PROJETO DE LEI N.º 63/18

 

DEFINE OS PROCEDIMENTOS A SEREM OBSERVADOS PARA ATESTAR A LEGITIMIDADE DE CAMPANHAS SOLIDÁRIAS VOLTADAS À ARRECADAÇÃO DE MONTANTE, DESTINADO AO TRATAMENTO DE SAÚDE DE MENORES, IDOSOS, PESSOAS COM DEFICIÊNCIA, INCAPAZES E HIPOSSUFICIENTES RESIDENTES NO ESTADO DO CEARÁ.

 

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ DECRETA:

Art.1º. A pessoa física ou jurídica responsável pela abertura de conta bancária voltada à arrecadação de montante, destinado à realização de campanha solidária para o tratamento de saúde de menores, idosos, pessoas com deficiência, incapazes e hipossuficientes residentes no Estado do Ceará, deverá observar os seguintes procedimentos:

I - A referida conta bancária será exclusivamente dirigida à finalidade disposta no caput e destinada ao recebimento de montante em espécie;

II - A pessoa física ou jurídica poderá abrir mais de uma conta bancária reservada ao fim constante no caput, desde que, antes do início e da divulgação da campanha, dirija-se ao Ministério Público do Estado do Ceará, a fim de apresentar os documentos que justifiquem a abertura dessa(s) conta(s);

III - O comprovante de abertura da conta bancária, comprovante de endereço do beneficiário, exames comprobatórios da doença que acomete o paciente, atestado médico prescrevendo o remédio e o tratamento necessário, bem como os documentos comprobatórios da falta de recursos para custear o tratamento, deverão ser apresentados ao órgão ministerial;

IV - A pessoa física ou jurídica responsável pela abertura de conta bancária informará ao Ministério Público do Ceará o prazo estipulado da campanha e o valor total necessário para o tratamento de saúde, sendo proibido definir uma duração incerta ou valores indeterminados.

Art.2º. O Ministério Público do Ceará, após análise da documentação referida no art. 1º, III, deverá disponibilizar certidão à pessoa física ou jurídica responsável pela abertura da conta bancária, atestando que os documentos foram apresentados e que as informações foram prestadas.

Parágrafo único. A certidão mencionada no caput do art. 2º deverá ser exibida, no ato de divulgação da campanha, em algum meio de comunicação online.

Art.3º. No ato de divulgação, também deverá ser esclarecido o período de duração da campanha e o valor global desta, que corresponde ao total necessário ao tratamento de saúde do beneficiário.

Art.4º. Assim que o responsável pela conta bancária verificar que esta já atingiu o valor total fixado no art. 1º, IV, deverá providenciar o bloqueio dessa conta para impossibilitar a realização de novos depósitos.

Art.5º. Na medida em que for sendo gasto o valor relativo ao tratamento de saúde do beneficiário, o responsável deverá prestar contas, mensalmente, à sociedade, com a exibição de nota(s) fiscal(is) dos gastos e do valor que possui na referida conta, no mesmo meio de comunicação online utilizado para a divulgação da campanha.

Art.6º. Na hipótese de descumprimento do disposto nos art. 4º e 5º, qualquer pessoa poderá denunciar a irregularidade ao Ministério Público do Ceará, a fim de que sejam tomadas as providências cabíveis.

Art.7º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

 

LEONARDO ARAÚJO

DEPUTADO

 

 

JUSTIFICATIVA

A realização de campanhas solidárias tornou-se um costume social ao longo dos anos no Brasil. São diversos os meios utilizados para a arrecadação de montante destinado a objetivos diversos. Quem nunca se deparou com “vaquinhas e rifas” reservadas para reunir dinheiro em prol da ajuda ao próximo em um momento difícil, para tratamento de saúde e realização de um sonho?

O cenário atual envolvendo a realização de campanhas solidárias demonstra que estas vêm sendo divulgadas por meio da internet, utilizando-se mídias sociais, o que ampliou bastante a participação das pessoas, modelo denominado de crowdfunding (“vaquinha online”).

Apesar da recente popularização desse tipo de campanha por meio da internet, a qual já apresentou casos de sucesso; sem a definição de regras, a sociedade pode ser submetida a golpes diversos diante da divulgação e realização de campanhas falsas.

Além disso, sem o mínimo controle social, as quantias provenientes de campanhas com objetivos sérios são comprometidas, diante da destinação diversa dada pelos responsáveis aos valores recebidos. O objetivo deste Projeto de Lei é definir procedimentos e regras a serem observados quando da abertura de contas bancárias voltadas à arrecadação de fundos em prol de determinada campanha solidária para ajudar menores, idosos, pessoas com deficiência, incapazes e hipossuficientes residentes no Estado do Ceará.

Este Projeto de Lei também objetiva colaborar para que o público a que se destina não seja prejudicado pela má-fé de terceiros mal intencionados, os quais se aproveitam dos momentos difíceis vividos pelo próximo para obtenção de algum proveito.

Faz-se imprescindível a participação do Ministério Público do Ceará para o fiel desempenho do objeto deste Projeto de Lei, uma vez que essa instituição é oficial, independente e autônoma, de grande importância para a função jurisdicional do Estado, agindo na defesa da ordem jurídica, do regime democrático de direito, na defesa dos direitos sociais; entre eles a educação, a saúde, o meio ambiente, os direitos dos idosos, crianças, adolescentes, das pessoas portadoras de deficiência e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, bem como pela leal observância das leis e da Constituição.

No que se refere à constitucionalidade do presente Projeto de Lei, verifica-se que o objeto deste está de acordo com o art. 24, incisos XII, XIV e XV, da Constituição Federal de 1988, competindo à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: (XII) previdência social, proteção e defesa da saúde, (XIV) proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência e (XV) proteção à infância e à juventude.

No que se refere ao objeto deste Projeto de Lei, a Constituição do Estado do Ceará prevê no art. 15, inciso II:

 

Art. 15. São competências do Estado, exercidas em comum com a União, o Distrito Federal e os Municípios:

(…)

II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia aos portadores de deficiência.

 

A Constituição do Estado do Ceará estabelece ainda, no art. 16, incisos XII, XIV e XV:

Art. 16. O Estado legislará concorrentemente, nos termos do art. 24 da Constituição da República, sobre:

(…)

XII - previdência social, proteção e defesa da saúde;

(...)

XIV - proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência;

XV - proteção à infância, à juventude e à velhice.

Ressalta-se também que o objeto deste Projeto de Lei vem sendo incentivado e acolhido por alguns Estados, por exemplo, na Assembleia Legislativa de Santa Catarina, está em andamento o Projeto de Lei n°. 33.0/2018.

Os atuais entendimentos jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal fortalecem o objeto deste Projeto de Lei, vejamos:

A competência dos Estados para legislar sobre a proteção e defesa da saúde é concorrente à União e, nesse âmbito, a União deve limitar-se a editar normas gerais, conforme o art. 24, XII, § 1º e § 2º, da CF. Não usurpa competência da União lei estadual que dispõe sobre o beneficiamento de leite de cabra em condições artesanais (ADI 1278, rel. min. Ricardo Lewandowski, j. 16-5-2007, P, DJ de 1º-6-2007).

Este Projeto de Lei está em perfeita harmonia com os princípios constitucionais, como o da dignidade da pessoa humana e o da isonomia. Resta esclarecer que este Projeto de Lei não apresenta vício jurídico de iniciativa, uma vez que não impõe nenhuma conduta ao Poder Executivo, mas tão somente define os procedimentos a serem observados após a abertura de conta bancária voltada à arrecadação de fundos em prol de determinada campanha solidária para ajudar menores, idosos, pessoas com deficiência, incapazes e hipossuficientes residentes no Estado do Ceará.

Adiante, elucidamos interpretação jurisprudencial acerca do exercício do poder de iniciativa legislativa:

A disciplina jurídica do processo de elaboração das leis tem matriz essencialmente constitucional, pois reside, no texto da Constituição - e nele somente -, os princípios que regem o procedimento de formação legislativa, inclusive aqueles que concernem ao exercício do poder de iniciativa das leis. A teoria geral do processo legislativo, ao versar a questão da iniciativa vinculada das leis, adverte que esta somente se legitima - considerada a qualificação eminentemente constitucional do poder de agir em sede legislativa - se houver, no texto da própria Constituição, dispositivo que, de modo expresso, a preveja. Em consequência desse modelo constitucional, nenhuma lei, no sistema de direito positivo vigente no Brasil, dispõe de autoridade suficiente para impor, ao chefe do Executivo, o exercício compulsório do poder de iniciativa legislativa (MS 22.690, rel. min. Celso de Mello, j. 17-4-1997, P, DJ de 7-12-2006).

Sendo assim, este Projeto de Lei obedece ao princípio da separação dos poderes, não invadindo a competência privativa do Poder Executivo. Esta iniciativa não é princípio constitucional, mas norma-disposição. A sua relação com o princípio da separação dos poderes envolve uma garantia deste (quanto à independência dos Poderes Executivo e Judiciário), como uma exceção ao próprio princípio (subtração da natural vocação legislativa do Parlamento).

Por isso, propomos o presente, esperando contar com o apoio desta Casa Legislativa.

Sala das Sessões da Assembleia Legislativa do Ceará, em 14 de março de 2018.

LEONARDO ARAÚJO

DEPUTADO