PROJETO DE LEI N.º 234/18

 

INSTITUI A POLÍTICA ESTADUAL DE CONTROLE DE ARMAS DE FOGO.

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ RESOLVE:

Capítulo 1

Da Finalidade

Art. 1° - Esta Lei Institui a Política Estadual de Controle de Armas de Fogo, suas Peças e Componentes, e de Munições, suas definições, princípios norteadores e objetivos.

Parágrafo único - A finalidade desta lei é promover, facilitar e fortalecer a cooperação entre Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário, a fim de prevenir, combater e erradicar o tráfico ilícito de armas de fogo, suas peças e componentes, e munições.

Capítulo 2

Das Definições

Art. 2° Para as finalidades desta lei, considera-se:

I - “Arma de fogo” - arma que arremessa projéteis empregando a força expansiva dos gases gerados pela combustão de um propelente confinado em uma câmara que, normalmente, está solidária a um cano que tem a função de propiciar continuidade à combustão do propelente, além de direção e estabilidade ao projétil;

II - “Peça ou componente” - qualquer elemento próprio ou de reposição projetado especificamente para uma arma de fogo e essencial à sua operação, incluindo o cano, carcaça ou coronha, culatra móvel ou tambor, ferrolho ou bloco de culatra e qualquer dispositivo projetado ou adaptado para diminuir o som causado pelo disparo de uma arma de fogo;

III - “Munição” - artefato completo, pronto para carregamento e disparo de uma arma, cujo efeito desejado pode ser: destruição, iluminação ou ocultamento do alvo; efeito moral sobre pessoal; exercício; manejo; outros efeitos especiais;

IV - “Rastreamento” - o acompanhamento sistemático, do fabricante ao comprador, de armas de fogo e, quando possível, de suas peças e componentes e munições, com a finalidade de auxiliar as autoridades competentes na detecção, investigação e análise da fabricação e do tráfico ilícitos.

 

Capítulo 3

Marcação e Rastreamento das Armas de Fogo

Art.3° - Para a finalidade de identificação e rastreamento de cada arma de fogo, as armas adquiridas e utilizadas dentro do Estado do Ceará deverão contemplar a instalação de dispositivo eletrônico de identificação (chip), contendo informações relevantes sobre a arma, como a identificação do fabricante, a data de fabricação, a cadeia dominial e a identificação do proprietário.

Parágrafo único - Os editais e contratos administrativos para a aquisição de armas de fogo para os Órgãos de Segurança Pública do Estado do Ceará deverão contemplar a inclusão de dispositivo eletrônico de identificação (chip), contendo informações sobre a arma descritas no caput deste artigo.

Art. 4° - As munições comercializadas no Estado do Ceará, inclusive as adquiridas pelas Empresas de Segurança Privada e outras categorias com porte, devem ser marcadas no culote do estojo, conforme o § 2º do Art. 23 da Lei Federal nº 10.826/2003.

Parágrafo único – Os editais e contratos administrativos para a aquisição de munições devem limitar a 2.000 (duas mil) munições por lote, com mesma numeração gravada no culote dos estojos, de modo a facilitar a rastreabilidade das distribuições e uso pelos Órgãos de Segurança Pública no Estado do Ceará.

Capítulo 4

Da Custódia das Armas de Fogo Apreendidas

Art. 5º – Fica instituído por esta Lei o Número de Identificação de Arma de Fogo (NIAF), a ser gerido pelo Poder Executivo.

§1º - As armas apreendidas pelas Polícias Civil e Militar do Estado do Ceará serão encaminhadas para a delegacia responsável pela instauração do Inquérito Policial, para a lavratura do procedimento policial decorrente, bem como a fixação de lacres de segurança (identificadores) contendo um único Número de Identificação de Arma de Fogo (NIAF), preso no guarda-mato ou em outra parte da arma mais conveniente e segura, de acordo com o procedimento operacional padrão específico.

§2° - A delegacia responsável pela instauração do Inquérito Policial encaminhará a arma de fogo apreendida para realização de perícia e elaboração do respectivo laudo que instruirá os procedimentos instaurados.

§3° - Após a elaboração do laudo pericial, a arma será encaminhada para a delegacia responsável pela instauração do Inquérito Policial ou para o Órgão da Secretaria de Segurança Pública responsável pela custódia de armas apreendidas, a ser definido em regulamento próprio.

Art. 6° - As requisições de apresentação de arma de fogo pelo Poder Judiciário serão encaminhadas para a delegacia responsável pela instauração do Inquérito Policial ou para o Órgão da Secretaria de Segurança Pública responsável pela custódia de armas apreendidas, para fins de localização e atendimento.

§ 1° - O Poder Executivo, por meio do NIAF, fará o controle sistemático das armas de fogo apreendidas em todo o Estado, providenciando, inclusive, no prazo máximo de 15 dias contados a partir da apreensão, o cadastro no Sistema Nacional de Armas - SINARM, e, se necessário a remessa da informação da arma apreendida para ser informado também ao Sistema de Gerenciamento Militar de Armas - SIGMA, quando for o caso.

§ 2° - Trimestralmente, após a autorização do Poder Judiciário, as armas de fogo apreendidas serão encaminhadas para destruição pelo Exército, restituição ao proprietário ou aproveitamento pelos Órgãos de Segurança Pública do Estado do Ceará, conforme o caso.

Capítulo 5

Das Informações e Cooperação

Art. 7° O Estado do Ceará deverá promover a cooperação entre os Órgãos Estaduais de Segurança Pública, as Polícias Militar e Civil, o Ministério Público, a Superintendência da Polícia Federal no Ceará e o Exército Brasileiro para o combate ao tráfico ilícito de armas de fogo, devendo ocorrer o compartilhamento dos dados relevantes, com o intuito de aumentar a capacidade conjunta de evitar, detectar e investigar a fabricação e o tráfico ilícitos de armas de fogo, suas partes e componentes e munições, e de processar as pessoas envolvidas nessas atividades ilícitas.

§ 1° - As instituições citadas neste artigo buscarão o apoio e a cooperação de fabricantes, agentes comerciais, importadores, exportadores, intermediários e transportadores comerciais de armas de fogo, suas partes e componentes e munições, para prevenir e detectar as atividades envolvendo tráfico de armas.

§ 2º - Respeitando-se as normas básicas e internas do âmbito jurídico de cada instituição citada neste artigo, deverá ser preservada a confidencialidade, de acordo com eventuais restrições relativas ao uso de informações indicadas por qualquer das instituições.

Art. 8° - O Estado do Ceará deverá adotar as medidas necessárias, junto à Superintendência da Polícia Federal do Ceará e o Comando Militar, para a criação de um fluxo de compartilhamento entre os respectivos bancos de dados já existentes, contendo informações relativas a aquisição, destino, uso, movimentação e transferência, extravio, furto, roubo e descarte de armas, munições e explosivos, encaminhando relatórios semestrais aos órgãos competentes, bem como à Assembleia Legislativa do Estado do Ceará sobre armamento roubado, furtado, ou sob qualquer título, e apreendido no Estado do Ceará, contendo as seguintes informações: 

I - Registro de ocorrência da apreensão da arma de fogo e da munição, abrangendo os delitos associados à apreensão, autor e outras informações sobre as circunstâncias do fato;

II - Laudo pericial buscando atestar as informações da arma de fogo e da munição (se necessário com exames para recuperação do número de série e outras marcas identificadoras), assim como um histórico de outros delitos, que porventura tenham sido cometidos por esse armamento; 

III - Investigação de outras ocorrências criminais, tais como roubo, furto ou extravio;

IV – Rastreamento e investigação do proprietário da arma de fogo; 

V - Investigação do comerciante da arma de fogo.

Art. 9º – Os Órgãos de Segurança Pública do Estado do Ceará deverão produzir e divulgar, com periodicidade anual, relatório de dados contendo informações relativas a armas, munições e explosivos extraviados, furtados e roubados, como também apreendidos e enviados a destruição no Estado do Ceará, encaminhando tais informações à Assembleia Legislativa do Estado do Ceará.

Art. 10 - O Estado do Ceará irá adotar as medidas necessárias para a integração de sistema comum entre a Polícia Civil do Estado do Ceará e o Ministério Público, com o intuito de que criar um fluxo eficiente de comunicação entre os órgãos de investigação, contendo informações sobre roubo, furto e extravio de armamentos e explosivos.

Capítulo 6

Das Disposições Finais e Transitórias

Art. 11 – Fica criado por esta Lei o Sistema Estadual de Controle de Material Bélico.

Parágrafo Único – Para fins do disposto no “caput” deste artigo, o Estado do Ceará deverá realizar o cadastramento informatizado de todo o seu armamento institucional patrimoniado no prazo de 06 (seis) meses a contar da data da publicação desta lei.

Art. 12 – Fica instituído no Calendário Oficial do Estado do Ceará o Dia Estadual do Controle de Armas, a ser celebrado no dia 15 de março de cada ano, para marcar a luta pela redução da violência por arma de fogo.

Parágrafo Único – A data mencionada no “caput” deste artigo deverá marcar a campanha de entrega voluntária de arma de fogo pela população.

Art. 13 – O Poder Executivo Estadual deverá regulamentar a presente Lei através da elaboração do Plano Estadual de Controle de Armas, no prazo de 6 (seis) meses a contar da data de sua publicação.

Art.14 - Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação.

Sala das Sessões, 24 de Agosto de 2018.

 

RENATO ROSENO

DEPUTADO

 

JUSTIFICATIVA

DA ADMISSIBILIDADE JURÍDICA

Inicialmente, é importante destacar, no que concerne a competência legislativa, que os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, e, nessas circunstâncias, o Estado do Ceará exerce, em seu território, as competências que, explícita ou implicitamente, não lhes sejam vedadas pela Constituição Federal caput (CF/88, art. 25, e § 1º).

Neste sentido, é importante destacar que o presente projeto de lei trata das matérias que são atinentes à segurança pública de nosso estado, em especial, no que se refere à produção e ao consumo de armas de fogo e munições, bem como estabelece procedimentos a serem adotados pela polícia civil.

Vejamos o que dispõe a Constituição Federal quanto à competência para legislar sobre o tema:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

(…)

V - produção e consumo;

(…)

XV - proteção à infância e à juventude;

XVI - organização, garantias, direitos e deveres das polícias civis.

O parlamento cearense liderou, com o Fundo das Nações Unidade para a Infância, a criação do Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência. O trabalho do Comitê realizou uma pesquisa pioneira com as famílias dos adolescentes vitimas de homicídios em sete cidades do Estado e chegou a um conjunto de evidências que expõem adolescentes às dinâmicas da violência e os tornam vulneráveis aos homicídios. O trabalho do Comitê, pelo rigor técnico de suas pesquisas e pela agenda de orientações às políticas públicas que conseguiu construir pelo diálogo interinstitucional e pela observação das indicações empíricas que colheu, ganhou notoriedade pública nacional.

Uma das evidências encontradas é exatamente, na dimensão comunitária, a alto exposição de adolescentes às armas, o acesso facilitado, seja através de parentes e/ou amigos. Isto posto, uma das recomendações do Comitê é que se organizem medidas de controle de armas e munição como forma de interferir material e culturalmente nas estruturas que erigem a sociabilidade e a conflitualidade armadas. Uma das eficiências levantadas pelo comitê aponta que as armas de fogo têm importância fundamental no incremento das mortes de adolescentes. Em Fortaleza o meio utilizado para os homicídios de 94% dos adolescentes, em 2015, foi arma de fogo. Com isso foi elaborada a recomendação número 10, publicado no relatório Cada Vida Importa que tratou sobre o controle de armas de fogo e munições.

Por esta razão, a iniciativa ora proposta se coaduna com o objetivo de garantir proteção à infância e à juventude, mas também à população adulta, marcada nos últimos anos com a escalada de violência em nosso estado.

Nessa perspectiva, salutar pôr em relevo que a competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados (CF/88, art. 24, § 2º). Vale destacar que o projeto em tela não visa contrariar ou se sobrepor à legislação federal vigente, mas, em verdade, busca estabelecer procedimentos relacionados à circulação de armas no Estado do Ceará, principalmente no que concerne ao compartilhamento de dados e informações no âmbito da Polícia Civil de nosso estado, conforme atribuições que já são legalmente previstas em outros instrumentos normativos.

Assim, fica evidente que a incursão do Estado do Ceará no terreno das temáticas retratadas na presente proposição não constitui usurpação de competência legislativa federal.

No âmbito do Estado do Ceará, a competência para a iniciativa de leis a que se refere a Constituição do Estado do Ceará, em seu art. 60, I, é conferida aos Deputados Estaduais. No entanto, essa competência é remanescente, ou seja, remanesce aos Deputados Estaduais a iniciativa de assuntos não atribuídos aos legitimados nos demais incisos do mencionado artigo (CE/89, art. 60, II, III, IV, V e VI, § 2º e suas alíneas).

Podemos observar que a proposição não fere a competência de iniciativa do processo legislativo atribuída privativamente ao Governador do Estado, haja vista que não enfoca matéria relacionada com a estrutura organizacional e o funcionamento do Poder Executivo, especificamente disposição e funcionamento da administração estadual, prevista no art. 88, incisos III, e VI, da Carta Magna Estadual, tampouco adentra a iniciativa legislativa do Governador do Estado no que tange às matérias elencadas no art. 60, II, § 2º e suas alíneas.

Sendo assim, o legislador estadual, nesse aspecto, não atuou fora de seu âmbito de competência. Ressalte-se ainda que no Estado do Rio de Janeiro, a assembleia Legislativa aprovou o projeto de Lei n. 2966/2017, de iniciativa de Deputados Estaduais, e não do Governador do Estado, o que só reforça a competência dos parlamentares para legislar sobre a matéria.

NO MÉRITO DO PROJETO

O controle de armas de fogo e munição representa hoje um dos maiores desafios para a eficácia das políticas de segurança pública, uma vez que representa diretamente a possibilidade de redução da conflitualidade armada que se assiste hoje em níveis preocupantes no Brasil, seja nas relações interpessoais, que resultam em diversos eventos violentos, seja pelo poder adquirido por grupos criminosos que se estabelecem e se alastram pelo poder das armas.

Segundo o relatório do Atlas da Violência 2018, entre 1980 e 2016, cerca de 910 mil pessoas foram mortas com o uso de armas de fogo no Brasil. No início dos anos 1980, para cada 100 pessoas assassinadas, cerca de 40 eram vítimas de armas de fogo. Já em 2003, com estabilidade até os dias atuais, representa 71,1% por arma de fogo. Entre 2006 e 2016, o crescimento de mortos por arma de fogo de 27,4% no Brasil.

Este cenário se dá na esteira da grave crise de segurança pública atravessada pelo Brasil nos últimos anos, agudizada por contextos regionais, como o do nordeste brasileiro. Somente em 2017 foram 63.880 mortes violentas intencionais, de acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em seu Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

No Ceará a situação é mais preocupante e delicada, dado que a realidade em referência à violência armada cresceu acentuadamente nos últimos anos. Entre 2006 e 2016 aumentaram de 174,3% as mortes por arma de fogo no estado. Em 2017, foram registrados 5133 homicídios, o maior número já registrado na história do estado. Entre 2006 e 2016, Ceará possui um crescimento de sua taxa de homicídio na ordem de 86,3%. O Estado possui hoje a terceira maior taxa de homicídio do Brasil, com 59,1 casos para cada 100.000 habitantes, atrás apenas do Rio Grande do Norte e do Acre, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

Nos últimos anos, o Ceará, e Fortaleza de modo particular, ganharam atenção nacional exatamente pela crescente substancial dos homicídios, transformando o estado e sua capital nos territórios que estão na ponta dos rankings. Fortaleza se tornou a cidade mais perigosa para adolescentes e jovens. Segundo o Índice de Homicídios na Adolescência, a capital é mais perigosa para adolescentes, com uma indicação de que em cada grupo de 1000 adolescentes 11 não completaram 18 anos, caso as condições se mantenham, entre 2015 e 2018.

Em razão deste quadro, o parlamento cearense liderou, com o Fundo das Nações Unidade para a Infância, a criação do Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência. O trabalho do Comitê realizou uma pesquisa pioneira com as famílias dos adolescentes vitimas de homicídios em sete cidades do Estado e chegou a um conjunto de evidências que expõem adolescentes às dinâmicas da violência e os tornam vulneráveis aos homicídios. O trabalho do Comitê, pelo rigor técnico de suas pesquisas e pela agenda de orientações às políticas públicas que conseguiu construir pelo diálogo interinstitucional e pela observação das indicações empíricas que colheu, ganhou notoriedade pública nacional. Uma das evidências encontradas é exatamente, na dimensão comunitária, a alto exposição de adolescentes às armas, o acesso facilitado, seja através de parentes e/ou amigos. Isto posto, uma das recomendações do Comitê é que se organizem medidas de controle de armas e munição como forma de interferir material e culturalmente nas estruturas que erigem a sociabilidade e a conflitualidade armadas. Uma das eficiências levantadas pelo comitê aponta que as armas de fogo têm importância fundamental no incremento das mortes de adolescentes. Em Fortaleza o meio utilizado para os homicídios de 94% dos adolescentes, em 2015, foi arma de fogo. Com isso foi elaborada a recomendação número 10, publicado no relatório Cada Vida Importa que tratou sobre o controle de armas de fogo e munições.

No Ceará, em 2017, pelos dados da Secretaria de Segurança e Defesa Social, foram mais de 63.203 crimes violentos ao patrimônio, sem restrição de liberdade das vítimas, e outros 12.844 crimes violentos letais que envolvem restrição de liberdade das vítimas. Grandes partes das ocorrências se apoiaram no uso de armas de fogo para constranger e infligir ameaça às vitimas.

No Estado segundo noticiado pelo último anuário do Fórum Brasileiro de Segurança houve um aumento de mais de 25% no número de armas apreendidas no Estado atingindo em 2017 o número de 6.929 armas de fogo apreendidas pelas forças estaduais. O perfil da arma do Estado, segundo o relatório recém-lançado do Instituto Sou da Paz (“De onde vêm as armas do crime apreendidas Nordeste”) apontam que a arma que gera violência no Estado é curta (3 em cada 4), 78% são de calibre permitido e 80% tem fabricação nacional. Avançar no controle de armas no Estado significa ter mais diagnósticos deste tipo permitindo um combate mais forte ao tráfico ilícito.

O projeto ao traçar procedimentos obrigatórios relacionados a arma apreendida (tanto para melhorar a guarda) quanto para trazer melhor diagnóstico sobre seu perfil e estimular a investigação das fontes de fornecimento de armas para o crime contribuirá em muito para redução da violência armada no estado.

Todos os documentos das organizações da sociedade civil que pesquisam a temática no Brasil e no mundo, assim como os centros acadêmicos especializados em segurança pública, bem como as políticas públicas que se desenharam na área apontam para a necessidade de redução da circulação das armas de fogo e munição, que passam, a um só tempo, por estratégias de registro e controle, como por ações de sensibilização pública capazes de atingir a significação da população sobre a eficácia do uso de armas de fogo pelos civis para encarar os problemas de segurança pública. A desregulamentação e o descontrole contribuem para o atual estado de coisas visto pelos crimes violentos.

No documento Mapa da Violência 2016, estima-se que 133 mil mortes tenham sido evitadas pelo advento do Estatuto do Desarmamento e seus mecanismos de controle de armas e munição. Os pesquisadores se concentraram no ritmo de crescimento das taxas de homicídios por arma de fogo no período anterior e posterior ao Estatuto, comparando expectativas pelo histórico das taxas.

A presente proposição foi inspirada em outras iniciativas existentes nos estados brasileiros, como o Projeto de Lei 2966/2017 aprovado no Rio de Janeiro e os atos administrativos no Estado do Pernambuco sobre a custódia de armas.

No estado nordestino, a Portaria GAB/SDS (Gabinete/Secretaria de Defesa Social) n. 966, de 2011, marco no controle de armas do estado, criou o Número de Identificação de Arma de Fogo (Niaf), a ser gerido pela Coordenação de Operações de Recursos Especiais (Core), força operacional da Polícia Civil. Posteriormente, a Instrução Normativa no 01/2012 detalhou regras, responsabilidades, procedimentos, documentos e ações.

O Sistema Niaf nasce a partir do diagnóstico de que a cadeia de custódia das armas estava fragilizada sob dois aspectos principais. De um lado, as informações sobre a arma ao longo de seu fluxo estavam fragmentadas (ou seja a arma pode receber uma série de números em seu percurso, especialmente caso se trate de uma arma de numeração suprimida, o que dificulta sua rastreabilidade e prevenção de desvios). De outro lado, seu fluxo era lento e armazenamento não era seguro, dada a alta incidência de roubo a depósitos judiciais.

O Niaf é o número identificador da arma, que deverá acompanhá-la ao longo de toda a cadeia de custódia. Foi criado, portanto, um novo protocolo, que permitiu centralizar as informações sobre a totalidade das armas de fogo apreendidas no estado. Conforme a Portaria citada, isso surge da “necessidade de garantir que a arma apreendida seja a mesma que chega à Justiça, protegida de toda e qualquer forma de contaminação, degradação e/ou adulteração, bem como troca ou substituição, por descuido ou dolo”.

Esse número está acoplado ao Lacre Niaf, que se destina a garantir o controle da arma ao longo de seu fluxo, bem como a identificação da área em que a arma foi apreendida. Os lacres são identificados por um sistema de cores e por uma sequência numérica específica, aos quais correspondem regiões do estado ou órgãos especializados da Polícia Civil. Assim, para cada região de Pernambuco, chamada de Área Integrada de Segurança (AIS)27, há um número e uma cor. Isso também vale para os órgãos especializados da Polícia Civil, incluindo o Instituto de Criminalística e a própria Core.

O Lacre Niaf, semelhante ao utilizado em placas veiculares, é inviolável e não deve ser retirado até que a arma seja destruída. Para garantir a centralização da informação referente à arma, a Instrução Normativa confere grande poder à Core. Assim, lacres rompidos devem ser devolvidos à Core, sendo proibido seu descarte pela delegacia. Da mesma forma, em caso de extravio ou roubo, o delegado de polícia deve remeter expediente circunstanciado à Core, detalhando os sequenciais desse lacre. Por fim, a requisição de novos lacres deve ser feita diretamente à Core. Esses lacres só podem ser utilizados pela delegacia solicitante, não podendo ser cedidos ou emprestados, até mesmo porque os números sequenciais são atribuídos no sistema a uma unidade específica.

Para as situações em que impossibilidade técnica ou insegurança na fixação impeçam o uso do lacre Niaf, existe o Envelope de Segurança Niaf. Trata-se de um envelope plástico espesso, dotado de um sistema de fechamento do tipo lacre inviolável e com número sequencial único28. Uma de suas faces permite o preenchimento de campos específicos relativos à arma, bem como um “recibo” destacável, que pode funcionar como comprovante de entrega. Os mesmos procedimentos referentes ao lacre valem também para o envelope.

Para o funcionamento desse sistema, atribui-se importante papel ao delegado de Polícia Civil, pois ele é o responsável por dar início a esse sistema de controle da arma apreendida. Qualquer falha na produção da informação Niaf, como a fixação de um número ou cor errados, compromete toda a cadeia de controle. Além da colocação do lacre com o número Niaf, o delegado deve lançar a ocorrência no sistema eletrônico da Polícia Civil, embora o mesmo não esteja integrado com outros órgãos. Vale destacar que está sendo desenvolvido um sistema eletrônico online, por meio do qual todas as delegacias informarão em tempo real as apreensões conforme as lançarem no sistema.

Os altos índices de roubo a fóruns revelam outra fragilidade da cadeia de custódia das armas. Para combater esse problema, a Secretaria de Defesa Social levou a cabo uma das principais inovações observadas na pesquisa: a criação do Núcleo de Identificação da Arma de Fogo (Niaf), ligado à Core.

Esse Núcleo não é apenas o órgão gestor do Sistema Niaf, mas também único depósito permanente de armas do estado inteiro. Assim, diferentemente dos outros estados, cujas armas seguem, na maior parte dos casos, para os fóruns, no caso de Pernambuco a guarda das armas não passa mais pelo Poder Judiciário, assim circula menos e tem seu caminho encurtado possibilitando melhorar a guarda e acelerar a destruição..

Portanto, dada a situação enfrentada pelo Ceará e todas as observações e recomendações especializadas que se dirigem aos poderes públicos, é fundamental que o Estado possua uma política estadual de controle de armas e munição, estabelecendo estratégias e diretrizes que concorram para diminuição do atual quadro de descontrole e oportunizem as agências de segurança maior controle e gestão de informações.

DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

Importante desde logo destacar que a iniciativa ora proposta tem o objetivo de estabelecer procedimentos a serem seguidos em nível estadual para um efetivo controle das armas de fogo no território cearense, de maneira que o texto da proposição não se contrapõe à legislação federal vigente, em especial a Lei nº 10.826/2003, pelo contrário, visa dotar o Estado do Ceará de uma legislação que venha a contribuir com a redução da violência cometida por armas de fogo, através de um controle a ser exercido pelos órgãos estaduais, dentro das suas atribuições institucionais já definidas por legislação própria.

O presente projeto de lei segue as diretrizes do Decreto Federal n.º 5.941, de 26 de outubro de 2006, que Promulga o Protocolo contra a Fabricação e o Tráfico Ilícito de Armas de Fogo, suas Peças, Componentes e Munições.

No mesmo sentido, vale ressaltar as diretrizes do Decreto Federal n.º5.123, de 1 de julho de 2004, que dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema Nacional de Armas - SINARM e define crimes.

Também é importante destacar que o controle efetivo de armas de fogo no Estado do Ceará faz parte das recomendações do Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na adolescência, sendo a recomendação de número 10.

É forçoso reconhecer a necessidade de se promover um efetivo controle das armas de fogo apreendidas pelas polícias, com uma eficiente cadeia de custódia, bem como a necessidade de garantir que a arma apreendida seja a mesma que chega à Justiça, protegida de toda e qualquer forma de contaminação, degradação e/ou adulteração, bem como troca ou substituição, por descuido ou dolo.

Trata-se de medida fundamental também o mapeamento das áreas com incidências relevantes de apreensões, como forma de prevenir ações da criminalidade e garantir às futuras gerações uma política de segurança mais eficaz e uma sociedade menos violenta;

Muitas armas que são apreendidas acabam por voltar para o mercado ilegal da criminalidade sem que sejam devidamente apuradas as responsabilidades. O tráfico de armas existe. É atividade perniciosa, que além de aumentar enormemente o nível de insegurança para a população, também gera graves problemas e relevantes prejuízos para o Estado. Material bélico que entram no mercado legalmente, sejam armas ou munições, acabam sendo utilizados para a prática de crimes, por quadrilhas e bandos no tráfico de drogas, em homicídios, em roubos e outros. E, como que anestesiada, a população quase se demonstra acostumada a ouvir nos noticiários casos de crimes cometidos por estes bandos armados.

Faz-se necessário e urgente, portanto, o combate, imediato, permanente e vigoroso a esse panorama criminoso, pois os números ainda são alarmantes, e demandam apuração urgente e criteriosa de responsabilidades. Diante do cenário apresentado, não pode o Poder Legislativo manter-se omisso.

Este projeto de lei objetiva criar mecanismos que visem diminuir e até mesmo evitar a circulação ilegal de armas, e também o desaparecimento, extravio, furto, roubo de armas, munições e explosivos no âmbito da responsabilidade da Secretaria de Estado de Segurança Pública e as que estão sob a custódia do Poder Judiciário, nos Fóruns da Justiça Estadual nos Municípios, apurar o controle, além de apontar os instrumentos que apurem as responsabilidades.

Não há dúvida de que a ausência de responsabilização é um dos fatores que alimenta e garante a continuidade deste crime e de todos os outros. Assim, a criação deste Projeto de Lei faz-se imprescindível no que tange à investigações e apurações e seus respectivos desdobramentos.

Por estas razões, requeremos aos Deputados e Deputadas Estaduais desta Casa o apoio e o voto favorável à presente proposição.

Sala das Sessões, 28 de Agosto de 2018.

 

RENATO ROSENO

DEPUTADO