PROJETO DE LEI N°540/19
“DISPÕE SOBRE OFERTA DA DISCIPLINA DE LÍNGUA ESPANHOLA NA GRADE CURRICULAR DO ENSINO MÉDIO DA REDE ESTADUAL DE ENSINO.”
A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ DECRETA:
Art. 1º Fica instituída, de forma obrigatória, na grade curricular do Ensino Médio da Rede Estadual de Ensino, a disciplina de Língua Espanhola.
Art. 2º As aulas de Língua Espanhola serão ofertadas no horário regular dos Sistemas de Ensino.
§1º A oferta da disciplina deverá ser dirigida às três séries do Ensino Médio.
§ 2º A disciplina de Língua Espanhola deverá ter carga horária mínima de 2h/a (duas horas aula) semanais em cada ano do Ensino Médio.
§ 3º O processo de ensino-aprendizagem far-se-á seguindo orientações metodológicas expressas na Base Nacional Comum Curricular.
Art. 3º Os profissionais que poderão lecionar esta disciplina deverão ser formados em Licenciatura Plena em Letras-Espanhol ou em Licenciatura Plena em Letras com dupla habilitação em Espanhol-Português.
Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
QUEIROZ FILHO
DEPUTADO
JUSTIFICATIVA
As línguas são consideradas instrumentos de comunicação e sinais de identidade individual e coletiva, e como tal, contam histórias. Assim, a língua espanhola narra a história de centenas de milhões de pessoas em dezenas de países, constituindo-se em um dos grandes eixos de identidade linguística e cultural que estruturam o mundo: em um contexto mundial, mais de 577 milhões de pessoas falam espanhol, dos quais 480 milhões o têm como língua materna; 7,6% da população mundial é hispano-falante; o espanhol é a segunda língua materna do mundo por número de falantes, atrás apenas do mandarim; a terceira língua mais utilizada na internet e o idioma estrangeiro mais estudado nos Estados Unidos. Isso sem contar com o valor econômico do idioma, quando se considera o mercado editorial, a produção cinematográfica e as artes em geral. O Espanhol está geograficamente ramificado em vários continentes; é a língua de nossos vizinhos latino-americanos e, por essa razão, um dos idiomas oficiais do MERCOSUL. Esses são alguns dados que revelam os sinais de identidade individual e coletiva desse idioma, sua projeção internacional e sua importância no cenário mundial.
No Brasil, a língua espanhola é de suma importância, já que somos o único país da América do Sul que não fala espanhol. Seu estudo abre perspectivas para outras fronteiras no mercado continental, fortalecendo, além das questões econômicas, as relações culturais do Brasil com nossos vizinhos, sendo de grande importância para a integração dos povos da América Latina, preceito que consta no parágrafo único dos Princípios fundamentais, artigo 4º de nossa Constituição: "A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações".
No entanto, a atual visão de educação no Brasil provocou um imenso retrocesso linguístico e cultural no processo educacional brasileiro, com a publicação da Lei Federal 13.451, de 2017, conhecida como a Reforma do Ensino Médio. Essa reforma eliminou a obrigatoriedade da oferta do espanhol nas escolas públicas brasileiras e passou a promover a obrigatoriedade da oferta de uma única língua estrangeira, o inglês: “Os currículos do ensino médio incluirão, obrigatoriamente, o estudo da língua inglesa e poderão ofertar outras línguas estrangeira, em caráter optativo, preferencialmente o espanhol, de acordo com a disponibilidade de oferta, locais e horários definidos pelos sistemas de ensino”.
Essa visão linguística hegemônica se contrapõe a uma visão atual de sociedade, na qual a escola é um lugar em que se formam mentes, personalidades e cidadãos que possam entender e modificar o mundo que os rodeia. Garantir a oferta de ensino de línguas estrangeiras revela conhecimento de uma realidade linguística plural e, ainda, propicia vantagem sociocultural para aqueles aos quais a aprendizagem de tais línguas é garantida, já que o mundo do trabalho - associado às facilidades de comunicação e locomoção internacionais - vai sempre beneficiar aqueles alunos com melhor acesso ao ensino qualificado, o que certamente inclui o conhecimento da maior diversidade possível de línguas. Profissionais que dominam outros idiomas, certamente, têm mais oportunidades no mercado de trabalho. Nesse contexto, a escola desempenha um papel importantíssimo ao propiciar a crianças, adolescentes e jovens o contato com várias línguas estrangeiras.
Além disso, a proposta de ofertar o acesso, na escola, ao conhecimento de uma única língua estrangeira, o inglês, contrapõe-se aos acordos multilaterais estabelecidos no âmbito do Mercosul, do qual o Brasil faz parte como membro fundador, dentre os quais está o compromisso de difusão do ensino de espanhol e português como línguas estrangeiras nos estados-membro, conforme o Protocolo de Intenções datado da fundação do bloco, em 1991, e uma série de outros acordos ulteriores relativos à integração acadêmica e linguística dos países do bloco, orientados para o mesmo fim. Enquanto vários países do mundo promovem o acesso a diferentes línguas estrangeiras, desde os primeiros anos escolares, no Brasil, a atual LDB e a Lei Federal 13.451, de 2017, trouxeram inúmeras consequências negativas ao nosso sistema educacional, ao possibilitar o contato do aluno com apenas uma língua estrangeira.
Nesse contexto global, cabe destacar que alguns dos países mais desenvolvidos do mundo, como Estados Unidos, Canadá, Finlândia e França, entre outros, proporcionam oferta de espanhol em suas redes de ensino, pois compreendem suas fronteiras e os espaços de seu trânsito econômico. Na China, o governo descobriu o potencial econômico que tem a língua espanhola e a consideram um objetivo estratégico, por isso tornaram-na disciplina obrigatória em todas as escolas, juntamente com o inglês. Nesse mesmo sentido, na França, em 2017, abriram-se mais de mil vagas para professores de espanhol. Além disso, é notório o fato de que mesmo nos Estados Unidos é possível transitar, em boa parte de seu território, sem a necessidade do conhecimento do inglês, já que o espanhol é língua de circulação corrente no país por conta da crescente imigração e da fronteira com o México, constituindo-se como a língua estrangeira mais falada em seu território.
Sensível a esse cenário de projeção internacional da língua espanhola, a Universidade Federal do Ceará, criou ainda em 1994, o curso de licenciatura em língua espanhola e, desde então, vem investindo na formação inicial de professores de espanhol, com a criação de dois novos cursos: em 2008, o curso de licenciatura em espanhol à distância, ofertado em dez municípios do interior do Estado; e em 2010, o curso de licenciatura única no período noturno, em Fortaleza, passando a ser a universidade do norte e nordeste com a maior oferta de cursos de formação inicial de professores de espanhol e com o maior quadro de docentes na área. Dessa forma, a UFC aposta na formação de qualidade de professores de espanhol, por entender que aprendizagem da língua espanhola constitui um elemento importante para a política econômica do Estado e seu crescimento. Além da UFC, a Universidade Estadual do Ceará, também contribui com essa formação.
Ainda no que se refere ao contexto local, um Estado com uma exponencial capacidade turística como o Ceará e que, segundo dados da Secretaria de Turismo do Estado, é a terceira porta de entrada de turistas europeus no Brasil, crescendo mais que a média nacional, e com o maior índice de volume das atividades turísticas do Brasil, não pode e não deve prescindir de uma oferta plurilíngue em seu sistema de ensino. Desse modo, a oferta da disciplina de língua espanhola no currículo das escolas cearenses é fundamental para o desenvolvimento das competências específicas de caráter holístico, criativo e inovador que incluem, entre elas, as competências comunicativas multilíngues e as de caráter intercultural, já que uma das principais características de uma língua é sua capacidade de gerar e transmitir cultura, e que no caso da hispânica está, a partir de sua própria natureza, aberta à interculturalidade.
QUEIROZ FILHO
DEPUTADO