PROJETO
DE LEI N.° 104/2023
“PROÍBE A COBRANÇA DO IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES RELATIVAS À CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SOBRE AS PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS DE TRANSPORTES INTERESTADUAIS E INTERMUNICIPAIS E DE COMUNICAÇÃO - ICMS NAS CONTAS DE SERVIÇOS PÚBLICOS DE IGREJAS E TEMPLOS RELIGIOSOS.”
A
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ APROVA:
Art. 1º - Fica proibida a cobrança do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre as Prestações de Serviços de Transportes Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS nas contas de serviços públicos estaduais próprios, delegados, outorgados e terceirizados de fornecimento de energia elétrica e de comunicação de igrejas e templos religiosos.
§1º. As igrejas e templos religiosos comprovarão a propriedade ou posse dos imóveis que são utilizados para prática religiosa, bem como, sua titularidade.
§2º. Nos casos em que o imóvel não for próprio, a comprovação do funcionamento dar-se-á através de contrato de locação ou comodato devidamente registrado, ou ainda, de comprovação judicial.
Art. 2º - São definidas, para efeito do artigo 1º, as contas relativas a imóveis ocupados por igrejas ou templos de qualquer culto, formalmente constituídos.
Art. 3º - Os templos e igrejas deverão o requerer, junto às empresas prestadoras de serviços públicos, a isenção a que têm direito, a partir da vigência desta lei.
Art. 4º - Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação.
DAVID
DURAND
DEPUTADO
JUSTIFICATIVA:
A Constituição Federal em seu Artigo 19, I, proíbe ao Estado embaraçar o funcionamento das igrejas ou dos cultos religiosos, como também o Código Civil, Art. 44, IV, e o §1º.
Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público; (Constituição Federal)
Tal vedação é fruto do princípio da liberdade religiosa em que é fundada nossa sociedade e o ordenamento jurídico.
Pode-se afirmar que, em face da nossa Constituição, é válido o ensinamento de Soriano de que o Estado tem o dever de proteger o pluralismo religioso dentro de seu território, criar as condições materiais para um bom exercício sem problemas dos atos religiosos das distintas religiões, velar pela pureza do princípio de igualdade religiosa, mas deve manter-se à margem do fato religioso, sem incorporá-lo em sua ideologia. (SORIANO, Ramón. Las liberdades públicas. Madri: Tecnos, 1990. p. 64, citado por Iso Chaitz Scherkerkewitz <www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/revistaspge/revista2/artig acesso em 06/06/2017, às 10:08horas) grifo nosso
Nota-se que a nossa Carta Magna, diploma Excelsior do ordenamento jurídico, positiva que o Estado não pode instituir impostos sobre templos de qualquer culto. Ora, nada mais é que a execução prática do apoio material necessário ao não embaraçamento do funcionamento das distintas religiões. Como supracitado nas palavras do Procurador Iso Chaitz Scherkerkewitz, foi claro em citar que o Estado deve apoiar o funcionamento das religiões.
O Estado do Ceará não é diferente. O exercício desse apoio material é percebido de forma rotineira. Cita-se, apenas para exemplificar, a mensagens do Poder Executivo para financiar eventos religiosos, como festividades natalinas dentre outras.
Outro exemplo que o Estado deve participar materialmente, para permitir o funcionamento das atividades religiosas é o Art. 150, VI, b, da Constituição Federal, quando proíbe a administração pública de instituir impostos sobre os templos de qualquer culto, como segue:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
VI - instituir impostos sobre:
a)patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;
b)templos de qualquer culto; (grifo nosso)
Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal já apreciou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3421), com pedido de liminar, contra lei produzida pela Assembleia Legislativa do Estado do Paraná. A norma estadual 14.586/04, do Paraná prevê a isenção de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas contas de água, luz, telefone e gás inclusive serviram de parâmetro para a presente propositura.
No mérito da referida ação direta de inconstitucionalidade, “... unanimidade dos votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3421...” (http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp? idConteudo=125923)
Cabe destacar que a ADI 3421 questionou:
ofensa aos artigos 155, $ 2º, inciso XII, alínea “g”, e 150, §6º, da Constituição Federal, e Lei Complementar nº 24/1975, por ausência de prévio convênio interestadual, firmado no âmbito do CONFAZ, para fins de renúncia de créditos tributários;
ausência de relação jurídica entre o ente tributante e os beneficiários da lei, fator necessário a concretizar o fenômeno da isenção, salientando não serem as igrejas e os templos contribuintes do ICMS, mas prestadores dos serviços mencionados;
a cobrança de ICMS não se enquadra na imunidade tributária, pois o $ 4º do inciso VI do artigo 150 do texto constitucional incidiria exclusivamente sobre o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais aos cultos religiosos, e não na circulação de mercadorias e serviços e outros impostos indiretos contidos nos preços públicos;
ilegalidade por renúncia de receitas sem estimativa de impacto orçamentário e financeiro, nem previsão na Lei de Diretrizes Orçamentárias, nem tampouco previsão de incremento compensatório por outra fonte, conforme dispõe o artigo 14 da Lei Complementar nº 101, de 2000.
Em parecer a Advocacia Geral da União opinou pelo INDEFRIMENTO da ADI 3421, face o ICMS compor os preços dos serviços públicos, portanto sendo indiretamente cobrado dos templos religiosos, inclusive classificando os templos como contribuintes de fato.
O Procurador Geral da República, no seu mister, opinou pela improcedência da ADI nº. 3.471/PR, pois as igrejas são os contribuintes de fato e de direito, portanto possuem o direito de não pagarem o ICMS sobre as contas de consumo.
Neste ínterim, todas as alegações apresentadas pela ADI nº. 3471/PR foram improcedentes, de forma que o assunto foi discutido sob diversos ângulos, e, ao final restou plenamente reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal o direito de os Templos Religiosos não pagarem ICMS sobre as contas de consumo.
Como não poderia ser diferente, em outros Estados da Federação, como Minas Gerais (Lei nº. 20.824/13), Santa Catarina (Lei nº. 15.314/2010), Rondônia (Lei nº. 4.012/2017), Rio Grande do Sul (Lei nº. 14.223/13), Rio de Janeiro (Lei nº. 6.018/2011), Mato Grosso (Lei nº. 10.257/2015), Brasília-DF (Lei nº. 5.960/2017), Amapá (Lei nº. 2.129/2016), Pará (Decreto nº. 4676/2001), entre outros, já proibiram a cobrança de ICMS, nos serviços públicos, cobrados das igrejas e dos templos religiosos.
Cabe, ainda, consignar que não há qualquer vício de iniciativa da presente propositura. Isso porque, o Supremo Tribunal Federal, o qual já consolidou o posicionamento que a iniciativa legislativa tributária é de competência concorrente entre o legislativo e o executivo. Com isso, o STF soluciona qualquer dúvida no sentido de que a iniciativa para elaboração de leis que versem sobre matéria tributária cabe tanto ao Poder Legislativo quanto o Poder Executivo, para fins de iniciar o processo legislativo e edição de lei que conceda isenção fiscal, ainda que tal lei cause eventual repercussão em matéria orçamentária, como segue:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. INICIATIVA LEGISLATIVA. MATÉRIA TRIBUTÁRIA. CONCORRÊNCIA ENTRE PODER LEGISLATIVO E PODER EXECUTIVO. LEI QUE CONCEDE ISENÇÃO. POSSIBILIDADE AINDA QUE O TEMA VENHA A REPERCUTIR NO ORÇAMENTO MUNICIPAL. RECURSO QUE NÃO SE INSURGIU CONTRA A DECISÃO AGRAVADA. DECISÃO QUE SE MANTÊM POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 1. O recurso extraordinário é cabível contra acórdão que julga constitucionalidade in abstracto de leis em face da Constituição Estadual, quando for o caso de observância ao princípio da simetria. Precedente: Rcl 383, Tribunal Pleno, Rel. Min. Moreira Alves. 2. A iniciativa para início do processo legislativo em matéria tributária pertence concorrentemente ao Poder Legislativo e ao Poder Executivo (art. 61, § 1º, II, b, da CF). Precedentes: ADI 724-MC, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 15.05.92; RE 590.697-ED, Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Dje de 06.09.2011; RE 362.573-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Eros Grau, Dje de 17.08.2007). 3. In casu, o Tribunal de origem entendeu pela inconstitucionalidade formal de lei em matéria tributária por entender que a matéria estaria adstrita à iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, dada a eventual repercussão da referida lei no orçamento municipal. Consectariamente, providos o agravo de instrumento e o recurso extraordinário, em face da jurisprudência desta Corte. 4. Agravo regimental a que se nega provimento” (AI 809.719-AgR, Relator o Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 26.4.2013) grifos nossos
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS DE DECISÃO MONOCRÁTICA. CONVERSÃO EM AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSO LEGISLATIVO. NORMAS SOBRE DIREITO TRIBUTÁRIO. INICIATIVA CONCORRENTE ENTRE O CHEFE DO PODER EXECUTIVO E OS MEMBROS DO LEGISLATIVO. POSSIBILIDADE DE LEI QUE VERSE SOBRE O TEMA REPERCUTIR NO ORÇAMENTO DO ENTE FEDERADO. IRRELEVÂNCIA PARA FINS DE DEFINIÇÃO DOS LEGITIMADOS PARA A INSTAURAÇÃO DO PROCESSO LEGISLATIVO. AGRAVO IMPROVIDO. I – A iniciativa de leis que versem sobre matéria tributária é concorrente entre o chefe do poder executivo e os membros do legislativo. II – A circunstância de as leis que versem sobre matéria tributária poderem repercutir no orçamento do ente federado não conduz à conclusão de que sua iniciativa é privativa do chefe do executivo. “III – Agravo Regimental improvido” (RE 590.697-ED, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe 6.9.2011) grifo nosso
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. INICIATIVA LEGISLATIVA. MATÉRIATRIBUTÁRIA.CONCORRÊNCIA ENTRE PODER LEGISLATIVO E PODEREXECUTIVO. CONCEDE ISENÇÃO. POSSIBILIDADE AINDA QUE O TEMA VENHA A REPERCUTIR NO ORÇAMENTO MUNICIPAL. RECURSO QUE NÃO SE INSURGIU CONTRA A DECISÃO AGRAVADA. DECISÃO QUE SE MANTÊM POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 1. O recurso extraordinário é cabível contra acórdão que julga constitucionalidade in abstracto de leis em face da Constituição Estadual, quando for o caso de observância ao princípio da simetria. Precedente: Rcl 383, Tribunal Pleno, Rel. Min. Moreira Alves. 2. A iniciativa para início do processo legislativo em matéria tributária pertence concorrentemente ao Poder Legislativo e ao Poder Executivo (art. 61 , § 1º , II , b , da CF ). Precedentes : ADI 724- MC, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 15.05.92; RE 590.697- ED , Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Dje de 06.09.2011; RE 362.573-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Eros Grau, Dje de 17.08.2007). 3. In casu, o Tribunal de origem entendeu pela inconstitucionalidade formal de lei em matéria tributária por entender que a matéria estaria adstrita à iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, dada a eventual repercussão da referida lei no orçamento municipal. Consectariamente, providos o agravo de instrumento e o recurso extraordinário, em face da jurisprudência desta Corte. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF - AG.REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO AI 809719 MG (STF), publicação 25/04/2013) grifo nosso
Em suma, o Ceará deve se adequar a realidade constitucional que é submetido, tanto para cumprir a vedação de embaraçar o funcionamento e não cobrar impostos das igrejas e templos religiosos. Conto com o apoio dos meus pares, para aprovação desta matéria de suma importância.
DAVID
DURAND
DEPUTADO