PROJETO DE INDICAÇÃO N° 318/19

“TORNA OBRIGATÓRIA A CAPACITAÇÃO EM NOÇÕES BÁSICAS DE PRIMEIROS SOCORROS DE PROFESSORES, SERVIDORES E FUNCIONÁRIOS DE ESTABELECIMENTOS DE ENSINO PÚBLICOS E PRIVADOS DE EDUCAÇÃO BÁSICA E DE ESTABELECIMENTOS DE RECREAÇÃO INFANTIL INSTALADOS NO ESTADO DO CEARÁ E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.”

 

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ INDICA:

Art. 1º Os estabelecimentos de ensino de educação básica da rede pública estadual, por meio dos respectivos sistemas de ensino, e os estabelecimentos de ensino de educação básica e de recreação infantil da rede privada, deverão capacitar professores, servidores e funcionários em noções básicas de primeiros socorros.

§ 1º O curso deverá ser ofertado anualmente, em virtude das atualizações de protocolo sobre o atendimento na modalidade de primeiros socorros e destinar-se-á à capacitação e/ou à reciclagem de parte dos professores, servidores e funcionários dos estabelecimentos de ensino e recreação a que se refere o caput deste artigo, sem prejuízo de suas atividades ordinárias.

§ 2º A quantidade de profissionais capacitados em cada estabelecimento de ensino ou de recreação deve ter uma parcela mínima de 50% (cinquenta por cento) de seus profissionais devidamente capacitados.

Art. 2º Os cursos de capacitação em primeiros socorros serão ministrados por entidades municipais, estaduais ou federais, especializadas em práticas de auxílio imediato e emergencial à população e/ou por profissionais devidamente habilitados, desde que, previamente cadastrados pela Cruz Vermelha Brasileira e autorizados pelo Corpo de Bombeiros Militar (CBM-CE) e Secretaria de Educação do Estado do Ceará, tendo como objetivo:

I – identificar e agir preventivamente em situações de emergências e urgências médicas;

II - intervir no socorro imediato do(s) acidentado(s) até que o suporte médico especializado, local ou remoto, torne-se possível.

§ 1º O conteúdo dos cursos de primeiros socorros básicos ministrados, deverão ser condizentes com a natureza e faixa etária do público atendido pelos estabelecimentos de ensino ou recreação.

§ 2º As unidades de ensino e/ou recreação da rede pública e particular deverão disponibilizar kits de primeiros socorros, conforme orientação das entidades especializadas em atendimento emergencial à população.

Art. 3º Os estabelecimentos de ensino são obrigados a afixar, em local visível, a certificação que comprove a realização da capacitação de que trata a presente Lei, fazendo constar os nomes dos profissionais devidamente capacitados.

Art. 4º O não cumprimento dos dispositivos desta Lei, implicará às instituições de ensino inadimplentes:

I – advertência;

II – multa de 800 (oitocentas) UFIRCEs, que deverá ser aplicada em dobro em caso de reincidência;

III – cassação de alvará de funcionamento e/ou da autorização concedida pelo órgão de educação pertinente, quando tratar-se de creche ou estabelecimento particular de ensino ou recreação, e responsabilização funcional e/ou patrimonial, quando tratar-se de creche ou estabelecimento público.

Art. 5º Ficarão responsáveis pela fiscalização da efetiva execução da presente Lei, as Secretarias de Educação do Estado do Ceará em conjunto com a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Estado do Ceará, podendo a Cruz Vermelha Brasileira auxiliar na presente fiscalização.

Art. 6º Os estabelecimentos de ensino de que trata esta Lei, deverão estar interligados à rede de atenção de urgência e emergência de cada mesorregião correspondente no Estado do Ceará e estabelecer fluxo de encaminhamento para uma unidade de saúde de referência.

Art. 7º Cabe ao Poder Executivo definir no prazo de 120 (cento e vinte) dias, a partir da data de publicação da presente lei, os critérios para implementação dos cursos de primeiros socorros.

Art. 8º As despesas para execução desta Lei correrão por conta de dotações orçamentárias próprias, incluídas pelo Poder Executivo nas propostas orçamentárias anuais e em seu Plano Plurianual.

Art. 9º Esta Lei entrará em vigor após decorridos 180 (cento e oitenta) dias de sua publicação oficial.

 

LEONARDO PINHEIRO

DEPUTADO

 

JUSTIFICATIVA

Todo estabelecimento de ensino ou recreação que reúna crianças e/ou adolescentes, seja ele público ou privado, deve ter por objetivo garantir não somente a aplicação de uma formação educacional de qualidade, quanto proporcionar a manutenção da integridade física e psíquica de seus tutelados e alunos.

Estatísticas recentes mostram que acidentes com crianças e adolescentes, tidos equivocadamente como de baixa periculosidade, têm levado muitos jovens a enfrentar sequelas fisiológicas e anatômicas irremediáveis ou ainda, vir a sofrer o malogrado óbito.

Profissionais de saúde afirmam que, um número expressivo desses acidentes pode ser administrado - tendo suas consequências atenuadas ou até anuladas se, diante da verificação do acidente, ocorrer uma imediata prestação de auxílio básico ao jovem ou criança por parte de um adulto previamente treinado em procedimentos básicos de primeiros socorros.

Sinistros com crianças e jovens tais como engasgamentos, quedas, eventos convulsivos, paradas cardíacas ou respiratórias, afogamento, cortes, queimaduras e exposição a descargas elétricas não são infrequentes. Estes podem ser administrados de forma eficiente se atendidos imediatamente por adultos minimamente treinados no recinto - quer sejam eles professores, cuidadores, servidores ou funcionários do estabelecimento de ensino ou recreação.

São hoje consagradas algumas técnicas de atenção imediata que, quando conhecidas e aplicadas, podem efetivamente ser a diferença entre a vida e a morte de um jovem ou criança acidentado.

Dessa forma, capacitar responsavelmente a população leiga, e mais ainda, aquela que está diretamente envolvida por força de seu trabalho, na atenção a crianças e adolescentes, é uma necessidade urgente.

Perceba-se que, não se trata aqui, de transferir ao profissional de ensino ou recreação a responsabilidade de exercer o papel de um profissional de saúde com larga formação técnica. O que se pretende de fato é não permitir que se instale, por pura negligência ou descuido, um quadro severo ou letal fruto de acidente pelo simples desconhecimento de simples técnicas de ação imediata que podem tornar-se a diferença entre a vida e a morte de um vulnerável.

Até que o socorro especializado prestado por um médico, enfermeiro, bombeiro ou policial, torne-se possível, algumas técnicas simples podem auxiliar na sobrevida de um jovem acidentado. Exemplo claro de como um evento corriqueiro pode causar uma perda irreparável por pura falta de atenção imediata e de baixa complexidade de um adulto treinado é o caso do menino Lucas Begalli Zamora.

Em 27 de novembro de 2017, em município do Estado de São Paulo, Lucas, uma criança de 10 anos, engasgou-se com um pedaço de salsicha oriunda de lanche fornecido durante um passeio escolar. Não havendo à sua volta qualquer adulto capaz de aplicar a manobra Heimlich (também conhecida como manobra ou abraço do desengasgo), instalou-se na criança um quadro possivelmente evitável de morte cerebral até que chegassem os profissionais médicos ao recinto.

O óbito de Lucas veio a ser registrado dois dias depois desse acidente. Da mesma forma, em dezembro de 2012, o menino Bernardo Gonçalves de 3 anos, morreu afogado na piscina da escola onde estudava em área nobre da Zona Sul de São Paulo. No pedido de socorro feito por uma funcionária do centro educacional que o menino frequentava ao Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), houve o relato de uma tentativa leiga de reanimação do menino.

O processo investigativo não concluiu ainda se os profissionais que deveriam cuidar das crianças no recinto, tinham preparo técnico básico em primeiros socorros para casos de afogamentos com jovens.

Acidentes, portanto, são uma causa crescente de mortalidade e invalidez na infância e adolescência e naturalmente, uma importante fonte de preocupação de pais e mães. Constatam-se surpreendentemente percentuais superiores a 70% em adolescentes de 10 a 14 anos, quando se analisam as mortes decorrentes de causas externas (acidentes e violências). Esses acidentes ocasionam, a cada ano, no grupo com idade inferior a 14 anos, quase 6.000 mortes e mais de 140.000 admissões hospitalares, somente na rede pública de saúde.

A título de exemplo, segundo relatório do Conselho de Segurança Nacional dos Estados Unidos, apenas para o caso de engasgos, 4.500 mortes (em todas as faixas etárias) ocorreram apenas em 2009. Um relatório de 2013 afirmou que de 2001 a 2009 uma média de 12,435 crianças (menores de 14 anos) por ano foram tratadas em Prontos Socorros nos Estados Unidos devido a episódios de engasgos relacionados à alimentação.

Ainda sobre engasgos e sufocamentos, estes eventos são responsáveis por quase 40% dos acidentes em crianças menores de um ano de idade no Canadá. Para cada morte relacionada a um engasgo, aproximadamente 110 crianças são tratadas em unidades de emergência para engasgos não fatais. Na Europa um em cada 5 lesões por engasgo na infância envolvem produtos industrializados como plástico, partes em metal, moedas e brinquedos.

Na União Europeia, a cada ano aproximadamente 20 crianças (até 14 anos) morrem por engasgo com um brinquedo. Segundo levantamento em 2015 do Ministério da Saúde, 810 crianças, com até 14 anos, morreram, somente nesse ano, vítimas de sufocamento. Desse total, 611 tinham menos de um ano de idade.

Este Projeto de Indicação, visa, portanto, proporcionar a pais e mães do Estado do Ceará, um cenário de maior conforto emocional e segurança prática, sobre seus filhos que estão sob momentâneo cuidado – educacional ou recreativo - de terceiros. Acidentes ocorrem à nossa revelia e muitos sequer podem ser evitáveis em função de sua natureza caótica e imprevisível.

É, contudo, dever dos profissionais adultos que tutelam essas crianças e jovens em formação, garantir-lhes o mínimo de condição de amparo quando da ocorrência de um sinistro. Diante de um eventual acidente, o chamado de um profissional de saúde ou assistência médica dever ser imediato e urgente.

Nesse interim, é possível administrar de forma simples e específica, para acidentes muito específicos, um conjunto de práticas singelas que podem ser a diferença entre o simples susto, a sequela transitória ou definitiva, ou ainda, a morte de um vulnerável acidentado.

Ademais, entende-se que cabe mandatoriamente aos profissionais adultos tutores destes jovens, um mínimo de capacitação prática para eventuais intercorrências. Da mesma forma, que conhecimentos mínimos são necessários para o reconhecimento de expertise em diversas práticas, é plausível que o conhecimento de primeiros socorros básicos seja uma necessidade fundamental quando do convívio profissional e diário com crianças e adolescentes em formação educativa e recreacional.

Isto posto, solicito dos meus ilustres pares a aprovação deste Projeto de Indicação.

 

LEONARDO PINHEIRO

DEPUTADO