PROJETO DE INDICAÇÃO N.° 96/20
”DISPÕE SOBRE A CRIAÇÃO DA DELEGACIA ESPECIALIZADA DE COMBATE À INTOLERÂNCIA RELIGIOSA.“
A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ INDICA:
Art. 1º Fica criada, na estrutura organizacional da Superintendência da Polícia Civil, a Delegacia Especializada de Combate à Intolerância Religiosa, com a finalidade de combater todos os crimes praticados contra pessoas, entidades ou patrimônios públicos ou privados cuja motivação seja o preconceito ou a intolerância de natureza religiosa, com jurisdição em todo o estado do Ceará.
Parágrafo Único. Compete à Delegacia Especializada de Combate à Intolerância Religiosa:
I - registrar, investigar, abrir inquérito e adotar todos os demais procedimentos policiais necessários à elucidação dos fatos delituosos, nos casos que envolvam violência, discriminação de natureza religiosa e/ou racismo religioso, inclusive praticados em meio digital, objetivando a efetiva aplicação da legislação;
II – atuar em estreita colaboração e parceria com as demais Delegacias de Polícia do Estado e congêneres de outras unidades da Federação, bem como com órgãos afins;
III – exercer outras atividades próprias de Polícia Judiciária definidas em regulamento.
Art. 2º Os servidores lotados na unidade de que trata o artigo 1º desta Lei deverão participar de ações de capacitação específica promovidas pela Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará em parceria com a Coordenadoria Especial de Políticas Públicas para a Promoção da Igualdade Racial para atendimento de vítimas de racismo religioso e crimes motivados por intolerância, as quais devem contemplar:
I – análise das principais legislações penais referentes ao tema;
II – utilização de métodos de investigação criminal de casos relacionados ao combate do preconceito e da discriminação de natureza religiosa;
III – atuação no ambiente virtual, com enfoque em casos de insultos racistas e religiosos e no cometimento de crimes contra a honra por motivação religiosa nas redes sociais.
Art. 3º As despesas decorrentes desta Lei correrão por conta das dotações orçamentárias próprias da Superintendência da Polícia Civil.
Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
RENATO ROSENO
DEPUTADO
JUSTIFICATIVA
Muitas violências são praticadas em função da cor da pele, tais como a física, psicológica e até mesmo institucional. Infelizmente, o racismo continua a ser uma característica estrutural da sociedade brasileira que se relaciona diretamente com desigualdades de acesso a direitos civis e sociais. Até mesmo na pandemia, é fato público e notório que a taxa de letalidade da COVID-19 é maior entre a população negra do que as pessoas que têm cor de pele branca.
A intolerância religiosa, bem como os crimes praticados associados a ela, é uma forte expressão do racismo existente na sociedade. Desde o século XIX, jornais, boletins policiais e a produção literária da época registravam atos de violência e de perseguição a expressões religiosas majoritariamente praticadas por pessoas negras. Os terreiros de candomblé e de umbanda são alvos constantes de violências e perseguições cujas motivações consistem em preconceito e intolerância de naturezas racista e religiosa.
Dados da revista Carta Capital publicados no fim de 2017 apontam que, em 2016, 776 ocorrências foram registradas no Disque 100, do Governo Federal, denunciando situações de intolerância religiosa no Brasil, aumento de 40% em relação ao ano anterior. Juntos, os adeptos das religiões de matriz africana são alvo de 25% destas violências. Mesmo sendo uma parcela bastante minoritária da população, quem segue estas religiões sofre um percentual expressivo do total de casos de tal natureza.
No dia 27 de dezembro de 2007 foi publicada a lei federal nº 11.635, que institui o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, a ser rememorado anualmente em território nacional no dia 21 de janeiro. Políticas de reconhecimento oficial desta violência cumprem um papel muito importante de visibilização do tema, possibilitando o debate público e a adoção de programas educativos e informativos que previnam o cometimento de crimes cuja motivação seja a intolerância e o racismo religiosos.
A lei federal nº 7.716/89, que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor, apregoa em seu artigo 1º que “serão punidos os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”. Por redação dada pela lei nº 9.459/97, a norma prevê que quem induz ou incita a discriminação ou preconceito motivado por tais dimensões está sujeito à pena de reclusão de dois a cinco anos, além de multa.
No estado do Rio de Janeiro, no dia 13 de dezembro de 2018 foi inaugurada a Delegacia de Combate a Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi), cuja prioridade de atuação foi estabelecida em registrar e investigar casos que tivessem como motivação crimes de ódio e discriminação. Em São Paulo, também há uma delegacia especializada em crimes raciais e de intolerância, criada em 2006 e atuante no combate ao preconceito racial e à discriminação de qualquer natureza. Apenas em 2019, a Decradi/SP registrou mais de 200 boletins de ocorrência.
Diante do exposto, considerando a importância da criação de uma Delegacia Especializada de Combate à Intolerância Religiosa com o fito de investigar e combater os crimes praticados contra pessoas, entidades ou patrimônios públicos ou privados cuja motivação seja o preconceito ou a intolerância de natureza religiosa, solicitamos a análise e aprovação da presente propositura pelos membros desta Casa Legislativa.
RENATO ROSENO
DEPUTADO