PROJETO DE LEI N.º 177/15
“ Institui, no âmbito do Estado do Ceará, o Cadastro Para o Bloqueio do Recebimento de Ligações de Telemarketing, conforme especifica. “
A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ DECRETA:
Art. 1º. Fica instituído no âmbito do Estado do Ceará, o Cadastro Para o Bloqueio do Recebimento de Ligações de Telemarketing.
Parágrafo único. O cadastro tem por objetivo impedir que as empresas de telemarketing ou estabelecimentos que se utilizem deste serviço, inclusive os institutos de pesquisa, efetuem ligações telefônicas, não autorizadas, para os usuários nele inscritos.
Art. 2º. Compete ao PROCON/CE implantar, gerenciar e divulgar aos interessados o cadastro, a partir da publicação desta lei, bem como criar os mecanismos necessários à sua implementação.
Art. 3º. O titular de linha telefônica que não deseje receber ligações de telemarketing poderá inscrever o respectivo número no cadastro que observará o disposto nesta lei.
Art. 4º. A partir de 30° (trigésimo) dia da inscrição, as empresas de telemarketing, os estabelecimentos que se utilizarem desse serviço ou as pessoas físicas contratadas com tal propósito não poderão efetuar ligações telefônicas direcionadas ao correspondente número, salvo se comprovarem a existência de prévia autorização do titular da linha.
Art. 5º. O PROCON/CE disponibilizará para as empresas a lista de usuários do cadastro a que se refere o texto, discriminando o nome, número do telefone e data da inscrição.
Art. 6º. O cadastro será feito pessoalmente, via internet, ou por telefone disponibilizado pelo PROCON/ CE que regulamentará as formas de inscrição.
Art. 7º. A inscrição no cadastro será realizada mediante os meios descritos no artigo anterior. No ato da inscrição o usuário deverá fornecer as seguintes informações:
I - nome;
II - número do RG;
III - CPF;
IV - endereço;
V - CEP;
VI - telefone a ser cadastrado;
§ 1°. O usuário poderá cadastrar somente linhas telefônicas registradas em seu nome.
§ 2°. Incluem-se, nas disposições desta lei, os telefones fixos e os aparelhos de telefonia móvel em geral.
§ 3°. A qualquer momento o usuário poderá solicitar o seu desligamento do cadastro.
§ 4°. O usuário que receber ligações após os 30 (trinta) dias da data do ingresso no cadastro deverá registrar ocorrência do fato, junto ao PROCON/CE, informando o dia, horário, nome do atendente e da empresa prestadora do serviço, a fim de que sejam tomadas as medidas cabíveis.
Art. 8º Independentemente da
inscrição prévia no cadastro, as empresas de telemarketing não poderão efetuar
o contato telefônico com o cliente fora do horário comercial.
§ 1°. A expressão ‘empresas de telemarketing’ engloba, também, as empresas de cobrança que se utilizam desse serviço, bem como os demais estabelecimentos que efetuem suas atividades empresariais através do telefone.
§ 2°. O horário comercial para o disposto nessa lei compreende o período das 08h às 18 horas em dias de semana, e das 08h às 13horas aos sábados.
Art. 9º. Não se aplicam os dispositivos da presente lei às entidades filantrópicas que utilizem telemarketing para angariar recursos próprios.
Art. 10º. O descumprimento das obrigações estabelecidas na presente lei sujeitará o infrator às sanções administrativas previstas no artigo 56 da Lei Federal n° 8.078, de 11 de setembro de 1990.
Art. 11. Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação.
Justificativa:
O projeto em apreço justifica-se pela necessidade de garantir a proteção do consumidor diante da reiterada prática empresarial de oferecer diversos serviços e realizar cobranças via ligações telefônicas. A prática de telemarketing já extrapola os limites do aceitável e, muitas vezes, torna-se abusiva, violando os direitos à privacidade, tranqüilidade e publicidade não agressiva ou abusiva.
Se, de forma geral, a prática incomoda a um público difuso de consumidores, é também verdade que ela atinge mais gravemente grupos sociais específicos, como famílias com idosos, crianças, pessoas adoentadas e que precisam de tranqüilidade em suas residências.
Merece, portanto, a intervenção do Estado na livre iniciativa para regular as práticas de mercado e garantir os direitos fundamentais dos consumidores. Necessária, portanto, a produção legislativa para regulamentar o uso adequado e razoável dos mecanismos de propaganda, dando, ao consumidor, a opção de recebê-las ou não via telemarketing.
Sobre a defesa do consumidor, a Constituição Federal traz, no rol dos direitos fundamentais do artigo 5º, a promoção da defesa do consumidor., quando seu inciso XXXII afirma que “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”.
O art.170, ao tratar da ordem econômica, também garante que:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
V - defesa do consumidor;
O código de defesa do consumidor, por sua vez, afirma que:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;
Do exposto, percebe-se a pertinência e possibilidade jurídica de se interceder na ordem econômica para garantia de direitos fundamentais.
No que tange à competência estadual para disciplinar a matéria, a Constituição Federal é clara ao estabelecer que:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
V - produção e consumo;
VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;
A Constituição do Estado do Ceará também afirma que:
Art. 16. O Estado legislará concorrentemente, nos termos do art. 24 da Constituição da República, sobre:
VIII – responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;
Trata-se, portanto, de competência legislativa concorrente, na qual cabe à União editar normas gerais (o que o fez com a Lei Federal 8.078/90) e aos Estados editarem normas específicas e suplementares. Saliente-se que o §2º do art.24 da Constituição Federal prever que “A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados”.
Os limites à competência suplementar dos Estados são que:
Não exista vedação constitucional para que o Estado regulamente aquela matéria.
Não contrarie as normas gerais da legislação federal sobre o assunto.
O projeto em apreço não viola nenhum destes limites, tanto porque não há vedação para que o Estado legisle sobre a matéria, como porque o presente projeto se compatibiliza perfeitamente com as normas do Código de Defesa do Consumidor, principalmente em relação ao supracitado art.6º, IV.
Já em relação à iniciativa legislativa, observa-se que o tema disciplinado não colide com o art. 60, §2º da Constituição Estadual. Sob seu teor:
Art. 60. Cabe a iniciativa de leis:
§2º São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que disponham sobre:
c) criação, organização, estruturação e competências das Secretarias de Estado, órgãos e entidades da administração pública direta e indireta, concessão, permissão, autorização, delegação e outorga de serviços públicos;
No caso em apreço, cumpre observar que o projeto não dispõe sobre a organização e funcionamento da administração pública estadual. O projeto limita-se a vedar uma prática empresarial, regulamentando o comportamento de administrados, de empresas privadas, acerca da metodologia de propaganda utilizada.
José Afonso da Silva define a Administração Pública sob dois sentidos: o objetivo e o subjetivo. Sob o aspecto subjetivo, ela consiste no “conjunto de agentes, órgãos e pessoas jurídicas que tenham a incumbêmcia de editar as atividades administrativas” (SILVA, 2007, p.11). Sob o aspecto objetivo, a administração é a própria função administrativa, ou seja “aquela exercida pelo Estado ou por seus delegados, subjacentemente à ordem constitucional e legal, sob regime de direito público, com vistas a alcançar os fins colimados pela ordem jurídica” (SILVA, 2007, p.04). O autor afirma, ainda, que a função administrativa é aquela residual em relação às funções jurisdicional e legislativa.
No projeto em apreço não se disciplinou acerca de nenhuma das dimensões, objetiva ou subjetiva, que compõem a administração. Não redesenha a estrutura dos órgãos da Administração, tampouco lhes confere atribuições inéditas, inovando na organização funcional. Nada dispõe acerca do funcionalismo público, da estrutura administrativa, das competências e atribuições, do orçamento ou modelo de gestão, tampouco cria cargos ou exorbita das atividades já previstas em quaisquer das Secretarias. As atribuições conferidas ao Procon serão, futuramente, regulamentadas pelo órgão.
Repita-se que o objeto do projeto consiste em coibir comportamento dos administrados, criando norma que regulamenta a propaganda abusiva e os direitos dos consumidores.
Corroborando o exposto, tanto no sentido da viabilidade da iniciativa do legislativo, como da competência estadual para regular a matéria, vale destacar a Lei 13.226/2008 do Estado de São Paulo e a Lei 16.135/2009 do Estado do Paraná, que, por iniciativa do Poder Legislativo, também instituíram cadastro similar. No Estado de Minas Gerais também já se proibiram as ligações telefônicas fora do horário comercial. Trata-se, portanto, de assunto que já vem sendo objeto de atenção em diversos ouros estados brasileiros.
RENATO ROSENO
DEPUTADO