PROJETO DE LEI N.º 203/15

 

DISPÕE SOBRE AS PENALIDADES AS CONCESSIONÁRIAS DE SERVIÇOS PÚBLICOS EM CASO DE COBRANÇAS IRREGULARES NAS RELAÇÕES DE CONSUMO E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ decreta:

Art. 1º Ficam as concessionárias de serviços públicos, nas relações de consumo em que se verificar cobrança indevida a maior por parte do fornecedor, obrigados a efetuar o imediato ajuste na próxima fatura.

§1º Na desobediência do previsto no caput, o fornecedor sofrerá a norma disciplinada no artigo 42, parágrafo único da Lei Federal nº 8.078/1990 e deverá realizar o ressarcimento em dobro na primeira fatura cobrada após a fatura que deveria ter sido efetuado o ajuste.

§2º. Na hipótese de inexistência de nova cobrança em face desse consumidor, o fornecedor deverá depositar o valor cobrado e pago indevidamente pelo consumidor em conta corrente por ele indicada, em até 30 dias corridos a partir da verificação da irregularidade da cobrança.

§3º Fica proibida a suspensão ou interrupção do serviço prestado, até que venha a resolução da cobrança.

Art. 2º Para efeitos desta Lei considera-se cobrança indevida: qualquer valor cobrado e pago pelo consumidor que esteja em desacordo com a oferta anunciada, com o contrato pactuado, ou com as demais normas de proteção ao consumidor.

Art. 3° A data de vencimento da nova fatura, após a sua regularização, deverá ser, no minímo, de 5 (cinco) dias úteis após a data da regularidade da cobrança.

Art. 4º O não cumprimento do disposto nesta Lei acarretará ao fornecedor as sanções previstas no artigo 56 da Lei Federal nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), aplicáveis na forma de seus artigos 57 a 60.

Art. 5º A fiscalização da aplicação da presente lei ficará a cargo das respectivas agências reguladoras, ARCE - Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados do Estado do Ceará, ANATEL – Agência Nacional de Telecomunicação e ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica.

Art. 6º Esta Lei entra em vigor no prazo de 30 (trinta) dias após a data de sua publicação.

 

 

JUSTIFICATIVA

A Constituição Federal de 1988, também conhecida como Constituição Cidadã, dentre outros avanços, veio acatar reivindicações da população e reconheceu como um dos direitos e garantias fundamentais a defesa do consumidor. Dessa forma, trouxe no seu artigo 170 os princípios gerais da atividade econômica, dentre os quais a defesa do consumidor.

Para alcançar os objetivos contidos na Constituição, foi sancionada a Lei 8.078/90, que ficou conhecida como Código de Defesa do Consumidor (CDC). Esse instrumento legal veio, conforme dispõe seu artigo 1º, estabelecer normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, além de reconhecer a vulnerabilidade do consumidor frente ao mercado de consumo.

Assim, como forma de garantir o cumprimento da legislação, estabeleceu-se uma série de regras e princípios a serem observados por todos os fornecedores do mercado de consumo. Decorridas quase duas décadas de vigência da Lei 8.078/90, verifica-se que, na prática, muitos segmentos deixam de dar pronto atendimento e solução para os problemas originados da contração de serviços ou aquisição de produtos no mercado de consumo.

É sabido que muitas empresas não tratam o consumidor com o devido respeito, optando por cobrar valores duvidosos já sabendo que estes serão questionados pelos consumidores. Com tal prática, esses “maus fornecedores” ganham duplamente: muitos consumidores não percebem o erro e pagam esses valores cobrados indevidamente, sem questionar; enquanto que os outros que percebem o erro enfrentam longas chamadas telefônicas, atendentes de telemarketing mal educados e despreparados, para, no fim, ouvirem que de fato a cobrança é indevida e que será gerado um crédito ao consumidor em faturas vindouras.

Veja-se o exemplo dos Programas de Proteção e Defesa do Consumidor (Procons) que acabaram por se transformar em verdadeiros “balcões de atendimento” das empresas fornecedoras no intuito de ganhar tempo e criar mecanismos para que o consumidor desista de seus direitos.

Com esta propositura, pretende-se desencorajar fornecedores de má conduta a atribuírem valores indevidos aos consumidores, pois, caso o façam,  deverão imediatamente proceder com o ajuste da fatura, ou seja, gerar nova ordem de cobrança apenas com os valores efetivamente devidos, ou na impossibilidade disso – nas hipóteses de débito automático, ou de o consumidor já ter efetuado o pagamento enquanto se apurava se tais valores eram ou não devidos – a obrigatoriedade de devolver o valor em dobro, acrescido de multa e juros.

Essa é a grande inovação trazida pela presente norma. Muitas empresas incluem nas cobranças valores irregulares, seja de produtos ou serviços não prestados, descontos oferecidos e não aplicados, ou até mesmo formas de pagamento diferenciadas (parcelamento, por exemplo) que não são depois observadas, pois sabem que na vida corrida que se tem hoje em dia muitos consumidores não checam suas faturas, ou se o fazem, não lembram de todos os detalhes da compra, com as várias nomenclaturas diferentes usadas pelas empresas.

Assim, agem de má fé incutindo ao consumidor o ônus do pagamento de algo indevido, e havendo reclamação por parte do consumidor, prontamente se dispõe a devolver o valor na próxima cobrança. Então, o consumidor é obrigado a dispor da quantia agora, para reavê-la no futuro, caso não queira ver o serviço interrompido ou suspenso.

Isso porque, mesmo sendo esse valor indevido, se não fosse pago pelo consumidor, este teria que responder pela multa e juros incidentes sobre toda a fatura. Ora, receber quantia sem justificativa é, no mínimo, enriquecimento sem causa. A devolução deve ocorrer, mas não é o suficiente, ela deve ocorrer acrescida das verbas punitivas previstas na contratação.

Erros acontecem, e todos estamos sujeitos a eles. Nem todos fornecedores agem de má fé, mas não pode o consumidor arcar com a incompetência alheia, em virtude da responsabilidade objetiva que recaem sobre eles, a não ser em caso de engano justificável, quando a devolução se dá de forma simples.

Ademais, basta que o fornecedor tenha um serviço eficiente de comunicação com seus clientes, seja por meio do SAC, Ouvidoria, Fale Conosco ou outra forma, para corrigir as cobranças indevidas, e gerar nova guia de cobrança – ajustada conforme preconiza a lei – que não terá nenhum ônus. Do contrário, devolverá ao consumidor, caso o pagamento tenha sido efetuado por este, o que receberia caso o mesmo não o tivesse quitado em dia sua dívida, indevida, diga-se de passagem.

Uma breve consulta aos cadastros de reclamações fundamentadas desde a vigência do CDC fortalece a proposta. A referência histórica nos aponta para fornecedores contumazes em sua conduta negativa no mercado de consumo. Reiteradamente são relacionados fornecedores que se revezam entre as primeiras posições em quantidade de reclamações.

É certo que a edição de normas de proteção ao consumidor inclui-se dentre as competências concorrentes do Estado-Membro. Essa competência, contudo, não pode ser exercida de forma a contrapor-se à legislação federal, sob pena de inconstitucionalidade, como bem pontuado pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (ADIs nºs 3.035, Rel. Min. Gilmar Mendes e 3645, Rel. Min. Ellen Gracie).

Nessa perspectiva, torna-se evidente que a intervenção na forma pretendida traduz manifesta constitucionalidade, atendendo, assim, aos anseios da população (consumidor) em ver seus direitos respeitados.

AUDIC MOTA

DEPUTADO