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PROJETO DE LEI N.° 156 /20

“ESTABELECE PROCEDIMENTO REMOTO DE INFORMAÇÕES AOS FAMILIARES DE PESSOAS INTERNADAS COM SUSPEITA OU COMPROVADA INFECÇÃO PELO NOVO CORONAVÍRUS EM HOSPITAIS PÚBLICOS OU PRIVADOS NO ESTADO DO CEARÁ.”

 

 

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ APROVA:

Art. 1º Fica estabelecido procedimento remoto para o envio de informações aos familiares de pessoas internadas com suspeita ou comprovada infecção pelo novo coronavírus em hospitais públicos ou privados no âmbito do estado do Ceará.

Art. 2º No momento da internação do paciente, deverá ser preenchido formulário que contenha dados de, pelo menos, 1 (um) familiar ou pessoa próxima para que receba informações a respeito do quadro de saúde do paciente.

Parágrafo Único. Nos casos em que o paciente seja internado inconsciente ou não saiba informar um contato de familiar ou pessoa próxima, deverá ser realizada busca ativa pela unidade de saúde.

Art. 3º As unidades de saúde deverão fornecer diariamente informações atualizadas sobre o quadro clínico dos pacientes, sob a responsabilidade ou coordenação de médicos que tenham conhecimento sobre o prontuário.

§1º As informações serão prestadas, preferencialmente, através de comunicação telefônica.

§2º Na impossibilidade de prestação na forma disposta no §1º, as informações deverão ser enviadas por aplicativo de mensagens, de forma simples e clara, em formato de áudio ou vídeo, contendo a identificação do profissional responsável pelo contato.

§3º Não sendo possíveis as comunicações previstas nos parágrafos anteriores, as unidades de saúde encaminharão as informações via e-mail ou outra forma de comunicação eletrônica.

§4º No caso de óbito, as informações acerca da causa mortis e dos procedimentos necessários para a liberação do corpo devem ser fornecidas imediatamente ao familiar ou pessoa próxima.

Art. 4º Sem prejuízo da comunicação prevista no artigo 3º desta Lei, os estabelecimentos hospitalares poderão prestar, por meio de equipe multidisciplinar, outras informações que se fizerem necessárias ao acolhimento familiar e ao esclarecimento do quadro de saúde do paciente, observada a ética profissional e respeitadas as atribuições e competências de cada carreira.

Art. 5º O disposto nesta Lei se aplica aos familiares dos internos do sistema prisional, dos adolescentes que estão em cumprimento de medida socioeducativa e das pessoas em acolhimento institucional que estejam com suspeita ou comprovada infecção pelo novo coronavírus no âmbito do estado do Ceará.

Parágrafo Único. Caso o tratamento seja realizado na unidade prisional, no centro socioeducativo ou na instituição de acolhimento, a prestação diária de informações aos familiares ou pessoas próximas deverá ser realizada pela equipe de saúde respectivamente responsável.

Art. 6º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

 

 

RENATO ROSENO

DEPUTADO

 

 

JUSTIFICATIVA

O projeto de lei ora apresentado visa estabelecer procedimento remoto padrão de comunicação entre os profissionais de saúde de hospitais públicos ou privados com familiares de pacientes internados com suspeita ou comprovada infecção do novo coronavírus no estado do Ceará.

É de conhecimento público a grave situação sanitária a qual o Brasil está submetido nesse momento pela pandemia do novo coronavírus. Por sua característica de rápida propagação, a quantidade de pessoas infectadas pela referida doença cresce de maneira exponencial. Uma porcentagem relevante de quem contrai a COVID-19 demanda internação nas unidades de saúde, seja em leitos de enfermaria ou em unidades de terapia intensiva (UTI).

Atualmente, os estados que concentram o número de pessoas contaminadas pela doença, dentre os quais o Ceará está incluído, operam o atendimento dos infectados com o sistema de saúde no limite de sua capacidade. Mesmo com o esforço de Prefeitos e Governadores no sentido de ampliar os leitos disponíveis ao atendimento de pacientes com o novo coronavírus, a velocidade de disseminação da doença tem sido maior do que os esforços empreendidos pelo Poder Público no crescimento de sua estrutura hospitalar.

Face a tal realidade, foi publicado o decreto estadual nº 33.574, de 05 de maio de 2020, que institui, no município de Fortaleza, a política de isolamento social rígido como medida de enfrentamento à COVID-19, notadamente os artigos 5º, cuja redação estabelece o dever geral de permanência domiciliar, e 6º, que normatiza o controle da circulação de veículos particulares em vias públicas. O chamado “lockdown” vem sendo adotado por vários estados da federação a fim de reduzir a velocidade do contágio e possibilitar que a ampliação de leitos suporte a demanda. Em decorrência do aumento do número de pacientes internados em hospitais públicos e privados no Ceará, potencializa-se a discussão sobre a prestação de informações às famílias sobre o estado de saúde de seus entes queridos.

O protocolo remoto de informações que se objetiva instituir no estado do Ceará mediante o presente projeto de lei obedece a essa preocupação. Muitas famílias não obtêm regular comunicação com os profissionais de saúde no que diz respeito ao estado do parente internado tampouco às eventuais oscilações ao longo do tratamento. Fruto desse problema, há um aumento da sensação de ansiedade e de demais transtornos psicológicos, podendo tais preocupações se desenvolver a ponto de os familiares se deslocarem às dependências das unidades hospitalares, medida fortemente desaconselhada pelas autoridades sanitárias por risco de contágio da COVID-19.

Ademais, uma outra consequência danosa percebida através das dificuldades de comunicação com os profissionais de saúde acerca do estado do paciente é a disseminação de notícias falsas. A circulação de informações mentirosas concernentes a uma suposta quantidade artificial e alheia à realidade de óbitos por COVID-19 atesta essa situação. Como medida para combater tal ilegalidade tão nociva à democracia e à saúde da sociedade, propõe-se em um dos dispositivos do projeto protocolado a comunicação, se o paciente vier a óbito, à família da causa mortis e dos procedimentos necessários para a liberação do corpo.

Propõe-se, ainda, que a comunicação entre os hospitais públicos ou privados e as famílias dos internados por COVID-19 seja estabelecida, preferencialmente, mediante contato telefônico a fim de que todas as dúvidas sejam sanadas e que pessoas que tenham dificuldade de leitura possam receber a integralidade das informações referentes ao estado de saúde de seus entes queridos.

Destaca-se que proposições dessa natureza foram apresentadas em, pelo menos, outras 3 (três) assembleias legislativas ao longo do Brasil, a saber: PL apresentado pela Deputada Valderez Castelo Branco (Progressistas) na Assembleia Legislativa de Tocantins; PL 88/2020, apresentado pelo Deputado Franzé Silva (PT) no Poder Legislativo estadual do Piauí; e PL 2332/2020, apresentado pela Deputada Estadual Dani Monteiro (PSOL) na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.  

A Constituição Federal de 1988 normatiza, em seu artigo 5º, “aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida”. Este é o direito mais relevante, elementar e fundamental, o qual constitui-se um requisito para o exercício de todos os demais. O direito à vida deve ser entendido na dimensão da dignidade da pessoa humana, ou seja, articula-se diretamente com o direito à alimentação, saúde, educação, cultura e demais componentes essenciais à vida social.

Dentre os direitos sociais elencados no artigo 6º de nossa Carta Magna, destaca-se o direito à saúde no contexto da pandemia do novo coronavírus que atravessa o mundo nesse momento. Sua regulamentação constitucional encontra-se prevista no artigo 196, o qual aduz que “a saúde é direito de todos e dever do Estado”, garantida através de políticas econômicas e sociais a fim de reduzir riscos de doenças e possibilitar o acesso universal a serviços de proteção e recuperação.  

As ações e serviços de saúde possuem relevância pública, visto que é um direito estruturante do direito à vida e do princípio da dignidade da pessoa humana. Por um lado, cabe ao Poder Público dispor sobre sua regulamentação, fiscalização e controle; por outro, é possível que a execução das políticas de saúde seja feita diretamente pelo Estado ou por terceiros – pessoas físicas ou jurídicas.

Do ponto de vista do estado do Ceará, nossa Constituição recepcionou o direito à saúde em seu texto, prevendo, mediante o artigo 245, que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à eliminação de doenças e outros agravos e ao acesso universal e igualitário às suas ações e serviços.” Percebe-se, portanto, o vasto arcabouço constitucional que normatiza e protege a saúde como direito, sendo importante destacar sua característica de universalidade.

Já em relação à legislação federal infraconstitucional, o direito à saúde possui amparo na lei nº 8.080/90, que regulamenta o SUS – Sistema Único de Saúde. O artigo 2º do referido diploma normativo aduz que a saúde é um direito fundamental, atribuindo ao Estado a obrigação de fornecer as condições ao seu pleno exercício. Destacam-se os princípios e diretrizes que fundamentam o SUS, presentes no artigo 7º do referido diploma, a saber: direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde (inciso V), divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde e a sua utilização pelo usuário (inciso VI) e participação da comunidade (VIII).

A lei nº 13.460/17 disciplina os direitos do usuário dos serviços públicos da administração pública, aduzindo, segundo o artigo 5º, XIII, que os agentes públicos devem aplicar soluções tecnológicas a fim de simplificar o atendimento ao usuário e proporcionar melhores condições para o compartilhamento das informações.

Especificamente sobre os usuários da saúde, a portaria nº 1820, de 13 de agosto de 2009, oriunda do Ministério da Saúde, assegura o direito ao recebimento de informações sobre o seu estado de saúde, de maneira clara, objetiva, respeitosa, compreensível quanto a possíveis ou confirmados diagnósticos, exames realizados, riscos e benefícios dos procedimentos; bem como o direito à decisão, pelos pacientes, se seus familiares deverão ser informados sobre seu estado de saúde, mediante previsão no artigo 3º, incisos II e III.

Percebe-se claramente que o direito à informação está presente na regulamentação federal do sistema de saúde no Brasil. Portanto, considerando a peculiaridade da crise sanitária a qual o mundo atravessa, notadamente acerca da importância de estrito cumprimento das medidas de prevenção ao contágio pelo novo coronavírus, faz-se necessário incluir a comunicação entre os estabelecimentos hospitalares e as famílias dos pacientes internados a fim de, em um momento tão difícil, reduzir as apreensões e angústias de parentes e pessoas próximas.

Ressalte-se que o projeto ora abordado prevê a comunicação acerca do quadro clínico do paciente por médicas (os), visto que as informações devem ser completas e prestadas por profissionais que possuam conhecimento técnico. Nesse sentido, o Conselho Federal de Serviço Social emitiu a orientação normativa nº 03/2020, prevendo que não cabe à assistente social realizar a comunicação com as famílias acerca das condições clínicas de saúde, tratamentos propostos, evolução da doença e prognósticos do paciente, mas sim sendo atribuição de profissionais que tenham competência para tal.

No estado do Ceará, o Ministério Público (MPE) emitiu a Recomendação Administrativa nº 0023/2020/137ªPmJFOR no âmbito do Processo Administrativo nº 09.2020.00002377-8. A 137 ª Promotoria de Justiça de Fortaleza, cuja atuação consiste na defesa da saúde pública, recomendou ao Secretário de Saúde do Ceará e à Secretária de Saúde de Fortaleza que as unidades de saúde onde pacientes infectados por COVID-19 sejam internados prestem informações diariamente aos familiares sobre o quadro geral de saúde dos enfermos.

Visto que o projeto de lei apresentado se enquadra no direito à saúde, a competência para legislar é concorrente. O artigo 24 da Constituição Federal, em seu inciso XII, aduz que é competência da União, Estados e Distrito Federal legislar sobre previdência social, proteção e defesa da saúde. Tal previsão encontra amparo em nossa Carta Magna estadual, a qual, mediante regulamentação expressa no artigo 16, XII, indica que é competência do Estado legislar sobre previdência social, proteção e defesa da saúde.

Portanto, o projeto de lei ora protocolado está em perfeita harmonia com os ditames constitucionais e legais no que diz respeito à competência federativa, visto seu conteúdo material e o direito tutelado, notadamente à saúde.

 

 

RENATO ROSENO

DEPUTADO