento nas atividades próprias do posto de trabalho, quando seja detectada essa necessidade;
II. Orientação e assessoria ao empregador e aos funcionários da entidade empregadora que tenham responsabilidades gerenciais para com o trabalhador ou compartilhem atividades com ele;
III. Apoio ao trabalhador no desenvolvimento de habilidades de relacionamento no trabalho, para que possa realizá-lo nas melhores condições.
§ 3º - São ações de monitoramento e de apoio ao trabalhador, periodicamente, conforme a necessidade, até a finalização do trabalho nos termos da legislação brasileira.
Art. 3º - A omissão ou não aplicação de qualquer uma das atividades ou fases descritas na presente lei comporta uso inapropriado da tecnologia social de Trabalho com Apoio, salvo nas adequações das diversas situações previstas em lei.
Art. 4º - A prestação de serviços de Trabalho com Apoio será realizada com a finalidade de consolidar a legislação cearense aos beneficiários.
§ 1º - A metodologia de Trabalho com Apoio consiste num conjunto de procedimentos que engloba as seguintes situações:
I. Emprego Apoiado, quando os serviços de mediação se destinam à obtenção de trabalho da pessoa com deficiência sob a forma de relação assalariada, conforme contrato de trabalho entre empregador e empregado, segundo a legislação trabalhista e previdenciária;
II. Autônomo Apoiado, quando os serviços de mediação se destinam à obtenção de trabalho da pessoa com deficiência sob a modalidade de trabalho realizado sem vínculo empregatício, por conta própria, conforme legislação brasileira;
III. Empreendedor Apoiado, quando os serviços de mediação se destinam à obtenção de trabalho da pessoa com deficiência sob a forma de atividade empresarial, conforme legislação brasileira;
IV. Cooperativismo Apoiado, quando os serviços de mediação se destinam à obtenção de trabalho da pessoa com deficiência sob a forma de atividade profissional como associado em cooperativas, conforme legislação brasileira.
§ 2º - A tecnologia social do Trabalho com Apoio poderá ser utilizada para inclusão no contrato de aprendizagem.
§ 3º - Fica expressamente proibida a utilização da metodologia do Trabalho com Apoio com a finalidade de obter trabalho em oficinas protegidas de produção e em oficinas protegidas terapêuticas.
§ 4º - Os serviços e programas de Trabalho com Apoio deverão sempre dispor de atendimento adequado ao grau de dificuldade de inclusão no mercado de trabalho, no que tange à intensidade e extensão dos apoios oferecidos, de acordo com o descrito nesta lei, de forma a garantir a prestação dos referidos serviços para aquelas pessoas que enfrentam maior grau de exclusão.
§ 5º - Em hipótese alguma, as pessoas com maior necessidade de apoio para atingir a sua inclusão no mercado de trabalho serão preteridas no atendimento dos serviços e programas de Trabalho com Apoio em relação àquelas pessoas que apresentarem menor grau de dificuldade de inclusão no mercado de trabalho.
Art. 5º - As ações de Trabalho com Apoio serão realizadas por profissionais especializados, denominados Técnicos de Trabalho com Apoio.
Parágrafo Único - São considerados Técnicos de Trabalho com Apoio os profissionais com ensino superior completo e que comprovarem formação em curso de Trabalho com Apoio de no mínimo 80 (oitenta) horas ou experiência mínima efetiva de trabalho de 01 (um) ano na metodologia de Trabalho com Apoio.
Art.6º - São princípios estruturantes da Política Estadual de Trabalho com Apoio:
I. A dignidade de todas as pessoas;
II. A não-discriminação entre as pessoas;
III. Os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
IV. Os direitos das pessoas com deficiência;
V. A inclusão produtiva;
VI. A eliminação das barreiras que impedem a participação das pessoas com deficiência;
VII. Os apoios como forma de superação das barreiras, quando elas existirem;
VIII. O desenho universal, a acessibilidade, a tecnologia assistiva e os ajustes razoáveis;
IX. A igualdade de oportunidades das pessoas com deficiência;
X. A erradicação da pobreza e da segregação, e a redução das desigualdades sociais;
XI. A promoção do bem de todos, sem preconceitos ou quaisquer outras formas de discriminação.
Art. 7º - São princípios gerais e valores do Trabalho com Apoio:
I. Presunção de empregabilidade: todas as pessoas, independentemente do nível ou tipo de deficiência e do grau de exclusão social, têm a capacidade e o direito ao trabalho, sendo que algumas precisam dos serviços de Trabalho com Apoio para efetivarem esse direito;
II. Emprego com contrato formal de trabalho no mercado competitivo: o emprego deve ocorrer em empresas regularizadas, mediante o contrato formal de trabalho, conforme a legislação trabalhista e previdenciária;
III. Autodeterminação: o Trabalho com Apoio contribui para as pessoas desenvolverem seus interesses e preferências, para expressarem seus gostos e para definirem seu plano de trabalho, segundo suas condições pessoais e o contexto social. Igualmente, o Trabalho com Apoio fomenta os princípios de autogestão entre os usuários do serviço;
IV. Escolha informada: o Trabalho com Apoio ajuda as pessoas a ter plena consciência de suas oportunidades, com a finalidade de que possam escolher de acordo com suas preferências e sejam cientes das consequências da sua escolha;
V. Salários, condições de trabalho e benefícios adequados: as pessoas especificadas no art. 7º desta Lei devem ter remuneração, condições de trabalho e benefícios iguais aos dos colegas de trabalho que realizam as mesmas ou equivalentes funções;
VI. Foco na capacidade e nas habilidades: as pessoas com deficiência e pessoas em situação de exclusão social devem ser consideradas em termos de suas capacidades, habilidades, forças e interesses, ao invés de suas dificuldades;
VII. Poder dos apoios: as pessoas com deficiência e as pessoas em situação de exclusão social podem, mediante os devidos apoios, superar as barreiras e se autorrealizarem pessoal e socialmente. Os apoios que essas pessoas precisam para encontrar um emprego e nele se manter e progredir fazem parte dos direitos humanos, particularmente do direito ao trabalho;
VIII. Acessibilidade: os serviços de Trabalho com Apoio são acessíveis às pessoas com deficiência e aos demais usuários ou beneficiados em situação de exclusão social;
IX. Mudança de concepções e práticas: as antigas concepções e práticas dos modelos de atenção à pessoa com deficiência, anteriores ao paradigma expresso na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, quando baseadas na atribuição de incapacidade, dependência e tutela às pessoas com deficiência, devem ser mudadas para apoiar sua autodeterminação, autonomia e exercício de cidadania, o qual constitui aspecto central da tecnologia social do Trabalho com Apoio;
X. Importância da comunidade: é de extrema importância que todas as pessoas possam participar das redes formais e informais de uma comunidade para propiciar seu desenvolvimento pessoal e social;
XI. Confidencialidade: o provedor de serviços de trabalho com apoio trata de modo confidencial os dados que recebe das pessoas que procuram emprego, as quais têm acesso à informação pessoal recebida pelo provedor e qualquer uso dela se realiza com seu devido consentimento;
XII. Flexibilidade: dado que as necessidades dos usuários podem ser extremamente diversas, os serviços de Trabalho com Apoio são flexíveis, respondem às necessidades concretas de cada pessoa e podem ser ajustados a requisitos específicos;
XIII. Importância da tecnologia assistiva e das tecnologias de informação e comunicação: os serviços de Trabalho com Apoio orientam sobre as referidas tecnologias relativas à adaptação do posto de trabalho.
Art. 8º - Para efeitos da presente lei, consideram-se beneficiários da POLÍTICA ESTADUAL DE TRABALHO COM APOIO, para pessoas com deficiência, aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, em interação com os quais as diversas barreiras podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, de forma especial no acesso ao mercado de trabalho.
§1º - O Poder Público poderá adotar providências a fim de conseguir a ampliação dos objetivos desta lei para outros grupos em situação de exclusão social, com especiais dificuldades para terem acesso a um trabalho nos termos da legislação brasileira, e nele se manter e progredir, aos quais seja possível aplicar a metodologia do Trabalho com Apoio, na medida dos recursos disponíveis por todos os meios apropriados, sem prejuízo do grupo das pessoas com deficiência.
§ 2º - Consideram-se especiais dificuldades de acesso a trabalho e de manutenção no mesmo nos termos da legislação brasileira aquelas situações nas quais seja possível aferir que o desejo de trabalhar e os esforços pessoais de procura de trabalho por um período maior de 02 (dois) anos não resultaram na obtenção de um trabalho formal ou, uma vez alcançado, não conseguiram nele se manter.
Art. 9º - A Administração Pública Direta e Indireta, Autarquias, Fundações, Empresas Públicas deverão implementar ou promover políticas, serviços e programas de Trabalho com Apoio, assim como ações de fortalecimento e fomento.
§ 1º - As organizações da sociedade civil sem fins lucrativos e as fundações de direito privado poderão habilitar-se para realizar serviços de Trabalho com Apoio, desde que nos seus estatutos esteja contemplado o Trabalho com Apoio como finalidade social e seja realizado mediante equipes que disponham de Técnicos de Trabalho com Apoio.
§ 2º - As entidades devidamente credenciadas para o contrato de aprendizagem poderão realizar serviços de Trabalho com Apoio, na conformidade com a presente Lei.
§ 3º - Ficam autorizadas as sociedades comerciais, as empresas, as cooperativas, os sindicatos e os profissionais autônomos a realizarem serviços de Trabalho com Apoio, na conformidade da presente lei.
§ 4º - As sociedades empresariais, por meio de ações de responsabilidade social, poderão financiar serviços de Trabalho com Apoio, na conformidade com a presente lei.
Art. 10 - As políticas e os programas ou serviços de Trabalho com Apoio de cada uma das entidades descritas na presente lei deverão prever sempre a realização de avaliação, de forma a possibilitar subsídios de melhoria da prática do Trabalho com Apoio.
Art. 11 - As políticas e os serviços ou programas de Trabalho com Apoio financiados com recursos públicos serão gratuitos tanto para os beneficiários ou usuários dos serviços de Trabalho com Apoio, como para os empregadores que contratem esses usuários.
Art. 12 - As entidades descritas na presente lei autorizadas a realizarem serviços de Trabalho com Apoio perderão sua habilitação, caso sejam comprovadas irregularidades na efetiva aplicação das disposições.
Art. 13 - O Executivo regulamentará a presente lei em 90 (noventa) dias.
Art. 14 - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
MARTA GONÇALVES
DEPUTADA
JUSTIFICATIVA:
O presente objeto tem por objetivo instituir no âmbito do Estado do Ceará a Política Estadual do Trabalho com Apoio, buscando incentivar e fomentar a inclusão no mundo do trabalho das pessoas com deficiência.
Emprego Apoiado - EA - é o nome dado a uma metodologia para inserção no mercado de trabalho de pessoas com deficiência física, visual, auditiva,intelectual, múltipla, síndrome de Down e paralisia cerebral. Aplicável, também, às vítimas de violência doméstica, ex-tóxico dependentes e pessoas desempregadas de longa duração.
Referida metodologia surgiu nos EUA na década de 80 e vem contribuindo para a inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho, rompendo as barreiras criadas pelos modelos tradicionais, que concebiam as pessoas com deficiência como incapazes, dependentes e inaptas para o mercado de trabalho.
Ademais, assegura que as pessoas com deficiência tenham condições de participar e contribuir ativamente na sociedade, promovendo acesso ao que antes lhes era negado: emprego competitivo, educação, lazer, utilização de transportes e participação social.
Adota-se a definição da Associação Europeia de Emprego Apoiado (EUSE), que descreve a metodologia do EA da seguinte forma:
Conjunto de ações de assessoria, orientação e acompanhamento personalizado, dentro e fora do local de trabalho, realizadas por preparadores laborais e profissionais especializados, que tem por objetivo conseguir que a pessoa com deficiência encontre e mantenha um emprego remunerado em empresas do mercado formal de trabalho, nas mesmas condições que o resto dos trabalhadores que desempenham funções equivalentes.
Destaca-se que são muitas as pessoas com deficiência que desejam trabalhar, enviam currículos, se inscrevem em agências de emprego, realizam cursos profissionalizantes, conversam com amigos e parentes, mas apesar dos seus esforços não conseguem ter acesso a um emprego ou trabalho pelos métodos convencionais.
Os preconceitos, as barreiras e as dificuldades que encontram na forma como o mercado de trabalho se estrutura na sociedade impedem que consigam um emprego e nele se mantenham e progridam profissionalmente.
Dessa maneira, a inclusão no mercado de trabalho é a forma mais digna de assegurar a inclusão social da pessoa com deficiência, garantindo que o processo de inserção no mercado de trabalho seja feito em consonância e respeito às suas potencialidades e direitos, e aumentando a sua autoestima.
É o que a metodologia do Emprego Apoiado busca garantir.
Por todo o exposto, conclama-seaos Nobres Pares a aprovarem esta Resolução.
MARTA GONÇALVES
DEPUTADA