PROJETO DE INDICAÇÃO N.º 20/19

 

INSTITUI PROGRAMA DE DIRETRIZES DE PROMOÇÃO DE SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO DE PROFISSIONAIS DA SEGURANÇA PÚBLICA NO ESTADO DO CEARÁ.

 

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ INDICA:

 

Art. 1º Fica instituído o Programa de Segurança e Saúde no Trabalho dos Agentes de Segurança Pública do Estado do Ceará.

§ 1º Para os efeitos deste programa, entende-se como agentes de segurança pública todo servidor público que atue na segurança pública, seja policial civil, policial militar, agente penitenciário ou qualquer servidor público efetivo pertencente aos órgãos vinculados às Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social e da Secretaria de Gestão Penitenciária.

§ 2º Utiliza-se como base para o presente projeto, as diretrizes indicadas na PORTARIA INTERMINISTERIAL SEDH/MJ Nº 2, DE 15 DE DEZEMBRO DE 2010, que estabelece as Diretrizes Nacionais de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos dos Profissionais de Segurança Pública.

Art. 2º São objetivos instituídos por este Programa:

I – A promoção do bem-estar e de uma cultura de cuidado com a saúde dos trabalhadores da segurança pública;

II - a atuação preventiva em relação aos acidentes, traumas e doenças relacionadas aos processos laborais, como forma de prevenção ao adoecimento físico e mental, por meio de mapeamento de riscos inerentes a atividade;

III - o aprofundamento da compreensão, por meio de pesquisa e sistematização dos conhecimentos epidemiológicos, das doenças ocupacionais comuns entre profissionais de segurança pública;

IV - a mitigação dos riscos e danos à saúde e à segurança dos profissionais de segurança pública;

V – a promoção da saúde mental do trabalhador da segurança pública, com a criação de programas voltados para a prevenção ao uso de álcool e outras drogas, bem como de tratamento especializado para reabilitação dos profissionais acometidos por dependência química;

VI - a melhoria das condições de trabalho dos agentes de segurança pública, para prevenir ou evitar a morte prematura do trabalhador ou a incapacidade total/parcial para o trabalho;

VII - a criação de dispositivos de produção e divulgação de conhecimentos em temas de segurança, saúde e higiene, com periodicidade regular, por meio de eventos de sensibilização, palestras e inclusão de disciplinas nos cursos de formação inicial e continuada das instituições de segurança pública.

VIII – a criação de indicadores de saúde e bem estar do profissional de segurança pública, com aferição individual periódica;

IX – a criação de um programa de valorização da vida e de prevenção ao suicídio do profissional de segurança pública, inclusive com criação de banco de dados de ocorrências tentadas e consumadas, no âmbito das Secretarias da Segurança Pública e Defesa Social e de Gestão Penitenciária, disponibilizando atendimento psiquiátrico, núcleos terapêuticos de apoio e treinamento de profissionais de segurança para o diálogo sobre o assunto;

X – o estímulo à criação, no âmbito das Secretarias da Segurança Pública e Defesa Social e de Gestão Penitenciária, de um corpo multidisciplinar de profissionais especializados em promoção da saúde do trabalhador da segurança pública, inclusive com abrangência no interior do estado;

XI – um sistema de acompanhamento dos profissionais de segurança pública envolvidos em ocorrências letais, com vistas a evitar o estresse pós-traumático;

Art. 3º São objetos de atenção especial deste Programa:

I - as jornadas de trabalho;

II - a proteção à maternidade;

III - o trabalho noturno;

IV - os equipamentos de proteção individual;

V - o trabalho em ambientes de risco e/ou insalubres;

VI – as ocorrências com intervenção letal e risco de estresse pós-traumático;

VII - a higiene de alojamentos, banheiros e unidades de conforto e descanso para os servidores;

VIII- segurança no processo de trabalho

IX – a proteção contra enfermidades relacionadas ao uso abusivo de álcool e outras drogas;

Art. 4º O resultado do mapeamento previsto no Art. 2º, II, ensejará a realização de um programa de prevenção a riscos ambientais, com a implantação de medidas de controle e monitoramento dos mesmos.

Art. 5º Fica assegurado o fornecimento de equipamentos de proteção individual aos profissionais de segurança pública, em quantidade e qualidade adequadas, garantindo sua reposição permanente, considerados o desgaste e prazos de validade.

§ 1º O fornecimento dos equipamentos de proteção individual deve ser acompanhado de formação e treinamento continuado quanto ao seu uso correto, para prevenir as consequências de seu uso continuado e outras doenças profissionais ocasionadas por esforço repetitivo.

§ 2º Os equipamentos de proteção individual fornecidos devem contemplar as diferenças de gênero e de compleição física.

Art. 6º Deve ser assegurado às agentes femininas gestantes e/ou lactantes funções, instalações físicas e equipamentos individuais considerando suas especificidades e necessidades.

Art. 7º Os veículos utilizados no exercício profissional e as instalações em todas as instituições devem possuir adequação, manutenção e permanente renovação com ênfase para as condições de segurança, higiene, saúde e ambiente de trabalho.

Art. 8º Na atenção à saúde dos agentes de que trata este programa, devem ser observados:

I - a realização de avaliação em saúde multidisciplinar periódica, considerando as especificidades das atividades realizadas por cada policial, incluindo exames clínicos e laboratoriais;

II – o estímulo à criação de um estilo de vida saudável por parte dos profissionais de segurança pública, com a criação de materiais informativos, programas e projetos de promoção da saúde, da boa forma física e do bem-estar.

III - o acesso ao atendimento em saúde mental, em clínica pública ou ala de hospital público, em espaço protegido, destinado aos profissionais de segurança pública, de forma a viabilizar o enfrentamento da depressão, estresse e outras alterações psíquicas;

IV - o desenvolvimento de programas de acompanhamento e tratamento dos agentes envolvidos em ações com resultado letal ou alto nível de estresse;

V - a implementação de políticas de prevenção, apoio e tratamento do alcoolismo, tabagismo ou outras formas de drogadição e dependência química;

VI - a elaboração de cartilhas voltadas à reeducação alimentar como forma de diminuição de condições de risco à saúde e como fator de bem-estar profissional e autoestima.

Art. 9º Fica assegurado, dentro da carga-horária de trabalho semanal, período destinado à realização de exercícios físicos por parte dos profissionais de segurança pública;

Art. 10 Em caso de reabilitação e reintegração dos agentes de que trata este programa, devem ser adotadas como medidas:

§ 1º A promoção de reabilitação e a reintegração dos agentes ao trabalho em casos de lesões, traumas, deficiências ou doenças ocupacionais em decorrência do exercício de suas atividades, inclusive com a aquisição, com verbas do Fundo de Defesa Social, de próteses e órteses que auxiliem nesse processo;

§ 2º A viabilização de mecanismos de readaptação dos agentes e deslocamento para novas funções ou postos de trabalho como alternativa ao afastamento definitivo e à inatividade em decorrência de acidente de trabalho, ferimentos ou sequelas.

Art. 11 Para assegurar a dignidade e a segurança no trabalho, devem ser observadas as seguintes diretrizes:

I - manutenção de política abrangente de prevenção de acidentes e ferimentos, incluindo a padronização de métodos e rotinas, atividades de atualização e capacitação, bem como a constituição de comissão especializada para coordenar esse trabalho;

II – criação de catálogo de mobiliário padrão mínimo para todas as instalações de segurança pública, a ser desenvolvido por especialistas, tendo em vista a ergonomia e as especificidades das funções desempenhadas;

III - garantia aos profissionais de segurança pública acesso ágil e permanente a toda informação necessária para o correto desempenho de suas funções, especialmente no tocante à legislação a ser observada;

IV - erradicação de todas as formas de punição envolvendo maus tratos, tratamento cruel, desumano ou degradante contra os profissionais de segurança pública, tanto no cotidiano funcional como em atividades de formação e treinamento;

V – criação de linha de pesquisa, no âmbito da Superintendência de Pesquisa e Estratégia de Segurança Pública do Estado do Ceará (SUPESP), voltada para a compreensão dos problemas e criação de soluções relacionadas à saúde do trabalhador da segurança pública;

VI - combate ao assédio sexual e moral nas instituições, veiculando campanhas internas de educação e garantindo canais para o recebimento e apuração de denúncias;

VII - garantia de que todos os atos decisórios de superiores hierárquicos dispondo sobre punições, escalas, lotação e transferências sejam devidamente motivados e fundamentados;

VIII - regulamentação da jornada de trabalho dos profissionais de segurança pública, garantindo o exercício do direito à convivência familiar e comunitária.

Art. 12 Fica criada, no âmbito das Secretarias da Segurança Pública e Defesa Social e de Gestão Penitenciária, Comissão Multidisciplinar Integrada de Gestão em Segurança e Saúde no Trabalho, com caráter permanente, com a atribuição de propor diretrizes e acompanhar as ações em Segurança e Saúde no Trabalho nas instituições policiais ou prisionais.

§ 1º A Comissão deverá ser composta de trabalhadores de diferentes graus hierárquicos, técnicos das instituições e integrantes das universidades.

§ 2º Deverá ser observada a paridade de gêneros na composição da Comissão.

§ 3º Deverão ser criadas subcomissões semelhantes, formadas por profissionais de segurança pública, no âmbito de cada órgão vinculado às Secretarias da Segurança Pública e Defesa Social e de Gestão Penitenciária;

Art. 13 As despesas com a execução desta Lei correrão à conta de dotações próprias, consignadas no orçamento vigente e suplementada se necessário e do Fundo de Defesa Social do Estado do Ceará (FDS), devendo as previsões futuras destinar recursos específicos para o seu fiel cumprimento.

Art. 14 Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

 

RENATO ROSENO

DEPUTADO

 

 

JUSTIFICATIVA

 

O objetivo deste Projeto de Indicação é propugnar a criação programa de diretrizes para a saúde e a segurança no trabalho dos profissionais de segurança pública, no Estado do Ceará.

O direito fundamental à saúde é de extrema relevância, uma vez que está intimamente ligado ao direito à vida, elevado a status constitucional, e evidenciado no artigo 196 da Constituição de 1988: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação”.

Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (2013), um policial tem 5 vezes mais chances de ser morto do que a população geral. Dados retirados da pesquisa de vitimização e risco, realizada com a participação de policiais de todo o país pelo Fórum mostraram que 15,6% já foram diagnosticados com algum distúrbio psicológico, e em torno de 67% dos entrevistados relatam que têm medo de ser mortos dentro e fora do serviço.

Outro dado relevante refere-se ao número de relatos de assédio. Mulheres policiais assediadas por outros policiais. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública e a Fundação Getúlio Vargas aponta um percentual de 40% das entrevistadas na pesquisa relatam que já sofreram assédio moral ou sexual no ambiente de trabalho. O levantamento foi feito com mulheres das guardas municipais, pericia criminal, Corpo de Bombeiros e das Policias Civil, Militar e Federal. A pesquisa também mostrou que só 11,8% das mulheres denunciam que sofreram abuso.

Tais dados demonstram fatos que levam à realidade vivida no cotidiano, de medo relacionado ao trabalho, que se estende também aos momentos de folga.

Segundo o Sistema de Informações sobre Mortalidade, do Ministério da Saúde (SIM/MS), em 2016 houve 62.517 homicídios no Brasil. Isso implica dizer que, pela primeira vez na história, o país superou o patamar de trinta mortes por 100 mil habitantes (taxa igual a 30,3). Esse número de casos consolida uma mudança de patamar nesse indicador (na ordem de 60 mil a 65 mil casos por ano) e se distancia das 50 mil a 58 mil mortes, ocorridas entre 2008 e 2013 e comprova o clima de violência na atuação dos profissionais de segurança.

As doenças como depressão, síndrome do pânico, transtornos de ansiedade e outros semelhantes vem ocasionado problemas desastrosos junto à corporação policial e à sociedade em geral. Sintomas causados por esses transtornos, como o suicídio, vem sendo algo recorrente entre os Militares.

No Ceará sabe-se que os policiais estão cometendo suicídio em pleno exercício profissional. Desde o inicio deste ano três casos já foram noticiados. Tais fatos demandam ações urgentes que identifiquem as razões e previnam a continuidade desse e de outros adoecimentos e mortes, resultados das atividades desses trabalhadores (e as condições para a sua devida execução) considerando inclusive, que esse processo de adoecimento tem impacto direto na promoção da segurança pública cidadã, trazendo consequências para toda a sociedade.

Diante deste cenário, torna-se fundamental o planejamento e a implantação de ações voltadas para a promoção de melhores condições de trabalho e saúde destas categorias profissionais de forma ampla.

Do exposto, observa-se a relevância, constitucionalidade e adequação jurídica da proposição, por tal motivo, solicito o apoio dos pares para a aprovação deste Projeto.

Sala das Sessões da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, em 20 de fevereiro de 2019.

RENATO ROSENO

DEPUTADO