PROJETO DE INDICAÇÃO N.º 655/2021
“ESTABELECE NORMAS E CRITÉRIOS BÁSICOS DE PRECAUÇÃO E PRESERVAÇÃO DO SOLO, DO MEIO AMBIENTE, FAUNA E FLORA, PROTEÇÃO E DEFESA DA SAÚDE, MEDIANTE COMBATE PREVENTIVO E CONTROLE DA POLUIÇÃO, CONSERVAÇÃO DA NATUREZA E PRÁTICAS DE MANEJO DOS RECURSOS NATURAIS PARA AS PRESENTES E FUTURAS GERAÇÕES, BEM COMO ESTABELECE RESTRIÇÕES À EXPLORAÇÃO DE ROCHA FOSFÁTICA COM URÂNIO ASSOCIADO E DERIVADOS, COMO ESPECIFICA”.
A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ DECRETA:
Art. 1º Esta Lei estabelece normas e critérios básicos de precaução e preservação do solo, do meio ambiente, fauna e flora, proteção e defesa da saúde, mediante combate preventivo e controle da poluição, conservação da natureza e práticas de manejo dos recursos naturais para as presentes e futuras gerações, bem como estabelece restrições à exploraçãode rocha fosfática com urânio associado e derivados no Estado do Ceará.
Art. 2º Por meio da Superintendência Estadual do Meio Ambiente (SEMACE), poderá buscar-se acordos de cooperação para a proteção dos recursos naturais, dos ecossistemas e dos processos ecológicos essenciais, bem como para o desenvolvimento sustentável que garanta sadia qualidade de vida, ampliando o território livre de exploração de rocha fosfática com urânio associado e derivados, nos termos desta lei.
Art. 3º Fica vedada a exploração de rocha fosfática com urânio associado e derivados, em especial, entre outros, se existirem riscos efetivos ou potenciais:
a)à poluição ou à escassez das águas ou lençóis freáticos ou aquíferos;
b)à saúde humana e ambiental, à fertilidade do solo, às atividades agrícolas e pecuaristas tradicionalmente exercidas na área respectiva, à poluição atmosférica capaz de produzir a chuva ácida, à fauna e à flora ameaçadas de extinção;
c) à segurança, à imagem e à reputação com a contaminação dos produtos da agricultura, da agropecuária e da agroindústria do Estado do Ceará no mercado;
d) às formas próprias de criar, fazer e viver de povos indígenas, povos quilombolas e comunidades tradicionais, que incluem assentados da reforma agrária, agricultores familiares, pescadores artesanais, aquicultores e silvicultores.
Parágrafo único. Para efeitos desta Lei, considera-se rocha fosfática com urânio associado e derivados aquela de origem fósforo-uranífera, obtida a partir do colofanito uranífero, uma fluoroapatita, cujo urânio decai, transformando-se noutros elementos químicos radioativos como os isótopos Torio-234, Protactinio-234, Radio-226, Radonio-222, Polonio-218 e Bismuto-214.
Art. 4º A legislação estadual ou municipal poderá, em acréscimo às restrições estabelecidas pelo art. 3º desta Lei, desde logo, especificar áreas de proteção especial e zonas livres de exploraçãode rocha fosfática com urânio associado, nas quais fica de pleno direito, imediatamente, vedada a exploração de rocha fosfática com urânio associado e derivados.
Art. 5º O empreendedor que quiser realizar exploração de rocha fosfática com urânio associado e derivados deverá apresentar estudos e demonstração técnica de que não há riscos efetivos ou potenciais aos atributos de proteção especial mencionados no art. 3º desta Lei e na legislação em vigor no âmbito do respectivo licenciamento ambiental.
Parágrafo único. Caso não sejam apresentados os estudos, a demonstração técnica previstos no caput deste artigo, as atividades de exploração de rocha fosfática com urânio associado e derivados ficarão vedadas.
Art. 6º A Superintendência Estadual do Meio Ambiente (SEMACE), a Secretaria da Saúde do Ceará (SESA), a Secretaria dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará (SRH/CE) e os Municípios envolvidos serão consultados no licenciamento ambiental relativo a empreendimentos de exploração de rocha fosfática com urânio associado e derivados, visando verificar se estão sendo respeitados os atributos protegidos em conformidade com o art. 3º desta Lei e da legislação em vigor.
§1º Os pareceres técnicos da Superintendência Estadual do Meio Ambiente (SEMACE), da Secretaria da Saúde do Ceará (SESA), da Secretaria dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará (SRH/CE) e dos Municípios serão considerados essenciais para a verificação se o empreendimento colocará em risco efetivo ou potencial quaisquer dos atributos de proteção especial mencionados no art. 3º desta Lei e na legislação em vigor.
§2º O parecer contrário expedido por qualquer destas entidades somente não será acatado mediante decisão fundamentada tecnicamente, por meio de contraste demonstrativo, comprovando que o empreendimento traz benefícios vantajosos nas variadas esferas de análise que superam os impactos sociais, econômicos e ambientais que serão produzidos com a sua implantação.
§3º A Secretaria dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará (SRH/CE) considerará os estudos e a demonstração técnica previstos no caput do art. 5º para realizar análise de mérito com vistas a emitir outorga de direito de uso de recursos hídricos ou outorga de execução de obras ou serviços de interferência hídrica de sua competência.
§4º Os Municípios envolvidos pelos impactos do empreendimento poderão considerar os estudos e a demonstração técnica previstos no caput do art. 5º para realizar análise de mérito com vistas a declarar que o local e o tipo de empreendimento ou atividade estão em conformidade com a legislação aplicável ao uso e à ocupação do solo.
Art. 7º Caso venham a ser concedidas as licenças ambientais ao empreendimento, será obrigatório ao empreendedor, antes do início das atividades, apresentar à Superintendência Estadual do Meio Ambiente (SEMACE), à Secretaria da Saúde do Ceará (SESA), à Secretaria dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará (SRH/CE) e aos Municípios, a fim de subsidiar trabalhos de fiscalização de impactos:
I - Estudo epidemiológico conclusivo de morbimortalidade e de incidência de neoplasias (diferenciando os casos por tipos de câncer e destacando os de pulmão, leucemia, tireoide, linfoma geral e cérebro), malformações congênitas e do grupo de causas mal definidas na área de influência direta e indireta do empreendimento, que deve ser feito a partir de dados primários, necessariamente, e secundários.
II - Estudo com a análise da composição química de amostras de águas, de solos, de sedimentos e de eventuais produtos da atividade agrícola, pecuarista e de piscicultura do local do empreendimento e respectivo entorno.
§1º. Os estudos previstos no caput deverão ser realizados por profissionais legalmente habilitados, às expensas do empreendedor.
§2º. O empreendedor e os profissionais que subscrevem os estudos previstos no caput deste artigo serão responsáveis pelas informações apresentadas, sujeitando-se às sanções administrativas, civis e penais.
Art. 8º Será interditado o empreendimento, mesmo licenciado e autorizado, que venha posteriormente, em função da exploração de fosfato associado a urânio e derivados, a causar perigo ou danos à vida, à propriedade de terceiros ou a ecossistemas, nos termos da legislação em vigor.
Art. 9º O descumprimento das disposições da presente Lei sujeitará os infratores às sanções administrativas, civis e penais, na forma da legislação vigente, em especial as previstas na Lei federal nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, e no Decreto federal nº 6.514, de 22 de julho de 2008, sem prejuízo da aplicação de outras normas.
Art. 10º As obrigações estabelecidas nesta lei aplicam-se a empreendimentos cujo licenciamento ambiental esteja em curso.
Art. 11º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Deputado
Dr. Carlos Felipe
O ano de 2011 ficou marcado pelo desastre de Fukushima, no Japão: o maior e mais recente acidente nuclear desde Tchernobyl (1986). O desastre gerou o vazamento de material radioativo e a contaminação do Oceano Pacífico, fazendo emergir um novo impulso de debate na sociedade acerca da relevância do uso da energia nuclear e de seus impactos no planeta. Estes acidentes trouxeram a atenção pública para a periculosidade da energia nuclear, mas dezenas de outros acidentes deixaram suas marcas na história em diversos países do mundo.
Incidentes marcantes em usinas também ocorreram em Windscale, na Inglaterra em 1957 e em Three Mile Island, nos EUA, em 1979. Há também incidentes com material radiativo de uso médico, como o emblemático caso de Goiânia em 1987, no Brasil, envolvendo Césio-137 e Tepojaco em 2013, no México, fruto de um acidente no transporte de material que ocasionou impossibilidade de contenção do Cobalto-60 que era transportado, levando a seu derramamento em via pública. Outro caso significativo ocorreu em Kyshtym (também conhecido como acidente de Mayak) na Antiga URSS em 1957, com a explosão de resíduos de um depósito de rejeitos devido a falha de refrigeração. O incidente levou a remoção imediata de mais de dez mil pessoas de suas residências e anos de recuperação, a qual continua até os dias de hoje. Também continua perdurando até hoje os danos dos dejetos radioativos espalhados pelos testes nucleares soviéticos realizados em Semipalatinsk, no Cazaquistão. Outro acidente de liberação massiva de radiação ocorreu em 1999, no Japão, provocada pela má gestão de procedimentos na unidade de reprocessamento de Tokaimura.
As pilhas de rejeitos das minas de Urânio em todo mundo também compõem um risco permanente, durante dezenas de milhares de anos, para as populações circunvizinhas e ao ambiente da região onde foram instaladas, sendo em geral fonte de continuidade de problemas de saúde para a população da região, como são os casos de Poços de Caldas/MG e Caetités/BA, no Brasil.
As consequências das radiações nucleares são diversas para os seres vivos, sendo a geração de síndromes do aparelho gastrointestinal, a falência do sistema nervoso central, a falência múltipla dos órgãos, o câncer e a morte algumas dessas consequências mais relatadas. O urânio é um dos elementos químicos encontrados na natureza cuja radiação ionizante pode interferir em todos os níveis das funções celulares, induzindo toxicidades química e radiológica, sendo cumulativo seu efeito no organismo.
Quantidades substanciais de urânio encontradas na crosta terrestre são provenientes dos chamados “recursos não convencionais”, sendo estes a partir dos quais o urânio pode ser obtido como subproduto em conjunto com outras substâncias. O principal recurso não convencional para o urânio é o fosfato de rocha, ou fosforito. No Brasil, o urânio é essencialmente um coproduto com fosfato, como o colofanito, muito comum no Estado do Ceará.
Os elementos do decaimento do Urânio não são menos perigosos que o material original. No caso particular do U-238, este decai (ou transforma-se), sequencialmente, nos isótopos Tório-234, Protactínio-234, Rádio-226, Radônio-222, Polônio-218 e Bismuto-214. Cada um destes também é emissor de radiação (alguns são inclusive emissores mais poderosos que o Urânio-238 original). O Chumbo, um elemento final do decaimento iniciado com o urânio é um químico estável, mas ainda assim é quimicamente pernicioso aos organismos, sendo encontrado no final da cadeia de decaimento do Urânio-238. Estes elementos estão presentes nos resíduos da pilha de rejeitos do processo de mineração e no processamento na unidade fabril, efetivamente transformando o local em que se dá a exploração num depósito de material nuclear a céu aberto. Também estão presentes no fosfato, quando associado e explorado conjuntamente com o urânio, sendo muito problemático o seu uso posterior.
O marco na produção de energia nuclear brasileira se dá a partir do desenvolvimento da tecnologia de ultracentrifugação no final da década de 1970, sendo datada de 1982 o início da produção de urânio no Brasil, no município de Caldas (MG), cuja mina foi explorada por 13 anos e abasteceu a usina de Angra I. Em janeiro de 2000, entrou em operação no município de Caetité (Bahia) a Unidade de Concentrado de Urânio das Indústrias Nucleares do Brasil (URA-INB), responsável pela atividade de mineração e pela transformação do urânio mineral em licor de urânio e este em concentrado de urânio, também conhecido como yellow cake, a principal matéria prima do combustível nuclear. No final de 2020, foi efetivada a abertura de uma nova mina no município, de modo que, após cinco anos, o país retomou a produção. Segundo o Ministério das Minas e Energia, essa retomada é a primeira fase para consolidar a proposta do Governo Federal de tornar o Brasil não apenas auto-suficiente, mas um exportador de urânio.
Os custos elevados da produção da energia nuclear, os riscos de acidentes, a geração de lixo radioativo que precisa ser armazenado e monitorado indefinidamente, por milhares de anos, suscita a questão da justificabilidade para o uso desse tipo de energia.
O exemplo de Caetité-BA é emblemático nesse sentido, pois as denúncias sobre violações aos direitos humanos ambientais em Caetité (BA) são inúmeras. Logo após o início do funcionamento da mina, ainda nos anos 2000, 5 milhões de litros de licor de urânio transbordaram das bacias de sedimentação e vazaram para o meio ambiente, com a possível contaminação do solo no município. Entre janeiro e junho de 2004, a bacia de barramento de “finos” transbordou liberando efluentes líquidos com concentração de urânio-238, tório-232 e rádio-226 no leito do Riacho das Vacas. Em 2006, ocorreu o rompimento em uma das mantas da bacia de licor uranífero, com paralisação de atividades por cerca de 60 dias. Em 2008, houve denúncias de vazamentos dos tanques de lixiviação. Ainda em 2008, a organização ambientalista Greenpeace investigou a contaminação da água, realizando testes independentes nos poços d’água para consumo humano. Verificou-se a contaminação em poços localizados a 20 km da área da mineração, área de influência direta da mina, cujos dados foram lançados no relatório “Ciclo do Perigo: impactos da produção de combustível nuclear no Brasil”, trazendo atenção nacional e internacional para a questão. Em outubro de 2009 novas denúncias relataram um novo caso de vazamento nas dependências da URA-INB, de cerca de 30 mil litros de licor de urânio, com transbordamento de material radioativo. Em maio de 2010, houve o rompimento de uma tubulação da INB, levando 900 litros de licor de urânio para o solo, na área de extração e beneficiamento do minério.
A produção de material particulado contendo elementos como urânio, rádio, tório e chumbo pelas operações de desmonte, britagem, moagem de rochas e pela dispersão do material contido nas pilhas de rejeitos, provocada pela ação dos ventos, que podem ser ingeridos ou inalados, também gera o risco de contaminação por metais pesados e elementos radioativos. Assim, os riscos à saúde ambiental das populações e comunidades que vivem no entorno de uma jazida e à saúde dos trabalhadores e trabalhadoras da mineração estão entre os principais impactos potenciais desse tipo de atividade. Também o são o transporte rodoviário e as operações portuárias do material radioativo que se pretende escoar.
Considerando as experiências de mineração de urânio anteriormente mencionadas (Poços de Caldas-MG e Caetité-BA) e a complexidade do monitoramento ambiental em áreas de exposição crônica e prolongada a baixos níveis de radiação natural ou ampliada pela lavra de minérios contendo radionuclídeos, torna-se evidente a necessidade de produzir uma ampla e confiável base de dados epidemiológicos prévia à exploração. A qualidade desses dados é fundamental para a rápida identificação e ação diante de possíveis mudanças nos níveis endêmicos e epidêmicos de agravos relacionados a migrações induzidas pelo empreendimento ou em decorrência de danos genéticos preexistentes e neo existentes na área diretamente afetada e nas áreas de influência direta e indireta do empreendimento, por isso enfatiza-se a obrigatoriedade da produção de dados primários em caso de autorização de instalação de empreendimento. Os dados secundários, quando utilizados, devem ser acompanhados de caracterização técnica-científica de sua qualidade e sensibilidade para os fins propostos.
Sabendo que o estado do Ceará possui considerável reserva de minério de urânio associado ao fosfato em seu subsolo, torna-se imperativa a necessidade de estabelecer normas para proteção e defesa do meio ambiente e da saúde mediante combate preventivo e controle da poluição, pois a garantia do direito fundamental à saúde pressupõe a formulação de políticas e projetos que levem em conta a responsabilidade na prevenção das doenças. Também é direito fundamental o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público o dever de preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
Por estar inserido no semi-árido nordestino, possuindo um regime pluviométrico particular e possuindo ainda a ocorrência de rios intermitentes, o déficit hídrico da região é um agravante para a segurança e soberania popular no uso da água, sobretudo quando há a ocorrência de empreendimentos que demandam de forma intensiva a oferta de recursos hídricos para o funcionamento, como é o caso da extração e enriquecimento de urânio. O déficit hídrico que é aumentado para viabilizar esses empreendimentos pode colocar em risco não somente o abastecimento para as pessoas e comunidades, mas também a própria viabilidade de qualquer outra atividade econômica.
Ao mesmo tempo, existem vários distritos, nos mais diversos municípios do estado, em que a produção e a comercialização de produtos da agricultura familiar camponesa geram trabalho digno e são fontes importantes de renda. São territórios de convivência com o Semiárido, saúde, transmissão intergeracional de conhecimentos e diversidade. Através da cultura popular sertaneja, da solidariedade e do respeito ao ambiente, eles tecem modos de vida baseados no cultivo da terra e na criação de pequenos animais; na preservação e na partilha de sementes crioulas; na produção de legumes, hortaliças, frutas e ervas medicinais e no cuidado com as águas.
A alternativa que afirma a vida já está sendo cultivada há décadas nos territórios através da agricultura familiar camponesa – com amplos conhecimentos e experiências sobre o manejo da terra e das águas no Semiárido, o cultivo agrícola e a criação de animais de pequeno porte, como caprinos, ovinos, abelhas, entre outros. Ela tem a capacidade de gerar trabalho e renda para a população local, com justiça social, hídrica e ambiental, sem contaminar o ambiente, esgotar a água e comprometer a saúde da região.
Por todo o exposto, tem-se que é de suma importância a preservação do solo, do meio ambiente, fauna e flora, proteção e defesa da saúde, mediante combate preventivo e controle da poluição, conservação da natureza e práticas de manejo dos recursos naturais para as presentes e futuras gerações, por meio do estabelecimento de restrições à exploração de rocha fosfática com urânio associado e derivados no Estado do Ceará.
Consagrado pelo artigo 225 da Constituição Federal de 1988, o direito fundamental ao meio ambiente define os contornos de uma ordem ambiental constitucional. Essa ordem se reflete na máxima jurídica de “in dúbio, pro ambiente” bem como na consagração dos princípios da prevenção e da precaução.
O princípio da precaução (ou cautela) aplica-se para tutela do meio ambiente quando há incerteza e desconhecimento científico acerca dos prováveis danos a serem empreendidos. Foi reconhecido como regra de direito internacional a partir da sua positivação no art. 15 da Declaração do Rio 92, fruto da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, estando presente, exemplificativamente, na Convenção sobre Diversidade Biológica (ratificada pelo Decreto nº. 2.519/98).
O princípio da prevenção, por sua vez, desponta quando se conhecem os impactos oriundos do perfil da atividade poluente, quando o risco é certo. Encontra-se normatizado, por exemplo, como princípio fundante da ordem ambiental constitucional e infraconstitucional, a exemplo da lei 12.187/2009 (Política Nacional de Mudança do Clima).
Considerando esta normatização, o projeto em apreço visa tutelar o direito fundamental ao meio ambiente, no exercício da competência material comum dos entes federativos na proteção do meio ambiente e combate a qualquer forma de poluição, conforme ditame do art.23, VI da Constituição Federal e o art. 15 da Constituição Estadual.
O direito fundamental ao meio ambiente é tutelado na Constituição Federal via art. 225 e na Constituição Estadual via art. 259, ao dispor que:
Art. 259. O meio ambiente equilibrado e uma sadia qualidade de vida são direitos inalienáveis do povo, impondo-se ao Estado e à comunidade o dever de preservá-los e defendê-los.
Vale destacar que a Constituição Estadual dispõe que é dever do Estado combater a poluição em qualquer de suas formas, conforme dispõe o art. 259, XII.
No que tange ao exercício da competência legislativa, cabe aos entes legislar concorrentemente sobre a proteção do meio ambiente e combate à poluição (art. 24, VI, CF/88 e art.16 da Constituição Estadual).
Cumpre igualmente ressaltar que a CF/88 traz o direito social à saúde em seu bojo (art. 6º, da CF/88). Segundo a carta magna, é competência material comum dos entes federativos o cuidado com a saúde (art. 23, II, da CF/88). Ademais, cabe aos entes legislarem concorrentemente sobre a defesa da saúde (art. 24, XII, da CF/88; art. 16, XII, da Constituição Estadual).
A LC nº 140/2011 dispõe:
Art. 8º São ações administrativas do Estado:
(...)
X - definir espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos;
Nesse sentido, é que este projeto de lei protege especialmente os componentes do art. 3º.
Além disso, está em consonância com a Resolução CONAMA nº 237 que dispõe:
Art. 4º. (...)
§ 1º - O IBAMA fará o licenciamento de que trata este artigo após considerar o exame técnico procedido pelos órgãos ambientais dos Estados e Municípios em que se localizar a atividade ou empreendimento, bem como, quando couber, o parecer dos demais órgãos competentes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, envolvidos no procedimento de licenciamento.
(...)
Art. 10. (...)
§ 1º - No procedimento de licenciamento ambiental deverá constar, obrigatoriamente, a certidão da Prefeitura Municipal, declarando que o local e o tipo de empreendimento ou atividade estão em conformidade com a legislação aplicável ao uso e ocupação do solo e, quando for o caso, a autorização para supressão de vegetação e a outorga para o uso da água, emitidas pelos órgãos competentes.
Assim, conforme o art. 4º, §1º da Res. CONAMA nº 237 acima transcrito, bem como o art. 13, §1º, da LC 140/2011, sendo o IBAMA competente para licenciar empreendimento de exploração de fosfato associado a urânio e seus derivados, deverá considerar os exames técnicos referidos no art. 6º desta proposição, devendo justificar o excepcional não acatamento de eventual parecer contrário nos termos do §2º do mesmo artigo, em consonância com o princípio da motivação.
Noutro giro, conforme o art. 10, §1º, da Resolução CONAMA nº 237 acima transcrito, tem-se que tanto a outorga para uso da água pelo órgão competente como a certidão do Município de conformidade com a legislação aplicável ao uso e ocupação do solo são manifestações de caráter vinculante. Nesse sentido, caso a outorga ou a certidão não seja emitida, o licenciamento ambiental não poderá prosseguir. Este projeto de lei, portanto, objetiva fornecer melhores subsídios para a análise de mérito necessária previamente à outorga e à certidão.
No tocante à outorga para o uso da água, a Lei nº9433/1997 dispõe:
Art. 29. Na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, compete ao Poder Executivo Federal:
(...)
II - outorgar os direitos de uso de recursos hídricos, e regulamentar e fiscalizar os usos, na sua esfera de competência;
(...)
Parágrafo único. O Poder Executivo Federal indicará, por decreto, a autoridade responsável pela efetivação de outorgas de direito de uso dos recursos hídricos sob domínio da União.
Art. 30. Na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, cabe aos Poderes Executivos Estaduais e do Distrito Federal, na sua esfera de competência:
I - outorgar os direitos de uso de recursos hídricos e regulamentar e fiscalizar os seus usos;
Por sua vez, a Lei Estadual nº 14.844/2010 dispõe:
Art. 49. Na implementação da Política Estadual de Recursos Hídricos, compete à Secretaria dos Recursos Hídricos – SRH:
IX - expedir outorga de direito de uso de recursos hídricos, efetuando sua fiscalização e aplicando sanções de acordo com esta Lei e seu regulamento;
X - expedir outorga para execução de obras e/ou serviços de interferência hídrica, sem prejuízo da licença ambiental obrigatória;
Conclui-se que a Secretaria dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará (SRH/CE) é o órgão competente para expedir outorga de direito de uso de recursos hídricos e outorga de execução de obras ou serviços de interferência hídrica, no caso de recursos hídricos que não estão sob domínio da União.
Como se observou, depreende-se do art. 10, §1º, da Resolução CONAMA nº 237 que, quando o empreendimento, em processo de licenciamento ambiental, demanda uso de recursos hídricos, obrigatoriamente, deverá constar a outorga para o uso da água, emitida pelo órgão competente.
Nesse sentido, em conformidade com a legislação acima, esta proposição prescreve em seu art. 6º, §3º, que “a Secretaria dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará (SRH/CE) considerará os estudos e a demonstração técnica previstos no caput do art. 5º para realizar análise de mérito com vistas a emitir outorga de direito de uso de recursos hídricos ou outorga de execução de obras ou serviços de interferência hídrica de sua competência”.
Já no tocante ao uso e ocupação do solo depreende-se do art. 10, §1º, da Resolução CONAMA nº 237 que, no procedimento de licenciamento ambiental, deverá constar, obrigatoriamente, a certidão da Prefeitura Municipal, declarando que o local e o tipo de empreendimento ou atividade estão em conformidade com a legislação aplicável ao uso e ocupação do solo, motivo pelo qual a presente proposição prevê a faculdade do art. 6º, §4º aos municípios, a fim de lhes fornecer maiores subsídios para a análise de mérito com vistas à emissão da certidão.
Cumpre esclarecer ainda que os dois estudos propostos neste projeto visam subsidiar os trabalhos de fiscalização previstos no art. 248, XVI, da Constituição do Estado do Ceará; no art. 17, caput e parágrafos, da LC 140/2011; no art. 49, IX e X, da Lei Estadual nº 14.844/2010 .
Como já exposto, o estudo epidemiológico é fundamental para a rápida identificação e ação diante de possíveis mudanças nos níveis endêmicos e epidêmicos de agravos relacionados a migrações induzidas pelo empreendimento ou em decorrência de danos genéticos preexistentes e neo existentes na área diretamente afetada e nas áreas de influência direta e indireta do empreendimento. Vale ressaltar que dados primários são essenciais uma vez que tratamentos de saúde realizados em localidades distintas comumente mascaram dados secundários.
Já o estudo com a análise da composição química de amostras de águas, de solos, de sedimentos e de eventuais produtos da atividade agrícola, pecuarista e de piscicultura do local do empreendimento e respectivo entorno é crucial para que se possa facilmente elucidar a existência de nexo de causalidade entre as atividades do empreendimento e a eventual poluição, por meio de comparativo entre a composição química anterior e posterior ao início das atividades.
Ante o exposto, a presente proposição está em consonância com o ordenamento jurídico pátrio, visando cumprir o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, os princípios da precaução e da prevenção e o direito à saúde.
Fontes:
http://www.inb.gov.br/A-INB/Quem-somos/Hist%C3%B3ria
http://www.repositorio.ufc.br/handle/riufc/21640
Renato Roseno
Deputado
Dr. Carlos Felipe
Deputado