PROJETO DE INDICAÇÃO N° 370/19
DISPÕE SOBRE A PROIBIÇÃO DE EXERCÍCIO DE CARGO, EMPREGO OU FUNÇÃO PÚBLICA POR PESSOA CONDENADA POR VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER.
A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE CEARÁ APROVA:
Art. 1º - Fica vedado o exercício de cargo, emprego ou função pública na administração direta, autárquica e fundacional do Estado do Ceará, bem como a prestação de serviços ou participação em licitação estadual, de pessoa condenada com transito em julgado por violência doméstica e familiar contra a mulher.
Art. 2º - Para efeitos desta lei, entende-se como violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que cause violência física, violência psicológica, sexual, patrimonial e/ou moral.
Parágrafo único. São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.
Art. 3º - O disposto nesta lei não se aplicará, caso a sentença condenatória venha a ser reformada pelas instâncias superiores do Judiciário.
Art. 4º - Esta Lei será regulamentada em um prazo de 120 (cento e vinte) dias, contados da data de sua publicação.
Art. 5º - O Poder Executivo regulamentará está Lei.
Art. 6º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
NEZINHO FARIAS
DEPUTADO
JUSTIFICATIVA:
A proposição tem como escopo fortalecer a luta contra a violência doméstica e familiar, crime que atinge milhares de mulheres em nosso País. De acordo com o “Mapa da Violência 2012: Homicídios de Mulheres no Brasil” (Cebela/Flacso, 2012), duas em cada três pessoas atendidas no Sistema Único de Saúde (SUS) em razão de violência doméstica ou sexual são mulheres; e em 51,6% dos atendimentos foi registrada reincidência no exercício da violência contra a mulher. O SUS atendeu mais de 70 mil mulheres vítimas de violência em 2011 – 71,8% dos casos ocorreram no ambiente doméstico.
A pesquisa “Violência e Assassinatos de Mulheres” (Data Popular/Instituto Patrícia Galvão, 2013) detectou que 54% dos brasileiros conhecem alguma mulher que já foi agredida pelo parceiro. E 56% dos entrevistados conhecem algum homem que agrediu sua parceira.
Desde a instalação, em 2007, o Juizado de Violência Doméstica contra a Mulher de Fortaleza já concedeu 45.945 medidas protetivas. O número é referente até julho de 2018. Só no ano passado, foram 6.454 medidas concedidas. Apesar do avanço na legislação, os números de casos de violência contra a mulher ainda assustam. No ano passado, o Brasil registrou 221.238 casos de violência doméstica. Só no estado do Ceará foram 5.644 vítimas, segundo dados do 12º Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
A violência doméstica, como se pode notar, é um problema que atinge mulheres em todo o território nacional, independentemente da faixa etária, escolaridade ou poder aquisitivo. Vários fatores ajudam a explicar a prevalência desse crime em nossa sociedade, que vão desde aspectos culturais de uma nação edificada sob a égide do patriarcalismo, até questões jurídico-institucionais, dentre as quais se destaca a impunidade dos agressores.
O que se busca com esta proposta, portanto, é tanto atuar no sentido pedagógico-cultural quanto atacar as bases da impunidade. De um lado, procura-se fazer com que o Estado dê o bom exemplo à sociedade, impedindo que homens condenados por violência doméstica e familiar exerçam cargos cujas atividades têm impacto direto nas vidas de milhões de pessoas. Permitir que um agressor condenado exerça função de enorme prestígio e responsabilidade equivale a dizer à população que o crime compensa. Na iniciativa privada, são notórios os casos de empresas que têm desligado de seus quadros funcionais empregados envolvidos em violência contra a mulher. Mesmo executivos e gestores renomados, com larga experiência, não estão sendo poupados de tais punições, uma vez que, cada vez mais, nossa sociedade clama por um basta à violência contra a mulher. Nesse sentido, perguntamo-nos: como é possível que o poder público, que é mantido com dinheiro dos impostos pagos por toda a população (inclusive das mulheres que são agredidas por companheiros violentos), possa prestar acolhimento a agressores condenados?
Alguém poderá argumentar que, ao delimitar a aplicação da lei a partir do momento em que o indicado à função pública seja condenado em segunda instância, este projeto esteja, de alguma forma, ferindo a presunção de inocência e o direito à ampla defesa dos acusados por esses crimes. Contudo, devemos sempre lembrar que atualmente está em vigor um entendimento constitucional do Supremo Tribunal Federal (STF), que prevê a execução da pena a partir da sentença condenatória em segunda instância. Dessa forma, fica claro que se o entendimento do STF vale para mandar para a cadeia condenados por crimes de diversas naturezas, necessariamente precisa valer também para aplicação de uma lei estadual, que visa moralizar a administração pública do Estado do Ceará, extirpando de seu meio os agressores de mulheres.
Vale salientar, que o artigo 60, §2º, alínea “b”, nos remete a tal dispositivo:
“Art. 60. Cabe a iniciativa de leis:
(...)
§2º São de iniciativa privativa do Governador do Estado às leis que disponham sobre:
(...)
b) servidores públicos da administração direta, autárquica e fundacional, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis e militares, seu regime jurídico, ingresso, limites de idade, estabilidade, direitos e deveres, reforma e transferência de policiais militares e de bombeiros militares para a inatividade;” (grifo nosso)
Diante da relevância da matéria, submeto o presente à apreciação de meus nobres pares, contado com o apoio necessário para sua aprovação.
NEZINHO FARIAS
DEPUTADO