PROJETO DE LEI N.º 297/19
INSTITUI A POLÍTICA ESTADUAL DE PREVENÇÃO DA AUTOMUTILAÇÃO E DO SUICÍDIO, A SER IMPLEMENTADA PELO ESTADO DO CEARÁ, EM COOPERAÇÃO COM OS MUNICÍPIOS.
A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ
D E C R E T A:
Art. 1.º Esta Lei institui a Política Estadual de Prevenção da Automutilação e do Suicídio, a ser implementada pelo Estado do Ceará e seus Municípios.
Art. 2.º Fica instituída a Política Estadual de Prevenção da Automutilação e do Suicídio, como estratégia permanente do poder público para a prevenção desses eventos e para o tratamento dos condicionantes a eles associados.
Parágrafo único. A Política Estadual de Prevenção da Automutilação e do Suicídio será implementada pelo Estado do Ceará em cooperação com os Municípios, e com a participação da sociedade civil e de instituições privadas.
Art. 3.º São objetivos da Política Estadual de Prevenção da Automutilação e do Suicídio:
I – promover a saúde mental;
II – prevenir a violência autoprovocada;
III – controlar os fatores determinantes e condicionantes da saúde mental;
IV – garantir o acesso à atenção psicossocial das pessoas em sofrimento psíquico agudo ou crônico, especialmente daquelas com histórico de ideação suicida, automutilações e tentativa de suicídio;
V – abordar adequadamente os familiares e as pessoas próximas das vítimas de suicídio e garantir-lhes assistência psicossocial;
VI – informar e sensibilizar a sociedade sobre a importância e a relevância das lesões autoprovocadas como problemas de saúde pública passíveis de prevenção;
VII – promover a articulação intersetorial para a prevenção do suicídio, envolvendo entidades de saúde, educação, comunicação, imprensa, polícia, entre outras;
VIII – promover a notificação de eventos, o desenvolvimento e o aprimoramento de métodos de coleta e análise de dados sobre automutilações, tentativas de suicídio e suicídios consumados, envolvendo o Estado do Ceará e seus Municípios e os estabelecimentos de saúde e de medicina legal, para subsidiar a formulação de políticas e tomadas de decisão; e
IX – promover a educação permanente de gestores e de profissionais de saúde em todos os níveis de atenção quanto ao sofrimento psíquico e às lesões autoprovocadas.
Art. 4.º O poder público manterá serviço telefônico para recebimento de ligações, destinado ao atendimento gratuito e sigiloso de pessoas em sofrimento psíquico.
§ 1.º Deverão ser adotadas outras formas de comunicação, além da prevista no caput deste artigo, que facilitem o contato, observados os meios mais utilizados pela população.
§ 2.º Os atendentes do serviço previsto no caput deste artigo deverão ter qualificação adequada, na forma de regulamento.
§ 3.º O serviço previsto no caput deste artigo deverá ter ampla divulgação em estabelecimentos com alto fluxo de pessoas, assim como por meio de campanhas publicitárias.
Art. 5.º O poder público poderá celebrar parcerias com empresas provedoras de conteúdo digital, mecanismos de pesquisa da internet, gerenciadores de mídias sociais, entre outros, para a divulgação dos serviços de atendimento a pessoas em sofrimento psíquico.
Art. 6.º Os casos suspeitos ou confirmados de violência autoprovocada são de notificação compulsória pelos:
I – estabelecimentos de saúde públicos e privados às autoridades sanitárias; e
II – estabelecimentos de ensino públicos e privados ao conselho tutelar.
§ 1.º Para os efeitos desta Lei, entende-se por violência autoprovocada:
I – o suicídio consumado;
II – a tentativa de suicídio; e
III – o ato de automutilação, com ou sem ideação suicida.
§ 2.º Nos casos que envolverem criança ou adolescente, o conselho tutelar deverá receber a notificação de que trata o inciso I do caput deste artigo, nos termos de regulamento.
§ 3.º A notificação compulsória prevista no caput deste artigo tem caráter sigiloso, e as autoridades que a tenham recebido ficam obrigadas a manter o sigilo.
§ 4.º Os estabelecimentos de saúde públicos e privados previstos no inciso I do caput deste artigo deverão informar e treinar os profissionais que atendem pacientes em seu recinto quanto aos procedimentos de notificação estabelecidos nesta Lei.
§ 5.º Os estabelecimentos de ensino públicos e privados de que trata o inciso II do caput deste artigo deverão informar e treinar os profissionais que trabalham em seu recinto quanto aos procedimentos de notificação estabelecidos nesta Lei.
§ 6.º Regulamento disciplinará a forma de comunicação entre o conselho tutelar e a autoridade sanitária, de forma a integrar suas ações nessa área.
Art. 7.º Nos casos que envolverem investigação de suspeita de suicídio, a autoridade competente deverá comunicar à autoridade sanitária a conclusão do inquérito policial que apurou as circunstâncias da morte.
Art. 8.º Aplica-se, no que couber, à notificação compulsória prevista nesta Lei, o disposto na Lei federal n.º 6.259, de 30 de outubro de 1975.
Art. 9.º Esta Lei entra em vigor após decorridos 90 (noventa) dias de sua publicação oficial.
PATRÍCIA AGUIAR
DEPUTADA
JUSTIFICATIVA
O Suicídio é a terceira maior causa de mortes entres adolescentes, e o número de casos vem crescendo nos últimos anos. A estratégia de se evitar falar sobre esse assunto não tem se mostrado eficaz, e a sociedade demanda uma atuação do poder público nessa área. A automutilação , por outro lado, é uma outra forma de lesão autoprovocada, não necessariamente uma tentativa de suicídio, porém um sinal de que há algum problema sério, que precisa ser abordado.
A importância deste tema pode ser evidenciado pela ampla exposição que tem tido na imprensa. Desde 2016, já houve várias matérias nos canais brasileiros de maior audiência na televisão. Na TV Brasil, por exemplo, a reportagem “cicatrizes da tristeza” abordou a automutilação. Segundo o Dr. André Mattos, entrevistado, a”a autolesão mostra claramente que a pessoa está num quadro muito frágil e um sofrimento psíquico muito intenso”. As principais queixas das crianças eram bullying, problemas familiares, tristeza profunda e solidão.
A revista Isto É publicou matéria “uma opressão maior que a vida”, na qual mostra o aumento de até 65% na taxa de suicídio entre crianças e adolescentes nos últimos quinze anos.
O tema da violência autoprovocada tem direta relação com a área da saúde, pois o sofrimento psíquico é muito comum, tem repercussões clínicas e compromete a vida social. Entretanto, em geral, as pessoas têm dificuldades em discutir a saúde mental, por modo de serem estigmatizados como desequilibrado, doentes mentais ou pessoas que reclamam sem razão.
Um problema freqüente é a dificuldade de acesso ao tratamento adequado. Esses pacientes são atendidos, muitas vezes, por profissionais não especialistas, sem preparo para o atendimento específico desses casos, e muitas vezes com preconceitos próprios, que refletem na prática clínica. Quando chegam em serviços especializados, o ambiente costuma ser hostil, onde são atendidas pessoas com os mais diversos diagnósticos psiquiátricos, que acabem recebendo atenção prioritária.
A automutilação tomou grande repercussão durante o fenômeno chamado “baleia azul”, no qual crianças e adolescentes participavam de desafios progressivamente mais violentos com o próprio corpo, estimulados por experiências online. Em alguns casos o objetivo era levar jovens a autolesão ou mesmo ao suicídio.
As tentativas e consumações de suicídios têm tomado proporções de praticamente uma epidemia entre a população jovem mundial. O crescimento da taxa de suicídio entre adolescentes e adultos jovens tem sido observado nas duas últimas décadas, e o desafio é encontrar medidas que possam prevenir este ato. Uma das medidas preventivas mais eficazes é a detecção precoce de sinais de risco, como os sintomas depressivos, as autoagressões e as tentativas de suicídio.
No último dia 26 de abril foi sancionada a lei 13.819, que instituiu o plano nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio, na qual nos baseamos para apresentar seu homônimo estadual para somarmos esforços no combate a esta epidemia que cresce de maneira anônima, pois não gostamos de falar sobre o assunto.
Por esta razão solicito a adesão das companheiras e companheiras para que possamos aprovar este projeto de lei.
PATRÍCIA AGUIAR
DEPUTADA