PROJETO DE LEI 359/2022

“INSTITUI A POLÍTICA ESTADUAL DE REEDUCAÇÃO REFLEXIVA DOS AUTORES DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR.”

 

 

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ DECRETA:

 

Art. 1º – Fica instituída a Política Estadual de Reeducação Reflexiva dos Autores de Violência Doméstica e Familiar.

 

Art. 2º – Para efeitos desta Lei, considera-se autor de violência doméstica e familiar, em consonância com o que dispõe a Lei Federal nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 – Lei Maria da Penha, todo o agente que, por ação ou omissão, cause à mulher sofrimento ou violência física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral no âmbito:

I – da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;

II – da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;

III – de qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.

§ 1º – Esta lei se aplica aos homens autores de violência doméstica encaminhados pelo juízo competente.

§ 2º – A execução desta lei deve observar as políticas conexas já existências no âmbito estadual, promovendo a integração entre iniciativas similares.

 

Art. 3º – São objetivos da Política Estadual de Reeducação Reflexiva dos Autores de Violência Doméstica e Familiar a instituição de grupos reflexivos ou de reeducação, que visem a conscientização dos autores de violência, a prevenção, o combate e a redução dos casos de reincidência de violência doméstica contra as mulheres.

Parágrafo único – Os objetivos a que se referem o caput serão executados em atenção ao previsto no art. 152, parágrafo único, da Lei Federal nº 7.210, de 11 de julho de 1984, e no artigo 35, V, da Lei Federal nº 11.340, de 7 de agosto de 2006.

 

Art. 4º – Fica o Poder Executivo autorizado a criar um Comitê Intersetorial para execução da política, composto, entre outros atores, por representantes:

I – da Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa Social;

II – da Secretaria de Estado de Saúde;

III – da Secretária de Estado da Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres, e Direitos Humanos;

IV – do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará;

V – do Ministério Público do Estado do Ceará;

VI – da Defensoria Pública do Estado do Ceará.

 

Art. 5º – São princípios e diretrizes da Política Estadual de Reeducação Reflexiva dos Autores de Violência Doméstica e Familiar:

I – a conscientização e responsabilização dos autores de violência doméstica e familiar, por meio da instituição de grupos reflexivos;

II – os grupos instituídos devem possuir caráter reflexivo, bem como ser coordenados por equipes multidisciplinares, preferencialmente com a presença de profissionais do serviço social, da psicologia e do direito;

III – a inserção e a coordenação dos grupos reflexivos com os demais serviços compreendidos pela política de atendimento à mulher vítima de violência, de forma a permitir o permanente diálogo entre os atendimentos prestados à vítima e ao agressor;

IV – a autonomia técnica das equipes multidisciplinares em relação à escolha da fundamentação teórica, das dinâmicas de grupo utilizadas e da ordenação e seleção dos temas a serem abordados;

V – avaliação e monitoramento permanentes dos serviços prestados;

VI – a formação continuada das equipes multidisciplinares envolvidas no acompanhamento dos grupos.

VII – a utilização preferencial da estrutura e dos servidores da rede pública de saúde.

 

Art. 6º – Entre as ações compreendidas pela Política Estadual de Reeducação Reflexiva dos Autores de Violência Doméstica e Familiar se incluem:

I – o trabalho psicossocial de reflexão e reeducação promovido por profissionais habilitados para desempenhar esse papel;

II – a promoção de atividades educativas e pedagógicas de caráter participativo;

III – a realização de palestras expositivas ministradas por convidados com notório conhecimento sobre os temas abordados;

IV – o fornecimento de informações permanentes sobre o acompanhamento dos autores de violência doméstica ao juízo competente;

V – o encaminhamento dos autores para atendimento psicológico e serviços de saúde mental e assistência social, quando necessário.

 

Art. 7º – As despesas decorrentes da aplicação desta lei correrão à conta de dotações orçamentárias próprias.

 

Art. 8º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

 

 

PEDRO LOBO

DEPUTADO

 

JUSTIFICATIVA:

 

Conforme a previsão do artigo 152, parágrafo único, da Lei Federal nº 7.210, de 11 de julho de 1984, pode ser determinado judicialmente como forma de coibir a violência doméstica e a familiar o comparecimento obrigatório do agressor a grupos de reeducação e reflexão. A Lei Federal nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 – Lei Maria da Penha, complementa tal disposição em seu artigo 35, V, estabelecendo a competência concorrente dos entes da federação de determinar a criação e promoção, nos seus âmbitos de interesse, de centros de educação e reabilitação para os agressores.

 

A Universidade Federal do Ceará, em conjunto com o Instituto Maria da Penha (IMP), apresentaram no último dia 24 de agosto de 2022 relatório “Entendendo os impactos da COVID-19 na violência doméstica no Brasil”, o relatório que tem o objetivo de avaliar o impacto causado pela pandemia na violência doméstica e familiar contra mulheres e crianças.

 

Realizado no âmbito do Colégio de Estudos Avançados (CEA/EIDEIA) e do Centro de Pós-Graduação em Economia (CAEN) da UFC, o estudo foi apresentado como parte da 4ª Onda da Pesquisa de Condições Socioeconômicas e Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (PCSVDF Mulher), que teve início em 2016, em uma parceria da UFC com o IMP.

 

O relatório é resultado de estudo financiado pelo Sexual Violence Research Initiative (SVRI), feito em parceria com as seguintes instituições nacionais e internacionais: Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Universidade Federal da Paraíba, Universidade Federal da Bahia, Universidade Estadual do Ceará, Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, Universidade de Gotemburgo (Suécia) e Universidade de Warwick (Inglaterra).

A pesquisa considera marcadores sociais, econômicos, psicológicos e de saúde pública, como educação, renda, saúde mental, composição familiar, classe e desigualdade de gênero. Entre os resultados, constata-se que a violência emocional ou psicológica foi a que mais aumentou no Brasil no período da pandemia: de 12,55% de mulheres que sofreram esse tipo de violência em 2019, o número subiu para 16,16% em 2020 e para 16,55% em 2022.

Considerando a violência física, percebe-se aumento seguido de queda: de 5,49%, em 2019, para 5,73%, em 2020, início do período pandêmico, enquanto em 2021, houve diminuição para 4,64%. Os números, porém, dependem da cidade. São Paulo, por exemplo, registra crescimento considerando os três anos: de 3,92%, em 2019, para 6,94%, em 2020, e 8,22% em 2021.

 

Nesse sentido, a presente propositura visa instituir, em correspondência às previsões legislativas, uma política estadual de reeducação reflexiva dos autores de violência doméstica e familiar, de forma a integrar os demais serviços compreendidos pela política estadual de atendimento à mulher vítima de violência. A política mencionada objetiva desempenhar atividades educativas e pedagógicas, através da instituição de grupos reflexivos multidisciplinares destinados à conscientização dos autores de violência, a prevenção da violência doméstica e familiar contra as mulheres.

 

Assim, diante da relevância da presente proposição, bem como dos eventuais benefícios que dela poderão advir sob a ótica da proteção dos direitos das mulheres, pedimos apoio dos nobres deputados e deputadas na sua aprovação.

 

 

PEDRO LOBO

DEPUTADO