PROJETO DE LEI Nº _____53/2011
Dispõe sobre a adoção do juízo arbitral para a solução de litígio em que o Estado seja parte e dá outras providências.
A ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ DECRETA:
Art. 1°. O juízo arbitral, instituído pela Lei Federal n° 9.307, de 23 de setembro de 1996, para a solução de litígio em que o Estado seja parte, será efetivado conforme os procedimentos estabelecidos nesta Lei.
Art. 2°. O Estado e os órgãos e as entidades das
administrações estaduais direta e indireta poderão optar pela adoção do
juízo arbitral para a solução dos conflitos relativos a direito patrimonial
disponível.
Art. 3°. A inclusão de cláusula compromissória em contrato celebrado pelo Estado e a estipulação de compromisso arbitral obedecerão ao disposto na Lei Federal n° 9.307, de 1996, nas normas que regulam os contratos administrativos e nesta Lei, respeitados os princípios que orientam a administração pública, estabelecidos na Constituição da República e na Constituição do Estado.
Art. 4°. O juízo arbitral, para os fins desta Lei, instituir-se-á exclusivamente por meio de órgão arbitral institucional.
Art. 5°. São requisitos para o exercício da função de árbitro:
I - ser brasileiro, maior e capaz;
II - deter conhecimento técnico compatível com a natureza do contrato;
III - não ter, com as partes nem com o litígio que lhe for submetido, relações que caracterizem os casos de impedimento ou suspeição de Juízes, conforme previsto no Código de Processo Civil;
IV - ser membro de câmara arbitral inscrita no Cadastro Geral de Fornecedores de Serviços do Estado.
Art. 6°. Para os fins desta Lei , somente se admitirá a arbitragem de direito, instaurada mediante processo público.
Art. 7°. A arbitragem relativa aos contratos internacionais em que o Estado for parte atenderá às normas e aos tratados internacionais com eficácia no ordenamento jurídico nacional.
Art. 8°. O procedimento arbitral para a solução de litígio relativo a contrato, acordo ou convênio celebrado pelo Estado fica condicionado à existência de cláusula compromissória cheia ou à formulação de compromisso arbitral.
Art. 9°. O procedimento arbitral instaura-se mediante provocação de uma
das partes contratantes.
Art. 10. A câmara arbitral escolhida para compor litígio será preferencialmente a que tenha sede no Estado e deverá atender ao seguinte:
I - estar regularmente constituída por, pelo menos, três anos;
II - estar em regular funcionamento como instituição arbitral;
III - ter como fundadora, associada ou mantenedora entidade que exerça atividade de interesse coletivo;
IV - ter reconhecida idoneidade, competência e experiência na administração de procedimentos arbitrais.
Parágrafo único - As intimações relativas à sentença arbitral e aos demais atos do processo serão feitas na forma estabelecida pelas partes ou no regulamento da instituição arbitral responsável pela administração do procedimento.
Art. 11. No edital de licitação de obra e no contrato público constará
a previsão das despesas com arbitragem, taxa de administração da
instituição arbitral, honorários de árbitros e peritos e outros custos
administrativos.
Parágrafo único. As despesas a que se refere o caput deste artigo serão adiantadas pelo contratado quando da instauração do procedimento arbitral.
Art. 12. Ressalvado o disposto na legislação federal e nesta Lei,
prevalecerão as regras instituídas na regulamentação do juízo arbitral
institucional ao qual compete decidir a causa.
Art. 13. Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.
SALA DAS SESSÕES, EM 24 DE MARÇO DE 2011.
Deputado Estadual AUGUSTINHO MOREIRA
Presidente da Comissão de Meio Ambiente e Des. Semi-Árido
Partido Verde
JUSTIFICATIVA
O Poder Judiciário, responsável pelo exercício estatal da Jurisdição, encontra-se afogado de processos e apesar da competência de seus profissionais, mostra-se hoje em dia, em vários países, estrangulado, lento, burocrático e ineficaz.
Método conhecido internacionalmente para a solução pacífica de conflitos é a arbitragem, instituto ainda tímido em muitos países, mas que apresenta-se como mais capaz de proporcionar a tutela jurisdicional que o próprio meio judicial, por ser simples, menos custoso, eficaz e célere.
A prestação jurisdicional arbitral é uma alternativa ao direito fundamental ao acesso à Justiça e ganhou dimensões significativas a partir do avanço do processo de globalização.
Com o advento da Lei 9.307 de 23 de setembro de 1996 – Lei da Arbitragem - tivemos a positivação desta modalidade de solução alternativa dos litígios.
Para doutrina tradicional não se aplica a arbitragem nos contratos celebrados entre a Administração Pública e o particular, porque não há uma lei especifica prevendo esta aplicação, e, o administrador público só pode fazer o que a lei autoriza, já que está vinculado ao principio da legalidade.[i]
Entretanto, parte da doutrina entende que a utilização do juízo arbitral para solução de controvérsia existente entre a Administração Pública e o particular não agrediria o princípio da legalidade, pois a arbitragem está autorizada de forma genérica nos dispositivos legais existentes, entre eles o artigo 54 da Lei n. 8.666/93, o artigo 23, XV, da Lei nº 8.987/95, o artigo 1º da Lei nº 9.307/96, vejamos:
O artigo 54, caput, da Lei n. 8.666/93 dispõe que "os contratos administrativos de que trata esta Lei regulam-se pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público, aplicando-se-lhes, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito privado." r
O artigo 23, XV, da Lei n.º 8.987/95, por sua vez, menciona que "são cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas: XV - ao foro e ao modo amigável de solução das divergências contratuais." r
Considerando, ainda, que o artigo 1º da Lei no 9.307/96 ao dispor que "as pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis", não estabelece qualquer restrição a Administração Pública fica claro que a arbitragem foi contemplada nos diversos dispositivos legais existentes, não havendo necessidade de autorização legal específica. r
Registre-se, por oportuno, que a Lei 11.079 de 2006, art.11, inciso III, trouxe de forma expressa a possibilidade do emprego da arbitragem nos contratos celebrados pela Administração Pública:
"Art. 11. O instrumento convocatório conterá minuta do contrato, indicará expressamente a submissão da licitação às normas desta Lei e observará, no que couber, os §§ 3o e 4o do art. 15, os arts. 18, 19 e 21 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, podendo ainda prever:
I - exigência de garantia de proposta do licitante, observado o limite do inciso III do art. 31 da Lei no 8.666 , de 21 de junho de 1993;
II - (VETADO)
III - o emprego dos mecanismos privados de resolução de disputas, inclusive a arbitragem, a ser realizada no Brasil e em língua portuguesa, nos termos da Lei no 9.307, de 23 de setembro de 1996, para dirimir conflitos decorrentes ou relacionados ao contrato."
Este dispositivo veio reforçar a tese da possibilidade de aplicação da arbitragem nos contratos celebrados entre a Administração Pública e o Particular. r
Também não deve prosperar o argumento de que a arbitragem seria inconstitucional por ferir o principio da inafastabilidade do judiciário, previsto no artigo 5º, XXXV, da CF/88, pois o Supremo Tribunal Federal já decidiu que a arbitragem e a lei de arbitragem editada para regulamentá-la é perfeitamente constitucional.
"EMENTA: 1.Sentença estrangeira: laudo arbitral que dirimiu conflito entre duas sociedades comerciais sobre direitos inquestionavelmente disponíveis - a existência e o montante de créditos a título de comissão por representação comercial de empresa brasileira no exterior: compromisso firmado pela requerida que, neste processo, presta anuência ao pedido de homologação: ausência de chancela, na origem, de autoridade judiciária ou órgão público equivalente: homologação negada pelo Presidente do STF, nos termos da jurisprudência da Corte, então dominante: agravo regimental a que se dá provimento,por unanimidade, tendo em vista a edição posterior da L. 9.307, de 23.9.96, que dispõe sobre a arbitragem, para que, homologado o laudo, valha no Brasil como título executivo judicial. 2. Laudo arbitral: homologação: Lei da Arbitragem: controle incidental de constitucionalidade e o papel do STF. A constitucionalidade da primeira das inovações da Lei da Arbitragem - a possibilidade de execução específica de compromisso arbitral - não constitui, na espécie, questão prejudicial da homologação do laudo estrangeiro; a essa interessa apenas, como premissa, a extinção, no direito interno, da homologação judicial do laudo (arts. 18 e 31), e sua conseqüente dispensa, na origem, como requisito de reconhecimento, no Brasil, de sentença arbitral estrangeira (art. 35). A completa assimilação, no direito interno, da decisão arbitral à decisão judicial, pela nova Lei de Arbitragem, já bastaria, a rigor, para autorizar a homologação, no Brasil, do laudo arbitral estrangeiro, independentemente de sua prévia homologação pela Justiça do país de origem. Ainda que não seja essencial à solução do caso concreto, não pode o Tribunal - dado o seu papel de "guarda da Constituição" - se furtar a enfrentar o problema de constitucionalidade suscitado incidentemente (v.g. MS 20.505, Néri). 3. Lei de Arbitragem (L. 9.307/96): constitucionalidade, em tese, do juízo arbitral; discussão incidental da constitucionalidade de vários dos tópicos da nova lei, especialmente acerca da compatibilidade, ou não, entre a execução judicial específica para a solução de futuros conflitos da cláusula compromissória e a garantia constitucional da universalidade da jurisdição do Poder Judiciário (CF, art. 5º, XXXV). Constitucionalidade declarada pelo plenário, considerando o Tribunal, por maioria de votos, que a manifestação de vontade da parte na cláusula compromissória, quando da celebração do contrato, e a permissão legal dada ao juiz para que substitua a vontade da parte recalcitrante em firmar o compromisso não ofendem o artigo 5º, XXXV, da CF. Votos vencidos, em parte - incluído o do relator - que entendiam inconstitucionais a cláusula compromissória - dada a indeterminação de seu objeto - e a possibilidade de a outra parte, havendo resistência quanto à instituição da arbitragem, recorrer ao Poder Judiciário para compelir a parte recalcitrante a firmar o compromisso, e, conseqüentemente, declaravam a inconstitucionalidade de dispositivos da Lei 9.307/96 (art. 6º, parág. único; 7º e seus parágrafos e, no art. 41, das novas redações atribuídas ao art. 267, VII e art. 301, inciso IX do C. Pr. Civil; e art. 42), por violação da garantia da universalidade da jurisdição do Poder Judiciário. Constitucionalidade - aí por decisão unânime, dos dispositivos da Lei de Arbitragem que prescrevem a irrecorribilidade (art. 18) e os efeitos de decisão judiciária da sentença arbitral (art. 31)." (STF, SE-AgR 5206 / EP - ESPANHA, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, publicado no DJ 30-04-2004 PP-00029.)
O ministro Carlos Velloso, no voto proferido no acórdão acima mencionado, salientou que a arbitragem trata de direitos patrimoniais e, portanto, disponíveis. Segundo ele, as partes têm a faculdade de renunciar a seu direito de recorrer à Justiça. "O inciso XXXV representa um direito à ação, e não um dever".
O que o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional estabelece é que a lei não deve excluir da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a Direito, mas não proíbe que as partes interessadas excluam da apreciação judicial suas questões ou conflitos. A arbitragem é uma opção, uma faculdade, não há porque o Judiciário exigir que somente ele possa resolver conflitos sobre matéria objeto de arbitragem. Tanto é que muitas vezes conflitos de interesses são solucionados por acordo entre as partes, dentro ou fora do Judiciário. Não existe, nesses casos, a dicção do direito pelo Poder Judiciário. Portanto, a arbitragem não viola o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal. r
Por fim, também não há qualquer violação ao principio da indisponibilidade do interesse publico.
O artigo 1º da Lei nº 9.307/1996 (lei de arbitragem) estabelece que as pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis. Assim, numa análise superficial, poderia se concluir que a indisponibilidade do interesse público impossibilitaria a arbitragem. Mas, antes de qualquer conclusão precipitada é preciso entender que o simples fato de determinado contrato administrativo ser concebido no ente estatal não quer dizer que, indiscutivelmente, ele irá realizar interesse público. Isto porque a doutrina, nesse contexto, distingue os interesses públicos propriamente ditos - aqueles interesses primários do Estado, dos chamados interesses secundários.
Os interesses primários englobam a Administração Pública no real e genuíno exercício do seu ofício, como ente imparcial, enquanto que os interesses secundários são decorrência do desempenho das suas atividades de gestão, objetivando a higidez dos cofres públicos, ainda que isto afronte à lei.
De tal sorte, a presente proposta encontra respaldo na doutrina, jurisprudência e em outras legislações sobre a mesma temática em diversos estados brasileiros.
SALA DAS SESSÕES, EM 24 DE MARÇO DE 2011.
Deputado Estadual AUGUSTINHO MOREIRA
Presidente da Comissão de Meio Ambiente e Des. Semi-Árido
Partido Verde
[i] BARBOSA, Maiana Vaz do Amaral. A arbitragem na Administração Pública. Disponível em http://www.iuspedia.com.br 29 fev. 2008