PROJETO DE LEI N.° 170/20
“RECONHECE, NO ÂMBITO DO ESTADO DO CEARÁ, A VISÃO MONOCULAR COMO DEFICIÊNCIA SENSORIAL DO TIPO VISUAL E DÁ OUTRAS PROVIDENCIAS.”
Art. 1º - Fica reconhecida como deficiência sensorial do tipo visual, no âmbito do Estado do Ceará, a visão monocular.
Parágrafo Único - A classificação a que se refere o caput deste artigo possibilitará ao deficiente sensorial monocular/cegueira legal, os mesmos direitos e garantias asseguradas às pessoas com deficiência, previstos na legislação estadual.
Art. 2º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 3° - Revogam-se as disposições em contrário.
LEONARDO ARAÚJO
DEPUTADO
JUSTIFICATIVA
Este projeto de lei visa reconhecer a visão monocular como deficiência sensorial do tipo visual, no âmbito do Estado do Ceará, objetivando estender os mesmos direitos e garantias asseguradas às pessoas com deficiência previstas na legislação estadual.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) classifica a visão monocular como aquela em que o paciente com a melhor correção tem visão igual ou inferior a 20/200 caracterizando a “cegueira legal”, sendo que, nessas situações, a classificação internacional de doenças (CID 10) é o H:54.4.
Segundo a literatura médica, os indivíduos com visão monocular tem redução de aproximadamente 25% no campo visual, o que causa enormes dificuldades cotidianas. Como consequência, eles sofrem com a diminuição de sua orientação espacial, a qual é resultado das sugestões cenestésicas que se extraem da convergência do funcionamento dos dois olhos.
Com frequências, indivíduos monoculares sofrem com a colisão em objetivos e/ou pessoas, dificuldades para subir e descer escadas e meios-fios, cruzar ruas, dirigir, praticar esportes, além de outras atividades da vida diária que requerem a esteropsia e a visão periférica. Portanto, demandam cuidados especiais quando da vida em sociedade.
De acordo com a PDR da oftalmologia, a perda total da visão de um olho constitui em uma perda de 25% do sistema visual e em um comprometimento de 24% para o homem como um todo.
Partindo desse pressuposto, inúmeras decisões judiciais vêm sendo proferidas no sentido de se reconhecer a visão monocular como deficiência, garantindo aos indivíduos nessa condição os direitos previstos por lei a todos os deficientes.
Conforme a Súmula 377 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), “O portador de visão monocular tem direito a concorrer, em concurso público, às vagas reservadas a deficientes”.
Na mesma linha, o Supremo Tribunal Federal (STF) também firmou entendimento no sentido de se reconhecer a condição de visão monocular como deficiência, proferindo diversas decisões, conforme se observa adiante:
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINARIO COM AGRAVO. CONCURSO PÚBLICO. DEFICIENTE FISICO. CANDIDATO COM VISÃO MONOCULAR. CONDIÇÃO QUE O AUTORIZA A CONCORRER AS VAGAS DESTINADAS AOS DEFICIENTES FISICOS. PRECENDENTES. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal assentou o entendimento de que o candidato com visão monocular é deficiente físico. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. Agravo regimental a que se nega provimento. (ARE 760015 AgR, Relator(a): ROBERTO BARROSO, primeira turma, julgado em 24/06/2014, ÁCORDÃO ELETÔNICO DJe-151 DIVULG 05-08-2014 PUBLIC 06-08-2014)
No mesmo sentido, o Ministério de Trabalho e Emprego fez constar em seu parecer, PARACER/CONJUR/TEM/Nº 444/2011, o reconhecimento do deficiente visual MONOCULAR ao preenchimento de cotas nas vagas destinadas aos deficientes em empresas privadas, segundo demonstrado abaixo:
EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E DO TRABALHO. CONSULTA ORIUNDA DA SECRETARIA DE INSPEÇÃO DO TRABALHO – SIT. VISÃO MONOCULAR. DEFICIÊNCIA PARA FINS DO PREENCHIMENTO DA COTA prevista no Art. 93 da Lei 8.213, de 1991, Súmula STJ Nº 377 e Súmula AGU Nº 45. Processo Nº 46014.000790/2011-36.
A ilustre Advocacia-Geral da União (AGU) fez publicar, no Diário Oficial da União dos dias 15, 16 e 17 de setembro de 2009, a Súmula nº. 45 subscrita pelo Advogado-Geral da União, José Antônio Dias Toffoli, explicitada no seguinte verbete:
OS BENEFÍCIOS INERENTES À POLÍTICA NACIONAL PARA A INTEGRAÇÃO DA PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA DEVEM SER ESTENDIDOS AO PORTADOR DE VISÃO MONOCULAR, QUE POSSUI DIREITO DE CONCORRER, EM CONCURSO PÚBLICO, À VAGA RESERVADA AOS DEFICIENTES.
A Receita Federal publicou o Despacho MF Nº SN2, de 14 de Março de 2016, (Publicado(a) no DOU de 29/03/2016, seção 1, pág 41), isentando o deficiente visual monocular do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física para portadores de MOLÉSTIA GRAVE.
A Convenção da Organização das Nações Unidas (ONU), primeiro tratado de direitos humanos do século XXI, foi aprovada por maioria absoluta do Congresso Nacional, tendo, por isso, peso de norma constitucional, o documento, assinado por 192 países, define como pessoa com deficiência, por exemplo, quem tem visão monocular.
Importância da Inclusão Social
“Geralmente as pessoas com visão monocular apresentam uma aparência que pode gerar exclusão social, pois essas pessoas comumente apresentam “olho torto” (estrabismo com assimetropia), “olho cinza” (amaurose), ou “olho de vidro” (prótese ocular). Sob este enfoque, é possível se entender que as pessoas com visão monocular, não estão integradas à sociedade, uma vez que sofrem preconceitos e discriminações, porque são consideradas “anormais” ao serem apreciadas sob o “padrão de normalidade”. O emprego e a autoestima são os problemas mais frequentes para quem convive com a doença. Portanto, é importante que o Poder Público estabeleça mecanismos para favorecer a inclusão social da pessoa com visão monocular, assim como estratégias para que a pessoa com deficiência seja respeitada em suas peculiaridades e necessidades” (LEANDRO LINO, advogado especialista na causa monocular).
Em suma, é pacífico tanto para o Poder Judiciário quanto para o Poder Executivo Estadual o enquadramento do indivíduo com visão monocular como deficiente, muito embora ainda existam situações em que os monoculares se veem constrangidos a não ter seus direitos reconhecidos.
No Estado do Ceará, muitos monoculares não conseguem o direito ao transporte público gratuito, garantido a todos os deficientes. São inúmeros os relatos dos monoculares que reclamam que não conseguem acesso ao transporte gratuito e outros direitos garantidos aos demais deficientes, simplesmente porque o Estado ainda não tem legislação reconhecendo a condição do monocular como deficiência, sendo necessário recorrer à justiça para fazer valer seus direitos.
O propósito do presente projeto de lei é corrigir essa situação de injustiça no âmbito estadual e na esteira do entendimento majoritário do Poder Judiciário.
Os direitos às pessoas com deficiência estão garantidos em nosso ordenamento jurídico pela Constituição Federal, pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, pela Lei Brasileira de Inclusão nº 13.146, de 06 de julho de 2015, e demais normas protetivas. Cabe a nós, legisladores, garantir que o Ceará seja um Estado justo e inclusivo.
Faz-se imprescindível ressaltar que a presente propositura não se enquadra no rol de matérias de competência legislativa exclusiva do poder executivo, uma vez que busca o mero reconhecimento da visão monocular como deficiência, estendendo a todos os monoculares do Ceará, nesta situação, os mesmos direitos garantidos aos demais deficientes pelo ordenamento jurídico estadual.
Diante do exposto, requeremos a colaboração e o entendimento dos nobres deputados para aprovação deste projeto de lei.
LEONARDO ARAÚJO
DEPUTADO