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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.° 04/2022

 

“ALTERA A RESOLUÇÃO Nº 389, DE 11 DE DEZEMBRO DE 1996, PARA DISPOR SOBRE A CRIAÇÃO DA COMISSÃO PERMANENTE DE LEGISLAÇÃO PARTICIPATIVA.”

 

 

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ RESOLVE:

 

 

Art. 1º O Artigo 48, da Resolução nº 389, de 11 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescido do inciso XVIV:

 

“Art. 48 (...)

XVIV - Comissão de Legislação Participativa:

 

sugestões de iniciativa legislativa apresentadas por associações e órgãos de classe, sindicatos, conselhos de políticas públicas cuja composição seja de maioria da sociedade civil e demais entidades organizadas da sociedade civil, exceto Partidos Políticos com representação na Assembleia Legislativa do Estado do Ceará;

 

sugestões de emendas ao projeto de lei do plano plurianual, ao projeto de lei orçamentária e ao projeto de lei de diretrizes orçamentárias;

 

sugestões de decretos legislativos que visem convocar plebiscitos ou referendos;

 

pareceres técnicos, exposições e propostas oriundas de entidades científicas e culturais e de qualquer das entidades mencionadas na alínea a deste inciso e de qualquer campo temático; “ (AC)

 

Art. 2º. O art. 48 da Resolução nº 389, de 11 de dezembro de 1996 passa a vigorar acrescido do seguinte §1º:

 

“Art. 48 (...)

§ 1º. Competem também à Comissão de Legislação Participativa, em ampla colaboração com as entidades da sociedade civil e movimentos sociais, resguardada a competência das demais comissões de mérito:

 

garantir e promover os direitos humanos;

 

receber, examinar denúncias de violação dos direitos humanos e encaminhar aos órgãos competentes;

 

proteger os direitos das mulheres, pessoas negras, indígenas, LGBTQI+, crianças e adolescentes, pessoas com deficiência e pessoas idosas;

 

fiscalizar, acompanhar a implementação, avaliar e exercer o controle das políticas governamentais relativas aos direitos humanos, aos direitos das mulheres, pessoas negras, indígenas, LGBTQI+, crianças e adolescentes, pessoas com deficiência e pessoas idosas;

 

coletar e analisar dados, sistematizar estatísticas, realizar, de forma colaborativa, estudos, avaliações, pesquisas, acompanhamento e elaboração de proposições para combate e prevenção à violência política;

 

propor iniciativas aos partidos políticos, em especial no tocante ao cumprimento dos códigos de conduta e das normas relativas à formação, divulgação e financiamento das mulheres, pessoas negras, indígenas, LGBTI+ e outros setores vulnerabilizados;

 

estabelecer parcerias e acordos de cooperação técnica com observatórios, conselhos de políticas públicas, universidades e outras instituições de pesquisa;

 

realizar visitas técnicas, reuniões itinerantes e audiências públicas em todo território nacional;

 

promover campanhas educativas relacionadas à prevenção e combate à violência e em defesa da promoção da igualdade de gênero e étnico racial.” (AC)

 

Art. 2º O Capítulo III do Título VI da Resolução nº 389, de 11 de dezembro de 1996 , passa a vigorar acrescido do artigo 212-B, com a seguinte redação:

 

“Art. 212-B - A participação da sociedade civil poderá, ainda, também ser exercida mediante o oferecimento de sugestões de iniciativa legislativa ou emendas às leis orçamentárias, de pareceres técnicos, de exposições e propostas oriundas de entidades científicas e culturais e de qualquer das entidades mencionadas na alínea a do inciso XVIV do art. 48.

 

§ 1º As sugestões de iniciativa legislativa que receberem parecer favorável da Comissão de Legislação Participativa serão transformadas em proposição legislativa de sua iniciativa, que será encaminhada à Mesa para tramitação em regime de Prioridade ou diretamente à Comissão Orçamento, Finanças e Tributação, no caso das sugestões de emendas às leis orçamentárias.

 

§ 2º As sugestões que receberem parecer contrário da Comissão de Legislação Participativa serão arquivadas.

 

§ 3º Aplica-se à apreciação das sugestões pela Comissão de Legislação Participativa, no que couber, as disposições regimentais relativas ao trâmite das proposições pelas Comissões.

 

§ 4º As sugestões transformadas em proposições legislativas não serão arquivadas ao fim da Legislatura.

 

§ 5º As demais formas de participação recebidas pela Comissão de Legislação Participativa serão encaminhadas à Mesa para distribuição à Comissão ou Comissões competentes para o exame do respectivo mérito, ou à Ouvidoria, conforme o caso.


§ 6º Todos os atos da Comissão de Legislação Participativa serão públicos e estarão disponíveis em portal da internet.


Art. 3º O colegiado criado por esta Resolução observará a paridade de gênero e étnica/racial na sua composição.

Art. 4º A Mesa Diretora assegurará à Comissão de Legislação Participativa apoio físico, técnico e administrativo necessários ao desempenho de suas atividades, bem como à presença de representantes de entidades da sociedade civil e de movimentos sociais, sem discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, orientação sexual, identidade de gênero, religião ou procedência.      

 

Parágrafo Único. Toda iniciativa provocada ou implementada pela Comissão de Legislação Participativa terá ampla divulgação pelos órgãos de comunicação da Assembleia Legislativa do Ceará.

 

Art. 5° A Mesa Diretora da baixará os atos complementares necessários à efetividade desta Resolução.

 

Art. 6° Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

 

 

RENATO ROSENO

DEPUTADO

 

 

 

JUSTIFICATIVA:

 

 

A Câmara dos Deputados, por meio da Resolução nº 21, de 30 de maio de 2001, aprovou a criação da Comissão de Legislação Participativa (CLP), um marco na história daquela Casa, tendo a Deputada Luiza Erundina como sua primeira presidenta. Constituída com apoio de todos os partidos representados na Casa à época, a referida comissão foi instrumento proposto pela Mesa Diretora com a finalidade de reduzir as distâncias entre representantes e representados, consolidar, estimular e radicalizar a democracia por meio do seu caráter participativo.

Assim, diante de um cenário de agravamento da crise de representatividade da política tradicional, suas instituições e representantes eleitos – cujo papel se deteriora quanto mais a participação política se limita ao voto periódico e, consequentemente, à mera delegação de poder ao Estado –, a Câmara criou mecanismos para incidência direta da população no sistema de produção de normas, para além do que a Constituinte já havia previsto como meios para se exercer a soberania popular –  plebiscito, referendo e iniciativa popular (Art.14).

Dessa forma, a CLP nasce com a vocação de ser um canal para que associações e órgãos de classe, sindicatos e demais entidades organizadas da sociedade civil possam ter acesso e capacidade propositiva junto aos espaços decisórios, por meio da apresentação de sugestões de iniciativas legislativas, tais como projetos de lei ordinária, leis complementares, resoluções, requerimentos de audiências públicas e emendas às leis orçamentárias.

Além disso, garantiu-se também às entidades científicas e culturais, que têm caráter distinto de associações e sindicatos, a prerrogativa de apresentar pareceres técnicos, moções e exposições que contribuam com os mais diversos debates temáticos, pertinentes a qualquer uma das outras comissões permanentes e temporárias em atividade, ainda que não solicitados pelos representantes políticos.

Por sua vez, o Senado Federal, por meio da Resolução nº 64, de dezembro de 2002, também instituiu comissão idêntica à da Câmara dos Deputados. Anos depois, o Senado unificou as comissões de Legislação Participativa e a de Direitos Humanos, mantendo as prerrogativas e competências de cada uma delas.

Atualmente, ao menos 14 assembleis estaduais possuem uma comissão semelhante. São elas a Comissão e Participação Popular (MG); Comissão de Legislação Cidadã (PB); Comissão Mista Permanente de Defesa do Consumidor e do Contribuinte e Participação Legislativa Popular (RS); Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, da Cidadania, da Participação e das Questões Sociais (SP); Comissão de Cidadania, Direitos Humanos e Participação Popular (PE);Comissão de Proteção aos Animais, Assuntos indígenas, Cidadania e Legislação Participativa (AM); Comissão de Controle de Eficácia Legislativa e Legislação Participativa (MS); Comissão de Direitos Humanos, Cidadania e Legislação Participativa (GO); Comissão de Revisão e Consolidação Legislativa (PR); Comissão de Defesa dos Direitos Humanos, Minorias e Legislação Participativa (RR). Com nome idêntico à comissão da Câmara dos Deputados, temos comissões de Legislação Participativa nas assembleias estaduais de Alagoas, Sergipe, Acre e Santa Catarina.

E, ao menos, 21 câmaras municipais de vereadores seguiram na mesma direção. Instalaram suas comissões ou abriram o escopo de outras comissões já existentes para a participação popular direta. Contudo, há que se ressaltar que esta é uma proporção muito pequena, diante dos 5.570 municípios brasileiros.

Nesse sentido, sobre o nível municipal, destaca-se que a Constituição, Art. 29, XIII, resguarda a iniciativa popular de projeto de lei mediante de manifestação de 5% do eleitorado local. Na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, onde não existe ainda uma comissão de legislação participativa ou estrutura equivalente, um projeto de iniciativa popular deve contar com a adesão de mais de 240 mil eleitores para adentrar à Câmara de Vereadores.

Em razão das limitações de tamanha exigência, não apenas no Rio, mas em todo o país, muitas iniciativas que nascem na sociedade civil, e angariam apoio significativo, acabam dependendo do intermédio parlamentar para efetivamente começar a tramitar. Seguramente, sem outros mecanismos institucionais que conectem com efetividade, transparência, tecnologia e resolutividade as demandas populares ao sistema de produção de normas, sem outros mecanismos republicanos que validem a atuação legislativa de grupos e segmentos da sociedade, esta regra se torna um obstáculo à participação direta dos cidadãos, tornando-a um fenômeno eventual e raro, ao invés de permanente e comum. E evidencia, ainda, o quanto ainda é necessário avançar, em cada município, em cada estado, para fortalecer o Poder Legislativo brasileiro, na medida em que se ampliam e se radicalizam os espaços de participação democrática, de escuta cotidiana, na medida em que palácios, câmaras e assembleias, finalmente, transformem-se em casas do povo.

Em tempo, é fundamental registrar que vivemos um período marcado pela ascensão de projetos autoritários, elitistas e segregacionistas, pela baixíssima transparência dos atos do Estado e por uma notável escalada de violência política, derivada de outras formas de violência que estruturam a sociedade brasileira, notadamente o racismo, o machismo, a lgbtfobia. Nesse contexto, não apenas as pessoas, mas também as instituições e, consequentemente, a própria democracia brasileira correm sérios riscos.

Sobre a violência política, é importante destacar que este é um fenômeno que cresceu assustadoramente nos últimos anos e alveja, principalmente, as mulheres, pessoas negras e/ou LGBTI+, indígenas, defensoras de direitos humanos e outros segmentos historicamente marginalizados ou excluídos dos espaços de poder e decisão.

Por isso, é fundamental que a Comissão de Legislação Participativa, além da formulação de leis e incidência no orçamento, dedique-se também à proteção e promoção dos direitos humanos, que esteja atenta e possua meios eficazes de atuar no combate à violência política. É fundamental que a CLP seja mais que uma comissão comum – que ela possa ser também um observatório, uma ponte, uma instância deliberativa em permanente mobilização com os anseios populares. Um espaço em que denúncias sejam recebidas, examinadas e encaminhadas; onde políticas públicas sejam fiscalizadas e avaliadas; um colegiado itinerante, que receba cotidianamente a sociedade, sem qualquer discriminação no acesso das pessoas à estrutura física do Legislativo, e que esteja presente nos territórios com a mesma frequência.

É nesse cenário que mandatos parlamentares de todo o Brasil se reúnem para propor a criação de Comissões Legislativas nas casas legislativas. Será um espaço de diálogo e construção para viabilizar coletivamente as pautas populares e incentivar a participação cidadã.   

Por todo o exposto, para que o Estado do Ceará, por meio do Poder Legislativo, contribua para superar o grande déficit democrático em que se encontra a democracia brasileira, para que esta Casa seja, cada dia mais, a casa do povo e estimule a organização da sociedade, apresentamos esta proposição e pedimos aos eminentes pares desta Casa a sua aprovação.

 

 

RENATO ROSENO

DEPUTADO