PROJETO DE LEI N.º 70/19

 

DISPÕE SOBRE A PROIBIÇÃO DO FUNCIONAMENTO DE CURSOS DE GRADUAÇÃO EM SAÚDE, NA MODALIDADE DE ENSINO À DISTÂNCIA (EAD) NO ESTADO DO CEARÁ.

 

A Assembleia Legislativa do Estado do Ceará decreta:

Art. 1º Fica proibido, no âmbito do Estado do Ceará, o funcionamento dos cursos de graduação, voltados à formação de profissionais da área, na modalidade de ensino à distância (EAD), desde que esta oferta não ultrapasse 20% (vinte por cento) da carga horária total do curso e que estas disciplinas não contemplem as matérias formadoras de competência e habilidades técnicas específicas de cada graduação.

Parágrafo único - As disciplinas que contemplem as matérias formadoras de competências e habilidades técnicas específicas para cada graduação da área de saúde deverão ter 100% (cem por cento) de sua carga horária total presencial.

Art. 2º A fiscalização do disposto no art. 1º é de competência do Conselho Estadual de Educação do Ceará, sem prejuízo de atuação do Ministério Público Estadual, dos Conselhos de Fiscalização Profissional e demais instituições incumbidas para o cumprimento desta Lei.

Art. 3º Esta Lei terá sua aplicação regulamentada pelo Poder Executivo.

Art. 4º Revogam-se as disposições em contrário.

Sala das Sessões da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, aos 26 dias do mês de fevereiro de 2019.

DR.CARLOS FELIPE                                                     AUGUSTA BRITO

DEPUTADO                                                                      DEPUTADA

 

JUSTIFICATIVA

 

O art. 196, da Constituição Federal vigente é expressa ao determinar:

Art. 196 A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário as ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

A justificativa do referido projeto consiste no fato de que a modalidade de ensino à distancia EAD na área da saúde torna-se uma contradição ao disposto no art. 196, da CF/88, uma vez que na medida em que não assegura os quesitos fundamentais para o processo de formação na área da saúde, torna-se um problema que deve ser enfrentado, não só politicamente, mas dentro dos preceitos éticos, pois a vida humana é prioridade e deve estar acima de qualquer outro interesse.

No tocante a matéria tratada pelo legislador e sua constitucionalidade, o art. 24, IX, §3º, da CF/88 prevê:

Art. 24 Compete à União, aos Estado e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

IX – educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação;

§1º no âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.

§2º a competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.

§3º inexistindo lei federal sobre normais gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.

Os Conselhos Regionais e Federais de Farmácia, Biologia, Educação Física, Enfermagem, Fisioterapia e Terapia Ocupacional, Fonoaudiologia, Medicina, Medicina Veterinária, Nutrição, Odontologia, Psicologia, Biomedicina e Serviço Social do Estado do Ceará e Brasil posicionaram-se contrários à autorização de cursos de graduação ministrados na modalidade à distância (EAD).

O ensino na modalidae à distância foi regularizado pela Lei nº 9.394/96 (LDB), que permite a criação. Nos últimos anos, houve incentivo do Ministério da Educação para a abertura de cursos e gradução à distância, com o objetivo de facilitar o acesso ao nível superior de estudantes que vivem em locais distantes dos centros universitários.

Apesar de reconhecer que a modalidade EAD facilita o acesso da população ao ensino supeiror, as profissões da saúde precisam atender diretamente ao paciencia, colocando em risco a saúde da população se esses profissionais não tiverem contato desde a formação.

Para os professores, ensinar à distância exige muita mudanças, uma vez que exige mais tempo e força de trabalho do docente. Pesquisas apontam que cursos à distância aumentam o tempo demandado dos professores em relação a cursos profissionais, pois são necessários envios de e-mails e de feedack aos alunos, com a finalidade de fazer com que os estudantes se sintam menos isados e mais apoiados.

Para o aluno, os problemas podem ser ainda maiores. Isso porque, na educação à distância, o estudante normalmente está isolado. Os fatores motivacionais que surgem no contato e na competição com outros estutantes estão ausentes. O estudante também tem falta de suporte imediato de um professor que está presente e apto a motivá-lo e, se necessário, dar atenção às necessidades e dificuldades que surgem durante o processo de estudo.

Outro proplema é que o ensino à distância não permite acesso direto ao professor. A consequência direta é que, uma vez ausente o contato pessoal do aluno com o instrutor, muitas vezes fica prejudicado o processo de formulação de perguntas após a aula. Apesar de a educação à distância normalmente dar a oportunidade ao aluno de enviar e-mails ao instrutor em qualquer momento, ou por chat online, é normal que a falta de contato humano oferecido em uma sala de aula comprometa a agilidade de comunicação e, assim, o aprendizado.

Ou seja, é inegável que o ensino à distância é mais isolado do que o presencial. Embora o aluno esteja em uma sala de aula virtual, a dinâmica da interação muda com a educação online. Assim, é natural que o aluno de EAD com frequência se sinta afastado ou solitário.

Outro problema do EAD é que nele não há feedback imediato quanto ao aprendizado do aluno. Num ambiente tradicional de sala de aula, a performace de um estudante pode ser avaliada imediatamente através de perguntas ou por meio de testes informais. Com o ensino à distância, como normalmente há defasagens na comunicação, o aluno precisa aguardar até que o instrutor tenha revisto seu trabalho, para que depois receba seu feedback de aprendizagem.

Também por conta desse isolamento, o ensino a distância não fornece ao estudante a oportunidade de trabalhar suas habilidades de comunicação. Estudantes de cursos EAD não têm a prática de interação verbal com professores, outros estudantes e pacientes. Para o caso específico da saúde, a falta de contato com o paciente é também com outros profissionais experientes pode fazer com que a formação do aluno seja gravemente comprometida.

Segundo dados do Censo de Educação Superior de 2007 a 2017 o número de matrículas nos cursos de EAD aumentou 375%. O número é expressivo, uma vez que o aumento nas matrículas dos cursos presenciais foi de apenas 34%. Facilidade de acesso, preços mais acessíveis e menor concorrência para o ingresso explicam tal diferença.

Com expressivo aumento, é natural que surja desconfiança com relação à qualidade dos novos cursos ofertados. É importante que haja credibilidade no sistema de ensino, Se há desconfiança, há tendência à geração de seleção menos criteriosa de estudantes nos cursos menos tradicionais, estabelecidos e, portanto, menos concorridos. Isso porque estudantes de Ensino Médio melhores preparados tendem a ter mais opções de escolha tanto na carreira a seguir, quanto da instituição de ensino superior e no método de ensino que ele usará.

Com desconfiança quanto ao método novo de ensino, potenciais estudantes tendem a migrar para o método mais consolidado e tradicional. Com essas vagas mais tradicionais ocupadas por estudantes de maior habilidade, “sobra” para os alunos com menos habilidade os métodos de maior risco, menos consolidados e também menos tradicionais, tal qual EAD. Isso acaba selecionando adversamente alunos para essa modalidade de ensino, justamente em uma plataforma em que há necessidade maior de disciplina, conforme exposto acima. Para piorar, trata-se justamente da parcela de alunos que tende a ter menor acesso a recursos, seja livro a outros materiais necessários à apredenizagem.

Conforme o art. 174, da CF/88, o Estado exercerá, na forma da lei, como agente normativo e regulador da atividade econômica, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

A formação dos profissionais de saúde está intimamente ligada com a saúde pública, uma vez que muitos desses profissionais estão ou serão empregados no Sistema Único de Saúde. Dessa forma, é fundamental que se edite normas, tais quais o Projeto de Lei, com a finalidade de não apenas limitar o EAD na área da saúde, mas também de sinalizar que o ensino à distância não é uma postura incentivada pelo Estado naquela área, pelos motivos supracitados.

Contudo, há de se considerar que os cursos de graduação na área da saúde exigem um maior contato entre professores e alunos, bem como entre os próprios acadêmicos. Isso porque, a troca de conhecimentos e experiências existente no ensino presencial é primordial para a formação do profissional da área de saúde. Além disso, a formação destes profissionais requer um conteúdo prático, com experiências presenciais contato direto com a atividade que pretendem exercer, como em aulas práticas em laboratórios, participação em amostras científicas, estágios etc.

O Conselho Nacional de Saúde (CNS) já manifestou posicionamento contrário a formação profissional dos cursos na área da saúde na modalidade ensino à distância, desaprovando, inclusive, o Decreto nº 9.057/2017, responsável pela regulamentação do EAD no Brasil.

Tanto é que o Conselho Nacional de Saúde publicou a Resolução nº 515/2017, que resolve:

Art. 1º Posicionar-se contrário à autorização de todo e qualquer curso de graduação na área da saúde, ministrado totalmente na modalidade de Educação à Distância (EAD), pelos prejuízos que tais cursos podem oferecer à qualidade da formação de seus profissionais, bem como pelos riscos que estes profissionais possam causar à sociedade, imediato, a médio e a longo prazos, refletindo uma formação inadequada e sem integração de ensino/serviço/comunidade.

As competênciais e habilidades dos profissionais de saúde, estão diretamente relacionadas com o cuidar do ser humano e consistente na intervenção eficaz mediante ações inter-relacionadas, competências atitudinais, procedimentais conceituais. Tais fatores que não podem ser replicados pelo simples e puro estudo teórico a distância, principalmente quanto à necessidade de estágio supervisionado e práticas laboratoriais.

Sala das Sessões da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, aos 26 dias do mês de fevereiro de 2019.

DR.CARLOS FELIPE                                                     AUGUSTA BRITO

DEPUTADO                                                                      DEPUTADA