“ASSEGURAR, NO ÂMBITO DO SISTEMA ESTADUAL DE SAÚDE, OS DIREITOS DE MULHERES QUE SOFRAM PERDA GESTACIONAL OU NEONATAL NO ESTADO DO CEARÁ E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS”.
A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ DECRETA:
Art. 1º Fica assegurado, no âmbito do Sistema Estadual de Saúde, os direitos de mulheres que sofram perda gestacional ou neonatal, visando à redução das sequelas decorrentes do processo de perda.
Parágrafo único. Para os termos desta Lei, considera-se:
I – perda gestacional toda e qualquer situação que leve ao abortamento ou ao óbito fetal;
II – perda neonatal toda e qualquer situação que leve ao óbito de crianças de zero a vinte e sete dias de vida completos.
Art. 2º São direitos das mulheres que sofreram perda gestacional ou neonatal:
I – receber suporte emocional;
II – ser acompanhada por pessoa de sua livre escolha;
III – ser acompanhada por uma doula, parteira ou enfermeira obstétrica, sem prejuízo do direito a que se refere o inciso I;
IV – ser informada sobre qualquer procedimento adotado;
V – não ser submetida a nenhum procedimento ou exame sem que haja o seu livre e informado consentimento, salvo em situações excepcionais, particularmente graves, em que não seja possível obtê-lo ou no caso de risco iminente de morte da mulher;
VI – não ser submetida a nenhum procedimento sem que haja necessidade clínica fundamentada em evidência científica;
VII – não ser constrangida a permanecer em silêncio ou impedida de expressar suas emoções e sensações;
VIII – permanecer, durante o pré-parto e o pós-parto imediato, em ala separada das demais pacientes que não sofreram perda gestacional ou neonatal, quando solicitado pela mulher;
IX – ser respeitado o tempo para o luto da mulher e seu acompanhante, bem como para a despedida do bebê;
X – ter livre escolha sobre o contato pele a pele com o natimorto imediatamente após o nascimento, desde que não ofereça riscos à saúde da mulher.
Art. 3º As unidades de saúde deverão informar às mulheres que sofrerem perda gestacional ou neonatal sobre os direitos estabelecidos no art. 2º desta Lei.
Art. 4º Fica instituída no Estado do Ceará, a Semana Estadual de Conscientização sobre a Perda Gestacional, a ser anualmente celebrada na semana em que corresponde o dia 15 de outubro.
Parágrafo único. A semana instituída por esta Lei fica incluída no calendário oficial de eventos do Estado do Ceará.
Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
AUDIC MOTA
DEPUTADO
JUSTIFICATIVA:
Remeto à análise e aprovação dessa Colenda Casa Legislativa, Projeto de Lei que assegura no âmbito do Sistema Estadual de Saúde, os direitos de mulheres que sofram perda gestacional no Estado do Ceará e dá outras providências.
O presente Projeto de Lei tem como objetivo preservar a saúde física e psicológica das mulheres que sofrerem perda gestacional nas unidades de saúde estaduais, bem como conscientizar sobre as perdas gestacionais, de modo que a informação sobre o tema possa ajudar no apoio e orientação às mães que vivenciam uma perda.
A escolha da semana tem por base o “Pregnant and Infant Loss Remambrance Day”, traduzido como “Dia da Memória da perda gestacional e infantil”, também chamado de “Dia da Conscientização sobre a Perda Gestacional e Infantil”, que é observado no dia 15 de outubro de cada ano em diversos países.
Pelo mundo afora o dia é celebrado com a campanha “Wave of Light” (Onda de Luz), que trata de uma corrente de vigílias de velas realizada pelos familiares, amigos e simpatizantes, com a intenção de, simbolicamente, formar uma onda de luz que relembre a história das/os bebês e crianças que perderam a vida, e a conscientização da sociedade sobre a importância do acolhimento a quem vive a dor da perda.
A perda gestacional ou neonatal é um fenômeno mais comum do que se possa imaginar. Estima-se que a prevalência da perda gestacional varie entre 15 a 20% das gestações clinicamente diagnosticadas. A maior ocorrência se dá antes da 12ª semana gestacional. Quando a perda do feto ocorre entre a 1ª e a 22ª semana da gestação, é denominada perda precoce. Quando ocorrem após esse período, as perdas são consideradas tardias.
Levantamento do Ministério da Saúde (de 2018) aponta que a mortalidade neonatal precoce (ocorrida entre 0 a 6 dias) acontece em 52% dos casos de mortalidade neonatal. O óbito de crianças até o primeiro ano de vida corresponde a 85% em relação ao óbito de crianças de até 4 anos de idade.
Para a mulher, a gestação é uma experiência única e íntima. Durante os meses de maturação intrauterina, quase todo o processo é vivido exclusivamente pela mãe. Ela acolhe em si o desenvolvimento de uma nova vida, o bebê, que a modifica, na medida em que cresce e se forma.
A olho nu é possível detectar algumas mudanças na grávida – físicas e comportamentais – mas as observações genética, hormonal e psíquica são capazes de trazer indícios de profundas transformações na mulher – redistribuição dos nutrientes entre mãe e bebê, remodelação das mamas, alterações de personalidade, rearranjo hormonal, de articulações e ligamentos, dentre outras, que passam despercebidas, mesmo para aqueles que a acompanham de modo bem próximo durante a gravidez.
Ao longo das semanas de gestação, a mulher vai se preparando para conceber o bebê, em um processo lento e contínuo, que vai adequando a mãe à chegada do filho. Nesse contexto, a interrupção da gravidez acarreta várias perdas para a mulher, inaugurando, dentre outros, um estado de luto e de fragilidades física, psíquica e emocional.
Para isso buscamos através de tal proposição, determinar mínimos direitos a estas pessoas, sejam na hora da perda com escolhas de como proceder, no pós-perda devendo ser informada das suas opções sobre medicamentos e procedimentos, e também o acompanhamento psicológico, fundamental nesse momento de dor.
Por fim, muito embora o projeto não crie despesas, o STF já se manifestou através da Tese 917 (Repercussão Geral), assegurando que não usurpa competência privativa do Chefe do Poder Executivo lei que, embora crie despesa para a Administração, não trata da sua estrutura ou da atribuição de seus órgãos nem do regime jurídico de servidores públicos (art. 61, § 1º, II,"a", "c" e "e", da Constituição Federal).
Ante ao exposto, conto com o apoio dos Nobres Pares para a aprovação do presente Projeto de Lei.
AUDIC MOTA
DEPUTADO