PROJETO DE LEI N.º 252/18

 

CONSIDERA COMO PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL DO ESTADO DO CEARÁ A “LITERATURA DE CORDEL” TORNANDO OBRIGATÓRIA A INCLUSÃO DA LITERATURA DE CORDEL DE FORMA TRANSDISCIPLINAR NA REDE ESTADUAL DE ENSINO E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.

 

 

A ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ, RESOLVE:

 

Art. 1o Fica considerado como Patrimônio Cultural Imaterial do Estado do Ceará a “LITERATURA DE CORDEL".

Art. 2º - Ficam os estabelecimentos da Rede Estadual de Ensino obrigados a incluir a Literatura de Cordel como gênero textual e fonte de saberes sobre as disciplinas normais do currículo escolar, observadas as exigências da nova BNCC - Base Nacional Curricular Comum.

§ 1º Os estabelecimentos de ensino referidos neste artigo compreendem as escolas e demais unidades de ensino da Educação do Ensino Médio, inclusive na modalidade profissionalizante, Centros de Formação de professores e demais unidades educacionais do Estado do Ceará, ficando na responsabilidade da Secretaria Estadual de Educação como unidade gestora da educação no estado, tomar as providências cabíveis e necessárias à implementação desta lei.

§ 2 º Ficarão obrigadas as unidades de ensino públicas estaduais, por intermédio da Secretaria Estadual de Educação a incluir em seu calendário, eventos voltados a difusão cultural e histórica da literatura de cordel e dos cordelistas.

Art. 3º - Sem prejuízo dos conteúdos disciplinares previstos no Plano Estadual de Educação, o emprego da Literatura de Cordel como gênero textual representativo da cultura regional, com toda a sua capacidade de contextualização de conteúdos, será contemplado no ensino dos conteúdos curriculares das diversas disciplinas utilizando-se os poemas de Literatura de Cordel, nos seus tradicionais suportes identificados como Folhetos, Romances e Folhas Soltas e nos formatos modernos de suportes, como Cordelivros, CD’s, DVD’s e Blu-Ray’s.

Art. 4º - O critério basilar para a escolha dos títulos a serem adotados nas escolas, bibliotecas, eventos e Programas de Leitura é a observância no texto poético, das regras tradicionais da Literatura de Cordel e do Repentismo Nordestinos respeitando-se as normas técnicas reconhecidas pelos cordelistas e repentistas, suas associações e academias, na exigência da técnica de Versificação que contém Rima, Métrica e Oração, conforme prática secular dos poetas populares nordestinos.

Art. 5º - As obras de Literatura de Cordel a serem adotadas na Rede Estadual de Ensino deverão abordar as temáticas tradicionais dos diversos ciclos temáticos reconhecidos pelos poetas e pesquisadores que são referência da área, contemplando os folhetos e romances clássicos, os recontos de obras literárias dos escritores eruditos nacionais e estrangeiros retrabalhados em Literatura de Cordel, os folhetos abordando Acontecidos importantes para o Brasil e, com especialidade, para o Ceará, no ciclo em que a Literatura atuava e atua como jornalismo popular, poemas destinados ao público infantil e os de cunho didático, abordando temas de Português, Matemática, Ciências, Geografia, História, Meio Ambiente, Cultura Artística, Esportes, Saúde e Alimentação Saudável, Cultura Popular, Vocações Profissionais, Ética e Cidadania.

Art. 6º – Os acervos de Literatura de Cordel também conterão obras de xilogravura, por ser esta a expressão visual das artes gráficas mais representativa da ilustração da produção poética contemplada nesta lei.

Art. 7º - As bibliotecas escolares e as bibliotecas públicas do estado do Ceará manterão em seus acervos, sessões intituladas “CORDELTECAS” que disporão de acervos os mais amplos de folhetos e romances da Literatura de Cordel, cordelivros, livros sobre a Literatura de Cordel, o Repente e a Xilogravura, livros que contém as obras de poetas populares nordestinos, bem como, acervo audiovisual dos tipos CDs, DVDs, Blu-Ray.

Art. 8º – Para o alcance do domínio da temática, serão promovidos seminários e oficinas, cursos, minicursos e eventos nas escolas e nas bibliotecas para professores e alunos, incluindo-se a presença de poetas cordelistas, repentistas e xilógrafos nas unidades de ensino apresentando e difundindo conhecimentos sobre o seu fazer poético.

Art. 9º – A Rede Estadual de Ensino do Ceará será contemplada com Programas de Leitura que incluirão obras com textos em Literatura de Cordel nos seus variados e supracitados formatos, suportes gráficos e digitais.

Art. 10 - As providências tomadas a partir desta lei reforçam e ampliam o disposto na Lei n° 13.549, de 23 de dezembro de 2004 que instituiu a Política Estadual do Livro e dá outras providências.

Art. 11- Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 12 - Revogam-se as disposições em contrário.

 

 

FERNANDO HUGO

DEPUTADO

 

JUSTIFICATIVA

No dia 19 de setembro de 2018, foi reconhecido, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, como Patrimônio Imaterial Cultural do Brasil a literatura de Cordel.

Tendo como berço o Norte e Nordeste do Brasil, a Literatura de Cordel hoje é disseminada em todo o Brasil, graças aos esforços dos Poetas, declamadores, editores, ilustradores, desenhistas, artistas plásticos, xilogravadores e folheteiros e seus apoiadores, como é o caso da Dra. Lucinda Marques de Azevedo, que em muito contribuiu à apresentação do presente projeto de Lei.

Sendo o Ceará um dos nascedouros desta forma de expressão cultural, literária e artística, é obrigatório, por parte desta Casa Legislativa, o reconhecimento da Literatura de Cordel como PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL DO ESTADO DO CEARÁ.

Desta feita, é cada vez maior a consciência da importância de se utilizar a Poesia, a Música e a Contação de Histórias como ferramentas didático-pedagógicas para suporte e alavancagem do desenvolvimento da Oralidade, da Leitura e da Escrita, desde a Educação Infantil, a Educação dos Jovens e Adultos, passando, inclusive, pelos bancos das faculdades e universidades do Brasil.

Cabem às instituições de ensino otimizar os conhecimentos trazidos pela criança desde o seu nascimento numa construção que se realiza nas vivências que impactam todos os seus sentidos e sensibilidades que constroem sua percepção, audição, visão e memória.

A Literatura de Cordel, dentre suas inúmeras manifestações, preenchem tais requisitos, desenvolvendo essas habilidades e permitindo ao professor explorar estes conhecimentos historicamente produzidos mesmo na mais tenra infância, começando a exercitar na criança a sua curiosidade intelectual no manejo de atividades interdisciplinares, introduzindo assim, no seu universo, as bases para as disciplinas e competências futuras, servindo, assim, de base para a educação de jovens e adolescentes.

Ao chegarem no ambiente escolar as crianças já trazem consigo significativo repertório de saberes adquiridos no contexto das diversas linguagens com que conviveram, sendo a Poesia uma das mais fortes influências, posto que esta lhe chega desde as Cantigas de Ninar e as Cantigas de Roda e através dos vários meios de comunicação presentes no seu lar e na vida em geral, sempre acompanhada da Música, arte do som, linguagem que age para além da compreensão e penetra no íntimo dos seres humanos, independentemente do grau de maturidade ou de compreensão.

No Nordeste brasileiro, especialmente no Ceará, a Literatura de Cordel é, sem sombra de dúvidas, a mais popular e mais abrangente expressão da poesia brasileira.

Cabem, portanto, às instituições de ensino do Estado do Ceará, no seu papel fundante e construtivo dos saberes e competências, dar continuidade às relações culturais e de aprendizado a que as crianças estão imersas desde o nascimento e educação infantil, viabilizando que este cabedal construído antes da sala de aula possa se transformar em um processo de aquisição da Linguagem Oral, da Leitura e da Escrita, somando estas linguagens que as crianças já chegam com elas à escola e que lhes são atrativas e muito lhes interessam transformando-se em movimentos, gestos, fala, poesia, brincadeira,  desenho, canto, a pintura, dramatização e dança.

Além de todos os impactos que as novas tecnologias, televisão, computador, celular e games causam nas crianças e adolescentes, elas continuam submetidas aos prazeres dos brinquedos populares e das brincadeiras infantis, lúdicas, de transmissão oral, como as Cantigas de Roda, que se fazem acompanhar da Música e da Dança, mas que têm uma forte prevalência da poesia, que, em grande medida é fundada na Poética, nas Regras de Versificação da Literatura de Cordel e do Repente e das suas variações pelo Brasil afora.

A Literatura de Cordel, visualmente enriquecida com a arte da Xilogravura, permite às crianças e adolescentes o exercício do trabalho com imagens, com traços originais, permitindo leituras outras que só vêm a enriquecer o aprendizado, cumprindo o que preconizam as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação em todos os seus graus, no que concerne ao trabalho com a oralidade, a leitura e a escrita com o fim de proporcionar à criança e ao adolescente a aquisição do conhecimento de si e do seu mundo, favorecendo a imersão deles nas diferentes linguagens e o progressivo domínio por eles de vários gêneros e formas de expressão: gestual, verbal, plástica, dramática e musical; possibilitando experiências de narrativas, de apreciação e interação com a linguagem oral e escrita e convívio com diferentes suportes e gêneros textuais orais e escritos, ampliando a confiança e a participação nas atividades individuais e coletivas; incentivando a curiosidade, a exploração, o encantamento, o questionamento e a indagação.

Deste modo, pode-se avançar nos fundamentos para criar as bases das demais competências almejadas pela nova Base Nacional Curricular Comum, quais sejam: O desenvolvimento do Senso Estético que lhe permita fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às mundiais, a capacidade de usar diversas linguagens para expressar e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos, utilizando-se de diferentes tecnologias de comunicação, estabelecendo relações e interfaces através da vivência com a diversidade de saberes e relações multiculturais, pensando e agindo com liberdade e autonomia, trabalhando a realidade cultural circundante, exercitando livremente as próprias emoções, exercendo a empatia e o diálogo e aprendendo a agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade, flexibilidade, resiliência e determinação e indo além dos limites destas legislações que mudam a cada quadra histórica, pois se trata da mais genuína cultura literária nordestina, ultrapassando o tempo e o espaço da Educação e se constituindo mais rica ainda quando observamos as possibilidades de uso da Literatura de Cordel nas salas de aula no Ensino Fundamental I e no Ensino Fundamental II, inclusive nos conteúdos do Ensino Médio, pois a diversidade de títulos abrangendo as mais diversas áreas do conhecimento humano faz com que se possa encontrar nesta expressão poética da nossa Literatura regional a possibilidade de cobrir conteúdos ensinados em todas as disciplinas e, levando-se em conta que o Ceará do Cego Aderaldo, de Patativa do Assaré, de José Bernardo, de Geraldo Amâncio, José Maria de Fortaleza, Pedro Bandeira do Juazeiro e o ipuense Gonçalo Ferreira, presidente da Academia Brasileira de Literatura de Cordel, dispõe de uma nova geração de poetas em plena atividade do porte de Arievaldo Viana, Klevisson Viana, Rouxinol do Rinaré, Evaristo Geraldo, Fernando Paixão, Marcos Mairton, Stélio Torquato e tantos outros, além do maior núcleo brasileiro de grandes xilógrafos, ora reunidos na Lira Nordestina, tipografia que representou um dos papéis mais importantes na produção em escala industrial da Literatura de Cordel no auge dos anos 50 e 60, bem como novas editoras de folhetos e cordelivros que se destacam nacionalmente, conforme restou provado nas duas últimas bienais internacionais do Livro de São Paulo, com o “Espaço do Cordel e do Repente”, sob a coordenação da CCL – Câmara Cearense do Livro, que, nas duas feiras citadas foi um dos dois espaços mais visitados daquele que é o maior evento literário da América Latina.

Com isso comprovamos que além de todos os temas já contemplados pela Literatura de Cordel, qualquer outro conteúdo que seja demandado pelas escolas, poderá ser produzido poética e graficamente em questão de dias, dentro do próprio Ceará.

Por estas razões, apresento aos nobres pares, nos termos regimentais, o projeto de Lei para apreciação em Plenário, requerendo sua aprovação e remessa ao Excelentíssimo Senhor Governador do Estado do Ceará para sanção.

FERNANDO HUGO

DEPUTADO