PROJETO DE INDICAÇÃO N.º 34/2012.

 

Institui o Programa Estadual de Combate à Especulação Financeira Prejudicial ao básico do mínimo existencial do servidor com baixa remuneração e sua família, preventivo ao adoecimento de servidores em situação de grave endividamento, com efeitos do inciso III do Art. 1º, do inciso IV do Art. 7º e do § 3º do Art. 39 da Constituição Federal, dos incisos II, XIII, do Art. 14, do inciso X do Art. 50 e do Art. 214 da Constituição Estadual, e dá outras providências.

 

A Assembléia Legislativa indica:

 

Art. 1º. Fica instituído o Programa Estadual de Combate à Especulação Financeira Prejudicial ao Básico do Mínimo Existencial do Servidor com baixa remuneração e sua família.

 

Art. 2º. Este programa autoriza o Estado do Ceará a adotar medidas administrativas interventivas dentro de sua função distributiva e estabilizadora na microeconomia regional, para socorrer servidores situados em baixa faixa remuneratória que se encontram gravemente endividados, de modo a assegurar-lhes o básico do mínimo existencial, segundo previsto no inciso IV do Art.7º da Constituição Federal.

 

Art. 3º. Para efeitos desta Lei, compreende-se como servidor gravemente endividado aquele cuja remuneração é baixa, sendo sua única renda e que vem sendo consumida em sua totalidade ou quase totalidade para pagamento de dívidas decorrentes de operações de crédito pessoal feitas com lastro na remuneração mensal que lhe é paga pelo Estado do Ceará, tais como: consignações, crédito direto ao consumidor, renegociação ou renovação destas dívidas, de maneira a comprometer o básico do mínimo existencial para o próprio servidor e sua família, em prejuízo de sua dignidade humana, familiar, social e econômica.

 

Art. 4º. Grave endividamento é a situação que priva o servidor e seus familiares do básico do mínimo existencial, através do comprometimento do caráter alimentar de sua remuneração para pagamento de dívidas decorrentes de operações de crédito pessoal, de maneira a levá-lo ao desequilíbrio pessoal, familiar, social, profissional e econômico, trazendo-lhe inadimplência, insolvência, descrédito público, que possa levá-lo a praticar ilícitos penais, civis e administrativos, a adoecer e mesmo a praticar o suicídio.

 

Art. 5º. Baixa faixa remuneratória é aquela situada entre a remuneração mínima estadual até o triplo desta, bem como aquela que sendo superior, ainda não atinja o valor definido como o ideal para alcance do mínimo existencial previsto no inciso IV do Art.7º da Constituição Federal pelo trabalhador e sua família, valor este definido segundo pesquisas de órgãos e entidades voltadas a pesquisas econômicas e sociais, trabalho, emprego, renda, salário, custo de vida.

 

Art. 6º. O Estado do Ceará poderá assumir: Cem por cento (100%) do montante da dívida, para os servidores que recebam a remuneração mínima estadual, assim definida em lei própria;

 

I- Setenta e cinco por cento (75%) do montante da dívida, para os servidores que recebam remuneração cujo valor equivalha até o dobro da remuneração mínima estadual;

II- Cinqüenta por cento (50%) do montante da dívida, para os servidores que recebam remuneração cujo valor equivalha até o triplo da remuneração mínima estadual;

III- Até vinte e cinco por cento (25%) do montante da dívida nos demais casos.

 

Art.7° - O servidor endividado interessado na assunção de sua dívida pelo Estado do Ceará formulará requerimento ao Governador, cuja tramitação observará o disposto no art.7º da Constituição Estadual.

 

§ 1º. Tendo em vista o disposto no § 2º do Art.7º e no § 1º do Art. 84 da Constituição Estadual, no inciso LXXVIII do Art. 5º e no Art. 37 da Constituição Federal e no § 1º do Art.143 da Lei 9.286/74, a análise desses pedidos poderá ser delegada ao Vice Governador, podendo o servidor pedir reconsideração e ainda recorrer ao Governador em caso de indeferimento do pleito.

 

§ 2º. O requerimento será instruído com:

 

I- Exposição do(s) motivo(s) onde constem as razões que o levaram ao endividamento;

II- Cópia do último contracheque;

III- Cópia do extrato da conta bancária com os valores de débitos lançados para descontos de parcelas de dívidas de crédito direto ao consumidor;

IV- Cópia(s) do(s) contrato(s) ou outro(s) documento(s) comprobatório(s) da(s) operação de crédito ou das operações de créditos contraídas pelo servidor com instituição ou instituições financeiras;

V- Histórico da(s) dívida(s) fornecido(s) pela instituição financeira;

VI- Declaração de órgão ou entidade de caráter oficial ou social dedicada à defesa do consumidor ou a estudos econômicos, quanto à hipossuficiência econômica do servidor para arcar com o pagamento da(s) dívida(s) contraídas, sem que haja prejuízo de uma o seu sustento e de sua família de acordo com o mínimo existencial previsto no inciso IV do art.7º da Constituição Federal;

VII- A relação dos dependentes econômicos do servidor, quando houver, acompanhada da respectiva certidão de nascimento;

VIII- Comprovantes de despesas do servidor para atender suas necessidades vitais básicas e de sua família, tais como serviços de água e esgoto, energia elétrica, comunicação, moradia, alimentação, educação, cultura, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte, previdência social.

IX- Outros documentos que o servidor requerente entenda que possam facilitar a aferição de suas condições pessoais e familiares, para enquadramento nas disposições previstas nos artigos 1º ao 5º desta Lei, sem prejuízo do atendimento de exigência de outros documentos que lhe sejam solicitados pela autoridade.

 

§ 3º. Poderão ser determinadas diligências, principalmente de cunho sócio-econômico, para formação do convencimento de que as situações fáticas alegadas pelo servidor endividado em seu requerimento realmente se enquadram nas hipóteses previstas nesta Lei, além doutras diligências necessárias à instrução do feito.

 

Art. 8º. A assunção da dívida pelo Estado do Ceará poderá ser precedida de audiência pública e ficar condicionada:

 

I- ao compromisso do servidor em restituir ao erário estadual os valores efetivamente despendidos em razão da assunção dívida, se, após a assunção da obrigação, houver expressiva recuperação da capacidade econômica, financeira do servidor, permitindo-lhe a solvência dos compromissos assumidos com terceiros, observado o disposto no art.884 do Código Civil e o prazo prescricional de obrigações com a Fazenda Pública;

II- à participação do servidor beneficiário em cursos, palestras, simpósios, seminários e outras atividades relacionadas à organização das finanças pessoais, economia doméstica, programação e execução de despesas pessoais e familiares;

III- ao compromisso do servidor beneficiário de não contrair novas operações de crédito durante certo período, na forma de empréstimo consignável ou crédito direto ao consumidor, tendo como lastro de garantia a remuneração paga pelo Estado do Ceará;

IV- ao compromisso do servidor beneficiário de participar em curso de educação fiscal;

V- ao compromisso do servidor beneficiário de colaborar com a administração fazendária estadual noticiando fatos que possam configurar irregularidades fiscais dos quais o servidor tenha ou venha a ter conhecimento;

VI- ao compromisso do servidor beneficiário de colaborar com a administração fazendária estadual mediante o fornecimento de cópias de notas fiscais, faturas de cartão de crédito e outros documentos de operações realizadas como consumidor final em atividades econômicas cuja fiscalização seja de interesse da administração fazendária, referentes a fatos geradores ocorridos nos cinco (5) anos anteriores e posteriores à assunção de sua dívida pelo Estado do Ceará.

 

§ 1º. Para efeito de verificação da recuperação da capacidade de solvência, o servidor passará a apresentar anualmente cópia de sua declaração anual de ajuste do imposto de renda ou outro documento equivalente a órgão designado no próprio termo de compromisso.

 

§ 2º No termo de compromisso prestado pelo servidor, poderá ficar consignado que o descumprimento do compromisso assumido com o Estado do Ceará de colaborar com a administração fazendária na forma dos incisos IV, V, deste artigo, acarretará ao servidor desconto na remuneração para ressarcimento ao Erário do valor despendido na assunção de sua dívida, respeitado o limite legal de desconto previsto em lei específica.

 

§ 3º. Os requerimentos serão despachados em ordem cronológica de sua apresentação, respeitadas as prioridades previstas na legislação própria, aplicando-se as demais disposições da Lei 9.826/74 no processamento do pedido.

 

§ 4°. A publicação do ato de deferimento do requerimento conterá o nome e o número do C.P.F. do servidor beneficiado, o nome e o número do C.N.P.J. da(s) entidade(s) credora(s), o nº do(s) contrato(s) e/ou ou menção do instrumento representativa da dívida, o(s) valor(es) da(s) dívida(s) e o percentual da dívida que será assumido pelo Estado do Ceará de acordo com o disposto no art.6º desta Lei.

 

Art. 9º. Publicado o despacho de deferimento do requerimento do servidor, os autos do processo serão encaminhados à Secretaria de Planejamento e Gestão para cessar os descontos na remuneração do servidor decorrente de empréstimo consignável proporcionalmente ao montante assumido pelo Estado do Ceará na forma do art.6º desta Lei, processando as demais medidas para assunção da obrigação pelo Estado do Ceará.

 

§ 1º. Concomitantemente à celebração do ato de assunção da dívida pelo Estado do Ceará, a Secretaria de Planejamento e Gestão dará ciência à entidade credora do compromisso assumido pelo servidor com o Estado, para que a entidade não celebre nova operação de crédito com o servidor até decorrido o prazo do compromisso prestado pelo servidor na forma do inciso III do art.7º desta Lei, sob pena de rejeição da consignação decorrente da nova transação, o que ficará consignação no instrumento de assunção da dívida.

 

§ 2º. Se a dívida decorrente da operação de crédito direto ao consumidor-CDC, a Secretaria de Planejamento e Gestão providenciará a assunção de dívida junto à entidade credora, dando-lhe ciência do compromisso assumido pelo servidor com o Estado do Ceará na forma do inciso III do art. 7º desta Lei.

 

§ 3º. No caso do parágrafo anterior, se for feita nova operação de CDC entre a credora e o servidor beneficiado pela assunção da dívida durante o período aludido no compromisso prestado pelo servidor na forma do inciso III do art.7º desta Lei, ficará facultado ao Estado depositar a remuneração do servidor em conta corrente diversa daquela existente na entidade credora, para impedir novos descontos sobre sua remuneração.

 

§ 4º. A Procuradoria Geral do Estado prestará colaboração à Secretaria de Planejamento e Gestão para cumprimento das disposições constantes nos parágrafos anteriores.

 

Art.10. Nos termos do inciso X do art.50 da Constituição Estadual, nas atividades financeiras realizadas para execução desta Lei, o Poder Executivo fica autorizado a:

 

I- Dá-lhes o mesmo tratamento contábil, orçamentário, financeiro e fiscal que é dado às operações de crédito a fundo perdido;

II- Enquadrá-las como medidas afins às ações previstas no Eixo Economia para uma vida melhor do PPA 2012/2015, para reabilitação do servidor público estadual, enquanto agente econômico local que consome bens e serviços produzidos pela economia cearense para satisfação de suas necessidades e de seus familiares, gerando rendas e oportunidades de trabalho, dispondo apenas de sua remuneração para este fim;

III- Considerá-las como despesas irrelevantes, para efeitos do §3º do art.16 da LC 101/2000, em relação ao valor global do orçamento do exercício onde estão sendo realizadas;

IV- Atendê-las na forma do art.39 e do art.40 da Lei 14.983, de 11 de agosto de 2011, LDO 2012, utilizando inclusive créditos orçamentários da reserva de contingência;

V- Custeá-las preferencialmente com os recursos previstos no inciso I do art.157 da Constituição Federal e aqueles já existentes no Erário em decorrência da venda da folha de pagamento dos servidores às instituições financeiras.

 

Art. 11. O Poder Executivo poderá editar normas complementares para facilitar a aplicação da presente Lei, com o objetivo de que atinja os fins administrativos, sociais e econômicos aos quais se destina.

 

§ 1º. A Secretaria de Planejamento e Gestão, a Secretaria da Fazenda e a Procuradoria Geral do Estado poderão elaborar ato conjunto para orientar seus servidores sobre a operacionalização das disposições do art.9º e no art.10 durante a execução desta Lei.

 

§ 2º. O Conselho Estadual de Desenvolvimento Econômico do Ceará, a Secretaria Estadual do Trabalho e Desenvolvimento Social e a Agência de Desenvolvimento Econômico do Ceará poderão contribuir para a edição dessas normas complementares em seus aspectos sócio-econômicos.

 

Art. 12. A Defensoria Pública designará membro(s) para acompanhamento das negociações das dívidas dos servidores beneficiados entre a Secretaria de Planejamento e Gestão e as entidades credores na forma do art. 9º desta Lei.

 

Parágrafo Único. A Defensoria Pública poderá adotar medidas extrajudiciais e judiciais quando forem detectadas as hipóteses previstas nos arts. 145/157 e no art. 884 do Código Civil, bem como quando forem detectadas condutas contrárias às normas do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, devendo a Defensoria Pública comunicar os fatos e solicitar medidas fiscalizadoras ao Banco Central do Brasil.

 

Art. 13. Fica ainda o Poder Executivo autorizado a elaborar projeto de lei delegada para aperfeiçoamento desta Lei, desde que o projeto elaborado respeite suas finalidades, presente em suas disposições e na justificativa constante em seu projeto.

 

Art.14. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, aplicando-se aos endividamentos existentes até esta data, principalmente àquelas dívidas cujos montantes foram afetados em decorrência dos efeitos da aplicação do Decreto Estadual nº: 29.760, de 21 de maio de 2009, publicado em 25 de maio de 2009.

 

 

ELIANE NOVAIS

DEPUTADA

 

 

 

JUSTIFICATIVA

 

 

Amparado em disposições da Constituição Federal e da Constituição Estadual, o presente projeto de lei autorizadora é uma contribuição legislativa para instrumentalizar o Estado do Ceará, pessoa jurídica de direito público interno, com normas jurídicas e recursos públicos para o enfrentamento da problemática estadual de endividamento dos servidores, através do exercício da função econômica estabilizadora e distributiva por parte do Governo do Estado do Ceará.

 

Dispõe a Constituição do Estado do Ceará que:

 

TÍTULO III

DA ORGANIZAÇÃO ESTADUAL

CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES GERAIS

 

Art. 14. O Estado do Ceará, pessoa jurídica de direito público interno, exerce em seu território as competências que, explicita ou implicitamente, não lhe sejam vedadas pela Constituição Federal, observados os seguintes princípios:

 

(...)

 

I – respeito à Constituição Federal e à unidade da Federação;

II – promoção da justiça social e extinção de todas as formas de exploração e opressão, procurando assegurar a todos uma vida digna, livre e saudável;

 

(...)

 

XIII – remuneração condigna e valorização profissional dos servidores públicos;

 

(...)

 

Art. 50. Cabe à Assembléia Legislativa, com a sanção do Governador do Estado, dispor acerca de todas as matérias de competência do Estado do Ceará, especialmente sobre:

 

(...)

 

I – sistema tributário, arrecadação e distribuição de rendas;

II – plano plurianual, diretrizes orçamentárias, orçamento anual, operações crédito e dívida pública;

 

(...)

 

X – atividades financeiras em geral;

 

TÍTULO VIII

DAS RESPONSALIDADES CULTURAIS, SOCIAIS E ECONÔMICAS

CAPÍTULO I

DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

 

Art. 214. OEstado conjuga-se às responsabilidades sociais da Nação soberana para superar as disparidades cumulativas internas, incrementando a modernização nos aspectos cultural, social, econômico e político, com a elevação do nível de participação do povo, em correlações dialéticas de competição e cooperação, articulando a sociedade aos seus quadros institucionais, cultivando recursos materiais e valores culturais para o digno e justo viver do homem.

 

Por outro lado, dispõe a Constituição Federal que:

 

A Constituição Federal dispõe que:

 

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

 

(...)

 

IV - salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim;

 

(...)

 

Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.

 

(...)

 

§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.

 

CONSTA MENSAGEM DO PLANO PLURIANUAL 2012/2015, APROVADO POR ESTA CASA DE LEIS:

 

Diretrizes Estratégicas de Governo

 

(...)

 

Fundamentando-se nas premissas de aperfeiçoar o que teve bons resultados e assegurar a continuidade das conquistas da primeira gestão, avançar na correção das políticas públicas e inovar com poder criativo os programas e projetos, o Governo elegeu como desafio a ampliação das oportunidades econômicas e sociais, com avanço das instituições democráticas, em sintonia com o projeto nacional de desenvolvimento econômico com justiça social. O desafio maior do Governo consiste, portanto, em superar as desigualdades sociais e econômicas do Estado, o que necessariamente implica reduzir de forma drástica a população vivendo em condições de extrema pobreza. De outra forma, o Governo não deixará de priorizar as estratégias políticas de continuar crescendo com destaque no cenário nacional, porém com distribuição de riqueza, perseguindo, assim, o crescimento econômico com inclusão social.

 

(...)

 

EXISTE HOJE UM GRANDE CLAMOR SOCIAL NACIONAL POR MEDIDAS DOS PODERES PÚBLICOS PARA CONTER AS AVASSALADORAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO QUE COMPROMETEM O CARÁTER ALIMENTAR DA REMUNERAÇÃO PARA AQUELES QUE TEM COMO ÚNICA FONTE DE RENDA SEU TRABALHO, AUMENTANDO ASSIM A INCIDÊNCIA DA POBREZA E MESMO DA MISÉRIA ENTRE AQUELES QUE TÊM BAIXA REMUNERAÇÃO E RENDA:

 

Os bancos e a penhora de salários

 

Jorge Folena

 

No artigo postado em 10/07/2010, sobre a abusiva cobrança de juros, alguns leitores solicitaram esclarecimentos quanto à penhora de salários feita por bancos.

 

A lei do empréstimo consignado (10.820/2003) autoriza o desconto em folha de pagamento dos valores tomados pelos trabalhadores junto à instituição bancária.

 

Todavia, mesmo assim os bancos induzem seus clientes, em muitos casos funcionários públicos, a utilizar o limite de crédito, por meio de cheque especial ou outras modalidades de concessão de financiamento sem maiores formalidades, para ampliar o seu endividamento e apropriar-se de seus vencimentos.

 

Em conseqüência desta “facilitação”, os correntistas ficam presos aos bancos, pagando indefinidamente juros extorsivos e taxas bancárias, indevidamente “descontadas” sobre seus vencimentos, aposentadorias e pensões.

 

Há casos em que o correntista é obrigado a contrair empréstimo com outras instituições financeiras para tentar quitar a dívida original com o banco que, sem dúvida, pode conduzir sua vida pessoal e familiar à indignidade, pois lhe retira a autonomia do que fazer com o próprio salário e cria dificuldades para suprir suas necessidades fundamentais, como alimentação, educação, vestuário, lazer etc.

 

Isto porque a instituição financeira captura como se fosse sua qualquer quantia que ingresse na conta corrente do cliente. Ou seja, mal ingressa o crédito, seja proveniente de salário ou de outra natureza, o banco executa forçadamente a suposta dívida, apoderando-se de tudo.

 

A conduta dos bancos, de reter e se apropriar indevidamente de verbas de natureza salarial dos clientes, contraria o artigo 649, IV, do Código de Processo Civil, uma vez que o salário, proventos e pensões têm natureza alimentar, sendo impenhoráveis.

 

Tribunais da vida e direito de todos

 

As instituições financeiras se aproveitam do sistema, que obriga os empregados a receber seus vencimentos através de agência bancária e, assim, se enriquecem à custa do trabalho.

 

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem manifestado que:

 

“Não pode o Banco se valer da apropriação no salário do cliente depositado em sua conta corrente, como forma de compensar-se da dívida deste em face do contrato de empréstimo inadimplido, eis que a remuneração, por ter caráter alimentar, é imune a constrição dessa espécie, ao teor do disposto no art. 649, inciso IV, da lei processual civil, por analogia corretamente aplicado à espécie pelo Tribunal a quo” (4ª Turma, REsp 353.291-RS, rel. Min. Aldir Passarinho)

 

“Mesmo com cláusula contratual permissiva, a apropriação do salário do correntista pelo credor para pagamento do cheque especial é ilícita e dá margem à reparação de dano moral.” (3ª Turma, REsp 507.044-AC, rel. Min. Humberto Gomes de Barros)

 

“O banco não pode apropriar-se da integralidade dos depósitos bancários feitos a título de salários, na conta corrente de seu cliente, para cobrar-se de débito decorrente de contrato bancário, ainda que para isso haja cláusula permissiva no contrato de adesão.” (3ª Turma, REsp 492.777-RS, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar)

 

Além disso, o ato dos bancos viola as normas da Constituição Federal referente à proteção ao salário (artigo 7º, IV, VI e VII), de repercussão geral na ordem econômica e jurídica, pois alcança o imenso contingente de cidadãos brasileiros que se encontram em idêntica situação.

 

Com efeito, é nula qualquer cláusula contratual padrão que autorize a instituição financeira a descontar empréstimo decorrente de limite de crédito em conta corrente (artigo 51, incisos I e IV, § 1º, incisos I a III, do Código do Consumidor).

 

Desta forma, a instituição financeira deve restituir em dobro as verbas salariais apropriadas com violação à Constituição Federal, ao Código de Processo Civil e ao Código do Consumidor, acrescidas dos respectivos encargos legais, respondendo ainda por danos morais, mesmo que o cliente esteja em débito, porque o direito determina que qualquer cobrança deve ser feita pelos meios normais, com a intervenção do Poder Judiciário, e não a manu militari, como fazem os bancos nestes casos, que não são típicos de empréstimo consignado.

 

Se até o poder público tem que recorrer ao judiciário para executar seus créditos, por que deveria ser diferente com os bancos?

 

(htpp://www.tribunadaimprensa.com.br/?p=10035) - Os bancos e a penhora salário, Jorge Folena.

 

Se o Governo Estadual, cujo alcance é regional, não fizer nada para garantir essas mesmas disposições constitucionais de proteção à renda do trabalhador dentro do território cearense, de maneira a impedir o franco processo de exclusão social em que se encontram servidores endividados juntamente com seus familiares espalhados por todo o Estado do Ceará, o que será feito por outros poderes públicos locais e pelo setor privado para combater essa mesma situação?

 

A iniciativa, o exemplo deve partir do Poder Público Estadual, que cuida dos interesses regionais, mediante o desenvolvimento de ações para tutelar esses direitos constitucionais de seus próprios servidores, para que sirva de exemplo para os governos locais e mesmo para o setor privado, pois há servidores estaduais que estão sendo privados de sua remuneração, sua única fonte de renda, de maneira integral ou quase integral, não podendo mais sequer mais dispor de sua renda para satisfação de suas necessidades básicas e de seus familiares;

 

O único rendimento do trabalhador público endividado está sendo integralmente alienado e tornado indisponível por seus credores, através de simples operações de débito em conta corrente permitindo que as entidades credoras se apropriem integralmente da remuneração do servidor para pagamentos de dívidas;

 

Como então podem prevalecer tais direitos e garantias constitucionais para servidores estaduais endividados no âmbito do Estado do Ceará?

 

Assim, a presente lei autorizadora vem aparelhar o Estado do Ceará com normas e recursos para solução dessa ofensa à dignidade da pessoa humana do servidor público e dos seus dependentes que vem ocorrendo em Território cearense.

 

Trata-se de uma verdadeira situação de escravidão moderna na Terra da Luz, a qual agora é oficializada através de operações de crédito pessoal entre os servidores e seus credores permitindo que os últimos se apropriem do produto do trabalho de um mês inteiro do servidor, representado por sua remuneração, que passou a servir apenas para pagar empréstimos consignáveis e dívidas de operações de créditos diretos ao consumidor aos especuladores financeiros, onde o dinheiro remunera o dinheiro, sem qualquer proveito para os demais segmentos da economia cearense, dinheiro que deixa de ser utilizado para consumo, produção, investimentos, geração de emprego e renda, apenas para enriquecer mais quem está rico e dispõe de muito dinheiro para emprestar a terceiros.

 

O problema é muito sério e a intervenção oficial através do Decreto Estadual nº: 29.760, de 21 de maio somente através da função regulatória do Governo, não se mostrou suficiente de 2009, para solucionar a problemática de endividamento dos servidores com comprometimento de sua remuneração e do suprimento de suas próprias necessidades e de seus familiares.

 

Então, deve ser feita agora uma intervenção oficial dentro da função estabilizadora e da função distributiva do Governo Estadual na economia regional, intervindo pelo lado mais fraco, o servidor de baixa de remuneração que tomou empréstimos e agora está endividado, de maneira a reequilibrar minimamente esta relação tão desigual entre aqueles que estão no mercado especulando para ganhar mais dinheiro e outros que estão ficando sem o próprio alimento, para que o capital especulativo possa ser remunerado.

 

Esta situação de endividamento dos servidores tem contribuído para que alguns adoeçam seriamente e mesmo que outros cometam o suicídio pela impotência diante da situação de insolvência e inadimplência a que foram reduzidos, desesperados ao verem a remuneração ser integralmente apropriada por uma instituição financeira através de uma simples operação de débito em conta corrente, ficando o servidor sem um único centavo para fazer frente às demais despesas necessárias à sobrevivência durante o mês e nem expectativa de uma realidade diferente no próximo mês, nem nos meses seguintes, sem a possibilidade de contrair mais nenhuma operação de crédito para satisfação de suas necessidades, devendo na praça e com seu nome inscrito em cadastros de inadimplentes, o que não é bom nem para a credibilidade da administração pública e nem do servidor e de seus familiares.

 

Muitas greves, paralisações prejudiciais aos serviços públicos estaduais que têm sido vivenciadas pela sociedade cearense nos últimos dias são originárias dessa problemática do endividamento dos servidores com comprometimento integral da remuneração.

 

Isto para não falar da exposição da sociedade cearense e dos servidores endividados reféns de práticas administrativas ilícitas como suborno, concussão, corrupção, extorsão, aliciamento eleitoral, tudo isto em desacordo com os consagrados princípios administrativos do art.37 da Constituição Federal.

 

Enquanto verba de caráter alimentar a remuneração goza de proteção constitucional, insuscetível de apropriação por meio de retenção dolosa ou mesmo de ato judicial constritivo.

 

Contudo, o que temos visto são instituições financeiras que atuam em nosso território se locupletarem a remuneração dos servidores através de empréstimos consignáveis e crédito direto ao consumidor, através de simples atos civis, que desrespeitam o caráter alimentar da remuneração do servidor estadual.

 

Longe de estimular novas aventuras creditícias por parte do servidor auxiliado, este projeto de lei propõe uma reabilitação responsável do servidor público endividado enquanto agente econômico e o reeduca o servidor para a realidade do mercado, organizando suas finanças pessoais e domésticas, mostrando ainda ao servidor a importância de sua contribuição para melhoria das finanças públicas estaduais.

 

Trata-se assim de uma medida relevante para reinclusão do servidor endividado no contexto econômico local e regional, posto que municípios cearenses frágeis economicamente diminutos que têm nos servidores públicos estaduais expressivos agentes econômicos locais, que ingressam no mercado com a renda de sua remuneração para satisfação de sua própria necessidade e de seus familiares.

 

Entretanto, se esta renda está comprometida para remuneração apenas de capital especulativo, como aqueles que fomentam os empréstimos consignáveis, muitas economias estão prejudicadas.

 

Assim, proteger a remuneração do servidor de baixa renda endividado é proteger a renda das famílias e sua importância para a economia local.

 

Isto tudo sem esquecer a questão da própria dignidade humana da pessoa do servidor estadual e de seus direitos sociais.

 

É necessária assim uma intervenção do Governo Estadual para reversão desta problemática, razão pela qual estamos apresentando esta proposição, para que o Governo Estadual esteja instrumentalizado com uma autorização legislativa para auxiliar financeiramente os servidores endividados com remuneração comprometida por anos, para pagarem empréstimos consignáveis, operações de créditos direito ao consumidor e outros operações de novação e renovação dessas obrigações.

 

UM PARAÍSO PARA AS ENTIDADES CREDORAS E UM INFERNO PARA OS SERVIDORES DEVEDORES, POIS SE A REMUNERAÇÃO SERVE COMO GARANTIA PARA REDUZIR O RISCO DE INADIMPLÊNCIA E PREJUÍZO PARA O CREDOR, PRIVA O SERVIDOR ENDIVIDADO E SUA FAMÍLIA DO BÁSICO DO MÍNIMO EXISTENCIAL ASSEGURADO PELO INCISO IV DO ART.7º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

 

É necessário assim que haja um ativismo legislativo para sanar esta problemática que tem repercussão jurídica, social, política e econômica, contribuindo para aumento dos indicadores de miséria e pobreza em nosso Estado.

 

Por tudo isto, é que apresentamos este projeto de indicação e conclamamos os nobres pares desta Casa para o aprovarem.

 

ELIANE NOVAIS

DEPUTADA