PROJETO DE LEI N° 515/19

“ALTERA A LEI Nº 16.197, DE 17 DE JANEIRO DE 2017, QUE DISPÕE SOBRE A INSTITUIÇÃO DO SISTEMA DE COTAS NAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR DO ESTADO DO CEARÁ.”

 

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ DECRETA:

Art. 1º O Artigo 1º da Lei nº 16.197, de 17 de janeiro de 2017, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 1º Fica instituído, por 10 (dez) anos, o sistema de cotas para ingresso nas universidades e demais instituições de ensino superior estaduais, visando beneficiar estudantes carentes que comprovem ter cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas situadas no Estado do Ceará, assim como de estudantes comprovadamente com necessidades especiais, nos termos legais.”

Art. 2º O Artigo 2º da Lei nº 16.197, de 17 de janeiro de 2017, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 2º As instituições públicas de Educação Superior do Estado do Ceará reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para os alunos que comprovem ter cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.”

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

 

RENATO ROSENO

DEPUTADO

 

JUSTIFICATIVA

A presente proposta visa aprimorar, atualizar e aproximar a lei nº 16.197/17, que dispõe sobre a instituição do sistema de cotas nas instituições de ensino superior do estado do Ceará, da legislação federal que regulamenta o tema – lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012.

A lei federal que instituiu o sistema de cotas foi fundamental para que o Brasil pudesse avançar no sentido das políticas públicas reparatórias de desigualdades históricas que marcam a história da formação da sociedade brasileira. A referida lei instituiu que 50% das vagas em universidades e institutos federais de ensino seriam destinados a estudantes oriundos de escolas públicas, consistindo metade dessa quantidade direcionada a alunos com renda inferior a 1,5 salários mínimos per capita e a outra metade direcionada a pretos, pardos e indígenas na forma da proporção populacional do respectivo estado a ser apurada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

Preliminarmente, cumpre salientar que o projeto de lei que ora apresentamos não implica em aumento de despesas para o Poder Executivo tampouco altera competências e a estrutura organizacional da Administração Direta e Indireta. O projeto, portanto, está em plena sintonia com os ditames constitucionais do artigo 60 da Constituição do Estado do Ceará, tendo em vista que o assunto não avança sobre a competência de iniciativa privativa do Poder Executivo.

A primeira universidade a adotar a política de cotas no Brasil foi a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) em 2003. Na ocasião, do total de vagas disponíveis, 20% foram destinadas para estudantes egressos de escolas públicas; 20% para pessoas negras; e 5% para pessoas com deficiências físicas. Durante os anos de 2005 e 2006, a própria Universidade realizou pesquisas sobre o desempenho dos estudantes cotistas e não-cotistas nos cursos de Administração, Direito, Engenharia Química, Medicina, Odontologia e Pedagogia comparando-os, chegando à conclusão de que os rendimentos foram bastante semelhantes (UERJ, 2005).

Outros estudos com finalidades semelhantes foram realizados pela Universidade de Brasília (UnB) e pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Em 2013, a UnB lançou um relatório que avalia os 10 anos de instituição do sistema de cotas, chegando à conclusão de que o desempenho dos estudantes formados, em todas as áreas do conhecimento, não variou muito entre cotistas e não-cotistas. Resultado semelhante foi obtido mediante estudo da UFES, o qual expressou que o desempenho acadêmico de alunos cotistas do Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas e do Centro Tecnológico, matriculados no período compreendido entre 2008 e 2013, em 05 dos 15 cursos analisados foi superior dos estudantes cotistas, enquanto apenas 03 cursos apresentaram uma situação de desempenho superior dos estudantes não-cotistas em mais de 01 ponto.

Do ponto de vista dos impactos positivos da aprovação do sistema de cotas para ingresso nas instituições federais de ensino, a chance de se obter um diploma de graduação aumentou quatro vezes nos últimos anos no Brasil. O percentual de pretos e pardos que concluíram a graduação aumentou 2,2%, em 2000, para 9,3% em 2017. Percebe-se, portanto, que efetivamente a adoção das cotas contribui para a redução de desigualdades socioeconômicas e raciais em nosso país, restando ainda um desafio muito grande de garantir a isonomia e a igualdade de oportunidades. A proporção da população branca que concluiu a graduação é de 22%, mais do que o dobro do índice atingido pela população negra e parda.

O Estado do Ceará adotou em 2017 mediante lei de autoria do deputado José Ailton Brasil o sistema de cotas para ingresso nas instituições estaduais de ensino superior (UECA, URCA e UVA) – lei nº 16.197, de 17 de janeiro de 2017. A lei foi promulgada contendo uma redação bastante similar à lei federal, preservando os critérios étnico-raciais através do censo do IBGE. No que diz respeito à previsão legal de cotas para estudantes oriundos de escolas públicas, a lei estadual circunscreveu às unidades de educação básica administradas pelas Prefeituras e pelo Estado do Ceará, como pode-se apreender da leitura da redação do artigo 1º:

Art. 1º Fica instituído, por 10 (dez) anos, o sistema de cotas para ingresso nas universidades e demais instituições de ensino superior estaduais, visando beneficiar estudantes carentes que comprovem ter cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas municipais ou estaduais, situadas no Estado do Ceará, assim como de estudantes comprovadamente com necessidades especiais, nos termos legais. (grifo nosso)

A alteração legislativa que ora propomos no referido diploma legal busca incluir os estudantes egressos de escolas públicas federais como detentores do direito de ingressar nas universidades estaduais, equiparando-os aos estudantes egressos de escolas públicas estaduais e municipais. O projeto que propomos, portanto, replica o comando legal da norma federal que institui o sistema de cotas, senão vejamos:

Art. 1º As instituições federais de educação superior vinculadas ao Ministério da Educação reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas. (grifo nosso)

Das 20 melhores escolas do Ceará da rede pública, sob a ótica da nota média no ENEM de 2018 de seus estudantes, apenas 02 são administradas pela União, qual seja: Colégio Militar de Fortaleza (1º lugar) e Instituto Federal do Ceará – campus Juazeiro do Norte (5º lugar). As outras 18 escolas que estão no ranking são pertencentes à rede estadual de educação básica, distribuídas em mais de 15 cidades no estado. A partir dos dados levantados, é possível apreender que não há distinções relevantes entre a qualidade do ensino ofertado pelas escolas federais e as estaduais que justifique a exclusão dos alunos egressos das escolas administradas pela União do sistema de cotas instituído pela lei estadual nº 16.197/17.

Estudo realizado pela Câmara dos Deputados em 2019 atestam que os investimentos públicos federais em educação básica nos últimos 04 anos reduziram 19%. Entre 2014 e 2018, o valor diminuiu de R$36,2 bilhões para R$29,3 bilhões. O levantamento foi feito pelo Sistema Integrado de Administração Financeiro do Governo Federal (SIAFI) com base nas despesas primárias pagas no exercício, inclusive restos a pagar. Os valores também foram corrigidos pelo IPCA – Instituto Nacional de Preços ao Consumidor Amplo.

A Emenda Constitucional nº 95/2016 instituiu o Novo Regime Fiscal no Brasil, disciplinando que as despesas primárias para o exercício financeiro de um ano estão limitadas ao valor do limite correspondente ao exercício financeiro do ano imediatamente anterior, corrigido pela variação do IPCA, publicado pelo IBGE, ou de outro índice que vier a substituí-lo. Em outras palavras, durante 10 anos (prorrogáveis por mais 10) a partir de 2017, não haverá aumento real no orçamento da educação a nível federal.

É possível concluir, portanto, que o Estado do Ceará deve políticas públicas afirmativas no sentido de inclusão dos estudantes egressos das escolas públicas federais às universidades localizadas em nosso estado, tendo em vista a queda de investimento federal nos últimos anos e a projeção negativa para os vindouros, razão pela qual apresentamos o projeto de modificação legislativa à lei estadual de cotas.

Ressalte-se que a proposta apresentada obedece aos ditames legais no que diz respeito à constitucionalidade da iniciativa e do mérito, tendo em vista que se adequa aos preceitos do artigo 60 da Constituição do Estado do Ceará. O referido projeto não implica em aumento de despesas (§1º) tampouco cria cargos ou altera a estrutura organizacional da Administração Pública (§2º), cabendo a iniciativa da proposição ser do Poder Legislativo.

Certo que a Assembleia Legislativa do Ceará continuará a envidar esforços institucionais na defesa do direito à educação, como o fez ao se pronunciar contra o corte linear de 30% do orçamento nas universidades e institutos federais e ao se manifestar em defesa da prorrogação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação Básica (FUNDEB), solicitamos aos Pares aprovação da referida matéria a fim de fortalecermos os mecanismos legais de acesso à educação superior.

 

RENATO ROSENO

DEPUTADO