PROJETO DE LEI N.º 131/16

 

 

DISPÕE SOBRE A SUPERLOTAÇÃO EM UNIDADES DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO, NO ÂMBITO DO ESTADO DO CEARÁ, E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.

 

A Assembleia Legislativa do Estado do Ceará decreta:

 

Art. 1º. As unidades de atendimento socioeducativo em funcionamento no Estado do Ceará não poderão exceder o percentual de 20% (vinte por cento) de sua capacidade técnica de lotação.

 

§1º. O percentual a que se refere o caput somente será aplicado caso não haja unidade em que a capacidade de lotação não tenha sido excedida, tendo esta prevalência para o recebimento do excesso das demais unidades, respeitadas as peculiaridades do caso concreto e a legislação penal atinente.

 

§2º. Para o caso de todas as unidades competentes para o recebimento do menor infrator estarem com excesso de internos, o remanejamento deve ser feito de modo a possibilitar o menor percentual de sobrelotação.

 

Art. 2º. Em nenhuma hipótese o gestor será obrigado a acolher, no interior das unidades socioeducativas, menores infratores em percentual que exceda o estabelecido no caput do art. 1º ou mesmo sofrerá sanção quando seus atos estiverem concordes com a presente Lei.

 

Art. 3º. Lei complementar regulamentará a presente Lei, estabelecendo as penalidades administrativas e/ou civis a serem aplicadas em caso de descumprimento do disposto no art. 1º, a organização das unidades diante da demanda por vagas, a forma como será realizado o remanejamento de menores infratores entre as unidades e a criação de instrumentos ou meios alternativos para controle da superlotação e para o recebimento dos menores que carecem por vagas em alguma unidade.

 

Art. 4º. Fica estabelecido o prazo de 365 (trezentos e sessenta e cinco) dias para que as unidades definidas no art. 1º se adéquem às disposições desta Lei.

 

Art. 5º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

 

Sala das Sessões da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, em 09 de junho de 2016.

 

CARLOS MATOS

DEPUTADO

 

 

JUSTIFICATIVA:

 

A proposta busca limitar a famigerada superlotação das unidades socioeducativas cearenses. De início, vale salientar que a aplicação de uma pena a um infrator tem dois vieses: um a curto prazo e outro a longo prazo. A curto prazo, tem-se o caráter punitivo da pena, que busca sancionar o infrator penalmente por ocasião do ilícito cometido. A longo prazo, tem-se o principal objetivo almejado pelas medidas socioeducativas, de que a unidade socioeducativa seja um ambiente que vise a ressocialização do menor infrator, a sua adaptação à vida em sociedade, servindo a lei como válvula para a concretização da eficiência deste objetivo. Para se tornar efetiva a ressocialização do transgressor da lei, deve-se ter um trabalho mais minucioso, mais humano, que verdadeiramente reestabeleça a sociabilidade no jovem infrator.

 

Ao se colocar um jovem em um estabelecimento superlotado, além de claramente ferir os seus mais básicos direitos garantidos no art. 5º da Constituição Federal de 1988, propicia uma perpetuação de um sentimento de revolta com relação ao sistema e à sociedade, do revanchismo, não sendo um meio saudável para a construção da sociabilidade. 

 

A superlotação das unidades socioeducativas tem se demonstrado uma constante em nosso Estado e ineficazes são as normas que visam uma mudança desse quadro, sendo o vetor para a exacerbação da superlotação e das inúmeras rebeliões no interior das unidades e favorecendo a aproximação de detentos menos perigosos com os demais, dificultando o distanciamento destes do mundo do crime.

 

A crise do Sistema Socioeducativo tem chegado a níveis alarmantes, tendo sido realizadas diversas denúncias de más condições e maus-tratos, o que tem eclodido em rebeliões e fugas. Segundo o juiz da 5ª Vara da Infância e Juventude, o número de adolescentes que fugiram de centros de internação somente este ano já chega a cerca de 340. O dado se equipara à soma de fugas de 2014 e 2015, que registraram 150 e 200 internos fugitivos, respectivamente.

 

A situação levou o Brasil a ser notificado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), por ocasião da crise cearense. No entanto, deve-se ter em mente que o descontrole decorre em parte da superlotação das unidades de internação.

 

A grande pressão social interligada às decisões judiciais têm obrigado o Estado a abrigar os menores infratores em números que ultrapassam a barreira do aceitável. Ao se limitar em 20% (vinte por cento) a sobrelotação, propiciará a busca por meios e instrumentos alternativos para atender à demanda de interesse de toda a coletividade. Não se trata de favorecimento da impunidade, se trata da garantia das condições humanas mínimas como fator de ressocialização. A superlotação tem favorecido a uma geração de internos revoltados, que saem das unidades com um sentimento de repulsa ainda maior para com a sociedade.

 

Cumpre salientar que a lei ora posta não fere as regras constitucionais de competência, já que não rege sobre matéria penal, mas tão somente sobre as condições de instituições socieducati mantidas pelo Governo do Estado do Ceará, sendo matéria de clara competência estadual. Ademais, trata-se de matéria que não gera qualquer ônus para o Estado ou mesmo que mexa com as competências privativas do Poder Executivo, não alterando a estrutura ou o funcionamento de qualquer órgão ou instituição, apenas se busca estabelecer um percentual limitador da superlotação, deixando para Lei Complementar a regulamentação aprofundada da matéria.

 

CARLOS MATOS

DEPUTADO