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PROJETO DE LEI N.º 335/2021

 

“INSTITUI O DIA DA PRETA TIA SIMOA E DA MULHER NEGRA E A SEMANA PRETA TIA SIMOA DE COMBATE À DISCRIMINAÇÃO CONTRA AS MULHERES NEGRAS NO ESTADO DO CEARÁ”.

 

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ APROVA:

 

Art. 1º Fica instituído no Calendário Oficial do Estado do Ceará o Dia Estadual da Preta Tia Simoa e da Mulher Negra a ser comemorado, anualmente, no dia 25 de julho.

 

Art. 2º Fica criada a Semana Preta Tia Simoa de Combate à Discriminação Contra Mulheres Negras no Estado do Ceará.

 

Art. 3º A Semana Preta Tia Simoa de Combate à Discriminação Contra Mulheres Negras tem como objetivos:

I – Promover a visibilidade de raça e gênero e fortalecer as ações contra o racismo, sexismo e todas as formas de violência contra as mulheres negras;

II – Preservar a memória e a contribuição dos povos afrodescendentes, em especial das mulheres negras, para a formação social do estado do Ceará;

III - Conscientizar a comunidade acerca da responsabilidade do poder público e da sociedade como um todo para com a promoção da equidade de raça e gênero e com o pleno exercício da cidadania pelas mulheres negras;

IV – Promover o debate acerca da condição da mulher negra na sociedade brasileira em intersecção entre os marcadores de raça, gênero, sexualidade e condição socioeconômica;

V - Estimular reflexões sobre estratégias de prevenção e combate a todas as formas de violência que atingem as mulheres negras.

 

Art. 4º A Semana Preta Tia Simoa de Combate à Discriminação Contra Mulheres Negras passará a fazer parte do Calendário Oficial de Eventos do Estado do Ceará e será realizada, anualmente, na primeira semana do mês de agosto.

 

Art. 5º. A Semana Preta Tia Simoa de combate à violência contra mulheres negras poderá ser realizada em parceria com voluntários, universidades, sociedade civil e a comunidade escolar

 

Art. 6º Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.

 

 

 

RENATO ROSENO

DEPUTADO

 

 

JUSTIFICATIVA:

 

A presente proposição busca chamar a atenção para a situação de um dos setores mais explorados e oprimidos da sociedade, que é a mulher negra, e para os indicadores sociais, econômicos, políticos, que denunciam a condição da mulher negra na sociedade brasileira. 

Por conta das dificuldades de acesso à escolaridade e formação profissional, as mulheres negras são a maioria no trabalho doméstico e em outros serviços de baixa remuneração e que exigem menor qualificação. Desse modo, a população negra é impactada por ter maior participação na informalidade, sendo os primeiros extratos da população a serem afetados em qualquer crise.

Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revelam que mulheres negras estão 50% mais suscetíveis ao desemprego do que outros grupos. Segundo o Ipea, enquanto o desemprego entre mulheres negras subiu 80% em relação ao período anterior à crise econômica, entre homens brancos o aumento foi de 4,6 pontos percentuais – entre homens negros, houve crescimento de 7 pontos percentuais.

De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 39,8% de mulheres negras compõem o grupo submetido a condições precárias de trabalho – homens negros abrangem 31,6%; mulheres brancas, 26,9%; e homens brancos, 20,6% do total. Esse quadro de desigualdade é evidenciado mesmo quando a graduação no ensino superior é considerada.

O dia 25 de julho marca o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha. A data foi escolhida durante o 1º Encontro de Mulheres Afro-Latino-Americanas e Afro-Caribenhas realizado em Santo Domingo, na República Dominicana, em 1992. Ao longo dos anos, a data vem se consolidando no calendário de luta do movimento negro e tem resgatado a luta e a resistência das mulheres negras, bem como cumprido o papel de denunciar as consequências da dupla opressão que sofrem, com o racismo e o machismo.

No Brasil, por força da Lei Federal nº 12.987/2014, o dia também homenageia Tereza de Benguela, líder quilombola que viveu durante o século XVIII e se tornou rainha, resistindo bravamente à escravidão por duas décadas. Um histórico de luta e resistência, no enfrentamento ao escravismo, dirigindo insurreições.

Com a morte do companheiro, Tereza se tornou líder do quilombo, e, sob sua liderança, a comunidade negra e indígena resistiu à escravidão por duas décadas, sobrevivendo até 1770, quando o quilombo foi destruído pelas forças de Luiz Pinto de Souza Coutinho e a população (79 negros e 30 índios), morta ou aprisionada.

Assim como Tereza, outras mulheres foram e são importantes para a nossa história. Com trabalhos impecáveis e perseverança, elas deixaram um legado, que cabe a nós reverenciar e visibilizar no sentido de promover a emancipação das mulheres negras.

Destaca-se particularmente Antonieta de Barros, Aqualtune, Theodosina Rosário Ribeiro, Benedita da Silva, Jurema Batista, Leci Brandão, Chiquinha Gonzaga, Ruth de Souza, Elisa Lucinda, Conceição Evaristo, Maria Filipa, Maria Conceição Nazaré (Mãe Menininha de Gantois), Luiza Mahin, Lélia Gonzalez, Dandara, Carolina Maria de Jesus, Elza Soares, Mãe Stella de Oxóssi, Marielle Franco, entre tantas outras.

No Ceará, a importante atuação de Preta Tia Simoa foi fundamental para a abolição da escravização de negros.

 Preta “Tia Simoa” foi uma negra liberta que, liderou os acontecimentos de 27, 30 e 31 de janeiro de 1881 em Fortaleza, episódio que ficou conhecido como a “Greve dos Jangadeiros”.

Nessa ocasião, os trabalhadores organizados puseram fim ao embarque de escravizados naquele porto, definindo os rumos para a abolição da escravidão na então Província do Ceará, que se efetivaria três anos mais tarde.

Preta Tia Simoa teve sua participação invisibilizada na história do Ceará onde, ainda hoje, persiste a falsa premissa da ausência de pessoas negras.

Esta ausência de registro histórico demarca uma diferença crucial entre abolição e liberdade: o processo abolicionista no Ceará ou no restante do país não buscava a liberdade para a população negra, mas a transição ordenada de um modelo de exploração para outro, de maneira a assegurar os interesses econômicos da elite. Por outro lado, o protagonismo de Simoa ao lado dos seus companheiros e companheiras ocultas na historiografia oficial são exemplos de luta pela liberdade que, sabiam eles, não estava assegurada com a abolição.

Destaca-se que, em razão da data proposta para o Dia Estadual da Preta Tia Simoa e da Mulher Negra recair sobre dia que ordinariamente compõe o período de recesso escolar (25 de julho), propõe-se no artigo 4º que as atividades alusivas à Semana Preta Tia Simoa de Combate à Discriminação Contra Mulheres Negras sejam realizadas na primeira semana do mês de agosto de cada ano, de modo a possibilitar a realização de atividades pelas instituições de ensino com fulcro na lei a ser aprovada.

Nesse sentido, solicito o apoio dos nobres pares na aprovaçao da presente proposição que busca tanto reparas a histórica injustiça promovida pelo apagamento da contribuição de Preta Tia Simoa para a história de nosso estado ao nomear em sua homenagem a Semana Estadual de Combate à Violência Contra as Mulheres Negras e ao criar o Dia Estadual da Preta Tia Simoa e da Mulher Negra como  promover o relevante debate acerca do combate à discriminação contra as mulheres negras em nosso estado.

 

 

RENATO ROSENO

DEPUTADO