PROJETO DE INDICAÇÃO N° 105/2022
“DISPÕE SOBRE A CRIAÇÃO DA DELEGACIA DE COMBATE E PREVENÇÃO AO FEMINICIDIO – DCPF”.
A ASSEMBLEIA LEGISTALTIVA DO ESTADO DO CEARÁ INDICA:
Art. 1º Fica criada, na estrutura organizacional da Superintendência da Polícia Civil do Estado do Ceará, dentro do Departamento Estadual de Proteção a Grupos Vulneráveis, a Delegacia de Combate e Prevenção ao Feminicídio, com atuação em todo o território do Estado do Ceará, dirigida por uma Delegada de Polícia Civil de carreira e subordinada, operacional e administrativamente, ao Delegado Geral da Polícia Civil.
Art. 2º Compete Delegacia de Combate e Prevenção ao Feminicídio:
I – executar medidas repressivas a prática de infrações penais relativamente a atos contra a vida de mulher por razões da condição de sexo feminino, com tipificação prevista no art. 121, §2º, VI do Código Penal;
II – promover a elaboração, guarda, controle e atualização de banco de dados de pessoas que praticam atos contra a vida, consumados ou tentados de pessoas do sexo feminino;
III – manter atualizado o sistema de registro de ocorrências;
IV – promover a coleta e registro de dados estatísticos;
V - promover a cooperação com outras instituições pertencentes às Secretarias de Segurança Pública de outros Estados da Federação, quando necessário, para a prevenção e repressão qualificada aos crimes afetos a sua atribuição;
VI - promover a cooperação com o Departamento da Polícia Federal, quando necessário, para a prevenção e repressão aos crimes afetos a sua atribuição;
VII - produzir conhecimento de inteligência relacionado a sua atribuição, promovendo, quando necessário, o compartilhamento de informações, nos limites da lei, com outros órgãos inseridos no contexto da persecução penal, objetivando a prevenção e repressão integrada e qualificada ao crime de feminicidio;
VIII - produzir e difundir encontros, palestras e seminários com caráter educativo e preventivo relacionados ao crime de feminicidio;
IX - promover a proteção à mulher por todos os meios legais disponíveis, inclusive por meio da educação e prevenção criminal, notadamente relacionada aos crimes afetos a sua atribuição;
X - exercer outras atividades próprias de Polícia Judiciária, afetas a sua competência, definidas em leis e regulamentos afins e outras atividades correlatas.
Art. 3º Compõem a estrutura organizacional da Delegacia de Combate e Prevenção ao Feminicídio:
Núcleo de Inteligência;
Seção de Expediente e Cartório;
Seção de Investigações e Operações.
2. Núcleo de Prevenção;
2.1. Seção de Expediente e Cartório;
2.2. Seção de Investigações e Operações.
3. Núcleo de combate e repressão;
3.1. Seção de Expediente e Cartório;
3.2. Seção de Investigações e Operações.
4. Unidade Central Operacional;
5. Unidade Central de Expediente e Cartório;
§ 1º As competências das unidades orgânicas integrantes da estrutura organizacional Delegacia de Combate e Prevenção ao Feminicídio, serão fixadas em regulamento da Superintendência da Polícia Civil do Estado do Ceará, a ser aprovado por decreto.
§ 2º Não poderão, em qualquer hipótese, ser lotados, nas
unidades integrantes da Delegacia de Combate e Prevenção ao Feminicídio,
servidores que tenham sido condenados em processos administrativos e/ou
judiciais por crimes de violência contra a mulher.
Art. 4º Ficam criados 4 (quatro)
cargos de provimento em comissão, sendo 1 (um) símbolo DAS-1, 1 (um)
símbolo DAS-2, 2 (dois) símbolo DAS-3, a serem preenchidos por servidores de
carreira e efetivos da Polícia Civil do Estado do Ceará.
§ 1º Os cargos criados por esta Lei serão consolidados, por decreto, no quadro de cargos de provimento em comissão do Poder Executivo.
§ 2º As denominações e as atribuições dos cargos em comissão a que se refere o art. 4° desta Lei são as constantes do anexo único, facultado ao regulamento da Polícia Civil do Estado do Ceará, pormenorizar as atribuições considerando a unidade administrativa a que vinculado o cargo respectivo.
Art. 5º Ficam criadas 5 (cinco) Funções Comissionadas de Desempenho de Polícia Judiciária Especializada – FCPJ, para o exercício de assessoramento nas atividades de polícia especializada e de inteligência policial com vistas a dar suporte a operações policiais de alta complexidade do DCPF, no valor unitário de R$ 517,63 (quinhentos e dezessete reais e sessenta e três centavos), a serem preenchidas por servidores de carreira e efetivos da Polícia Civil do Estado do Ceará.
§ 1º As Funções Comissionadas de Desempenho de Polícia Judiciária Especializada – FCPJ não poderão ser acumuladas com outras gratificações ou cargos de provimento em comissão.
§ 2º Os valores das Funções Comissionadas de Desempenho de Polícia Judiciária Especializada – FCPJ, não sofrerão incidência de contribuição ao SUPSEC, não poderão ser considerados, computados ou acumulados para fins de concessão ou de cálculo de vantagens financeiras de qualquer natureza, e não serão incorporados à remuneração ou aos proventos da aposentadoria e pensões previdenciárias a cargo do Sistema.
Art. 6º As despesas decorrentes desta Lei correrão por
conta das dotações orçamentárias próprias da Superintendência da Polícia Civil,
que serão suplementadas, se insuficientes, pela Secretaria da Fazenda Estadual.
Art. 7º Caberá ao Poder Executivo regulamentar a presente Lei em
todos os aspectos necessários para a sua efetiva aplicação.
Art. 8º Estando a presente proposição de acordo com a conveniência do Poder Executivo, como rege a Constituição Estadual, o Governador do Estado enviará para esta Casa Legislativa uma mensagem para apreciação.
AUGUSTA BRITO
DEPUTADA
JUSTIFICATIVA:
O Brasil é um dos países mais violentos do mundo. Sob todos os aspectos, o número de mortes violentas chegou a níveis insuportáveis. Seja causada por guerra entre narcotraficantes, seja causada pelo mau-preparo das forças de segurança, seja causada pela cultura da violência, as taxas de mortalidade no Brasil seguiram nos últimos anos uma trajetória de alta, o que tem preocupado especialistas, políticos, mas sobretudo a população negra e pobre das periferias das cidades.
Não é mais tranquila a situação das mulheres. As taxas de feminicídio - homicídio causado contra a mulher por questão de gênero - no Brasil seguem elevadas e demandam além de uma mudança estrutural em nossa sociedade, a intervenção do Estado para prevenir as ocorrências e punir, conforme a lei, os assassinos de mulheres.
A partir de março de 2015, a Lei 13.104/2015 alterou o Código Penal Brasileiro e incluiu o feminicídio como uma das formas qualificadas do homicídio, assim compreendida quando a morte de uma mulher decorre de violência doméstica e familiar ou quando provocada por menosprezo ou discriminação da condição do sexo feminino.
As mortes de mulheres também são definidas por características relacionadas aos contextos em que ocorrem, as circunstâncias e segundo as formas de violência empregadas, conforme disposto nas Diretrizes Nacionais de Feminicídio[1]:
“Os contextos envolvem o ambiente privado e se referem à violência doméstica e familiar, conforme definida na Lei 11.340/2006, mas não se restringem a esses espaços podendo ocorrer também nos espaços públicos, inclusive em áreas dominadas pelo crime organizado (narcotráfico, quadrilhas ou máfias).
As circunstâncias incluem a violência nas relações familiares, mas também aquelas situações de maior vulnerabilidade como a exploração sexual, o tráfico de mulheres, e a presença do crime organizado.
As formas de violência geralmente envolvem a imposição de um sofrimento adicional para as vítimas, tais como a violência sexual, o cárcere privado, o emprego de tortura, o uso de meio cruel ou degradante, a mutilação ou desfiguração das partes do corpo associadas à feminilidade e ao feminino (rosto, seios, ventre, órgãos sexuais).”
Sobre a ocorrência dos casos de feminicídio se faz importante destacar a necessidade de se desenvolver uma visão ampliada para o crime cometido contra a vida dessas mulheres - é importante enxergar além do fato delituoso, mas também, as raízes sociais, históricas e culturais[2].
Segundo o Anuário Brasileiro da Segurança Pública 2020[3], nos anos de 2018 e 2019, em números absolutos, o país teve um total de 1.229 ( mil duzentos e vinte e nove) óbitos por feminicídio em 2018 e 1.326 ( mil trezentos e vinte e seis) em 2019, isto mostra que houve uma variação de 7,1% (sente virgula 1 por cento) entre esses dois anos.
Fazendo um recorte regional, e trazendo para o caso do Estado do Ceará, em 2018 foram registrados, em números absolutos, 30 (trinta) mortes por feminicídio e em 2019, 34 (trinta e quatro) óbitos pela mesma razão, gênero:
Fica evidente, por essa narrativa, que o combate a tais fenômenos deletérios não podem ficar adstritos à pura e simples esfera policial, por mais competente que sejam os agentes públicos de repressão. Estão a exigir, tais fenômenos deletérios, uma imediata intervenção parlamentar, na forma de um disciplinamento jurídico mais abrangente e mais eficaz, bem como com a elaboração de políticas públicas capazes de dar proteção a esse segmento.
Importante destacar também que, durante o ano de 2020, em publicação disponibilizada pela Rede de Observatórios de Segurança[4], constatou-se que nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Ceará e Pernambuco, por dia cinco mulheres foram vítimas de feminicídio.
Entre os mais de 18 mil eventos relacionados à segurança pública e a violência, 1.823 se referem aos crimes de gênero contra a mulher, o que dá a média de cinco casos ao dia. Feminicídios e violência contra mulher ocupam o terceiro lugar entre os registros da Rede em 2020. Estão atrás apenas de eventos com armas de fogo e ações policiais – que tradicionalmente ocupam o noticiário policial. Em 58% dos casos de feminicídios e 66% dos casos de agressão, os criminosos eram companheiros da vítima.
Por dia, cinco mulheres foram vítimas de feminicídio em 2020, conforme estudo da Rede de Observatórios da Segurança, que monitora a violência nos estados de São Paulo, Pernambuco, da Bahia, do Rio de Janeiro e Ceará, totalizando 449 casos de feminicídio, ou seja, assassinato de mulheres cometidos em função da vítima ser do gênero feminino. A pesquisa registrou 74% mais casos de feminicídios que o governo do Ceará. Em 2021, de janeiro a dezembro, a SSPDS registrou a ocorrência de 31 casos de feminicidio e oito casos nos meses de janeiro e fevereiro de 2022. .
Dados disponibilizados pela Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Estado Ceará mostram que, de janeiro à dezembro de 2021, foram registrados 18.889 (dezoito mil oitocentos e oitenta e nove) ocorrências de violência doméstica tipificadas na Lei Maria da Penha.
Assim sendo, diante da importância do projeto em tela, solicito apoio aos nobres pares para aprovação.
[1] ONU Mulheres. Diretrizes Nacionais do Feminicídio: investigar, processar e julgar com perspectiva de gênero as mortes violentas de mulheres. Disponível em: http://www.onumulheres.org.br/wpcontent/uploads/2016/04/diretrizes_feminicidio.pdf.
[2] FEMINICÍDIO: a dor de contar mortes evitáveis Ou sobre a (ir)responsabilidade do Estado na prevenção do assassinato de meninas e mulheres - FÓRUM CEARENSE DE MULHERES/AMB; abril,2020.
[3] Homicídios de mulheres e feminicídios (1) -Brasil e Unidades da Federação – 2018-2019
[4]Ramos, Silvia, A dor e a luta das mulheres: números do feminicídio / Silvia Ramos...[et al.]; ilustração Juliana Gama. - Rio de Janeiro : Juliana Gonçalves, CESeC, 2021.
AUGUSTA BRITO
DEPUTADA