PROJETO DE INDICAÇÃO ,85/11
Dispõe sobre a prestação de serviços de psicologia nas Escolas Públicas de Educação Básica do Estado do Ceará.
A Assembleia Legislativa do Estado do Ceará decreta:
Artigo 1º - Os estabelecimentos educacionais da rede pública estadual disporão de atendimento especializado de psicologia, com o objetivo de diagnosticar, prevenir e trabalhar os diversos problemas do cotidiano escolar que dificultam o processo de ensino-aprendizagem.
§ 1º - O atendimento de que trata o “caput” será extensivo a toda comunidade escolar da rede pública de educação básica do Estado do Ceará.
§ 2º - Aos alunos de programas educacionais especiais como EJA – Educação de Jovens e Adultos, Programa de Ensino à Distância e às classes especiais, será assegurado o atendimento objeto desta lei, de modo integral, sem prejuízo de outros programas da rede oficial de que possam ser beneficiários.
§ 3º - A comunidade escolar, contará com um serviço de psicologia escolar e educacional destinado a intervenção sobre demandas escolares apresentadas pela própria comunidade escolar, nas quais serão desenvolvidas atividades focadas especialmente com os seguintes objetivos:
1. melhoria e aprimoramento do desenvolvimento das atividades pedagógicas;
2. aprimoramento das habilidades desenvolvidas na relação professor-aluno, assegurando a integridade do bem-estar pessoal enquanto indivíduo e profissional;
3. inclusão social de crianças, jovens e adultos com deficiência na escola da qual fazem parte, em respeito aos Direitos Humanos;
§ 4º - Esta assistência psicológica atuará seguindo os parâmetros de uma política de intervenção teoricamente voltada nas bases de psicologia educacional, não se confundindo com a psicologia clínica.
Artigo 2º - Serão criados Centros de Referências em Psicologia Educacional em cada CREDE – Coordenadoria Regional de Desenvolvimento da Educação – para que todas as escolas sejam beneficiadas por esta lei.
Artigo 3º - Fica o Poder Executivo autorizado a criar os cargos e planos de carreira em número compatível com a estrutura da rede de ensino, de modo a garantir a assistência psicológica, que será prestada por profissionais devidamente habilitados funcionando da seguinte forma:
§ 1º - 1 (um) profissional de psicologia por cada município que integram os CREDE, no interior;
§ 2º - 1 (um) profissional de psicologia para cada 5 (cinco) escolas, na capital do Ceará;
Artigo 4º - O Poder Executivo, por intermédio da Secretaria de Estado da Educação, elaborará as normas, procedimentos, e demais ações necessárias à aplicação desta lei.
Artigo 5º - As despesas decorrentes desta lei correrão a conta de dotações próprias, consignadas no orçamento vigente.
Artigo 6º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Deputada Rachel Marques
Partido dos Trabalhadores - PT
JUSTIFICATIVA
O que justifica a proposta é a compreensão de que as condições psicológicas dos sujeitos participantes do processo educativo (educadores e educandos) e o modo como estão organizadas as escolas são interferentes diretos no processo de aprendizagem. Desta forma, a presença do psicólogo na equipe de trabalho escolar, coloca-se como necessária no sentido de oferecer suporte, de um lado para os educadores em suas buscas de estratégias para efetivar as práticas pedagógicas e, de outro, para os educandos em seus propósitos de alcançar a autonomia e a inclusão social.
Atualmente, uma série de fatos como repetência, relacionamentos, dificuldades dos professores, violência, evasão escolar, dentre outros, permeiam as intervenções dos psicólogos.
A atuação do psicólogo escolar é ampla e exige estudo das situações como no que diz respeito ao rendimento escolar. Sua atuação pressupõe uma compreensão que o fenômeno educativo é constituído por uma multiplicidade de fatores, que carecem de um processo reflexivo crítico, com vistas a compreensão das questões dentro de sua totalidade e não apenas com o foco em uma das partes. Muitas pesquisas apontam para a utilidade do psicólogo nas escolas, com sensível melhora dos processos quando existe a atuação deste profissional tanto no sentido de compreender as dificuldades do aluno, de sua inserção no mundo e ajudá-lo a superar dificuldades, como também orientar os professores e equipe pedagógica no sentido de potencializar sua atuação no ensino.
Sabemos que o processo de aprendizagem, especialmente na infância e adolescência, é profundamente influenciado pelas condições psicológicas das pessoas que dele participam - professores, servidores, alunos e familiares - e pela forma de organização e estrutura de funcionamento do estabelecimento de ensino.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990) dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente, considera que a criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais à pessoa humana, assegurando-lhes todas as oportunidades e facilidades a fim de facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade. Afirma ainda este documento, que deverá ter destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude, sendo considerada a precedência do atendimento nos serviços públicos.
A Lei nº 9.394, de 1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB), estabelece, em seu art. 2º, que é uma das finalidades da educação nacional “o pleno desenvolvimento do educando”. Certamente, a experiência escolar do cidadão deve ter alcance muito maior que a mera aquisição de informações em sala de aula. A concepção de educação escolar que fundamenta a LDB é aquela mais ampla, a que compreende ser objetivo da escola preparar o homem para explorar seu potencial ao máximo, ser cidadão atuante e enfrentar os desafios da profissão e da vida.
Assim, para o perfeito cumprimento do previsto na referida lei, é importante que os estudantes, seus familiares e os trabalhadores do ensino contem com o apoio sistemático de profissionais da área de psicologia nas escolas nacionais do ensino básico e do médio.
Certamente a educação escolar do cidadão tem uma abrangência maior do que a sala de aula. No passado recente, a sociedade e a família tinham condições de acompanhar a educação das crianças e adolescentes. Hoje, o ritmo de trabalho imposto a todos os indivíduos, os compromissos do mundo urbano e os desajustes familiares impulsionam mudanças que devem ocorrer em apoio ao processo educacional.
Vale ainda salientar que a atual Política de Inclusão definida pelo Ministério da Educação e Cultura, implementou uma importante mudança no cotidiano escolar, provocando principalmente junto aos educadores, dificuldades de adaptação ao novo modelo, provocando dificuldades na atuação educadora, desestabilizando emocionalmente muitos dos docentes, que embora percebam pontos positivos na medida, encaram o trabalho de forma altamente desafiadora, e temos nos estudos atuais já registros de índice elevado da Síndrome de Bournout, nesta categoria profissional.
No Ceará, os profissionais de psicologia exerce práticas nos Núcleos de Educação Especial, mas temos pleno conhecimento de que a intervenção do profissional de psicologia no contexto educacional regular, que atualmente recebe o aluno portador de deficiência, poderá contribuir tanto no aspecto formador do corpo docente, como na qualidade de mediador de conflitos no ambiente escolar, implementando processos que facilite o relacionamento interpessoal, entre docentes e alunos, entre os próprios alunos e entre os seus familiares.
Outro aspecto altamente significativo diz respeito à violência nas escolas, fenômeno que tem se tornado preocupante, principalmente o Bullying. Mapear os riscos e vulnerabilidades a que estão expostos tanto alunos como profissionais das escolas, o que muitas vezes poderia ser avaliado e receber intervenção psicológica que viabilizasse um desenvolvimento diverso que normalmente tem ocorrido. O que percebemos cotidianamente é a ampliação da sensação de impotência dos educadores e o avançar do descontrole emocional de alunos, docentes e familiares.
Consideramos ainda que outro grande desafio para a sociedade na atualidade, e evidentemente para as escolas, diz respeito à drogadicção. As pesquisas apontam que o início da adolescência é o momento de maior vulnerabilidade, e que experiências relatadas de programas de intervenção psicológica com debates e trabalhos junto aos alunos e orientações junto aos educadores, resultam positivamente.
Em 2002, no Ceará foi aprovada a Lei 13.230, que versava sobre prevenção sobre Violência Doméstica, criando as Comissões de Maus Tratos nas Escolas, onde assegurava assistência psicológica aos alunos, entretanto o profissional de psicologia não passou a compor a referida comissão, justamente por não existir até o momento de serviços de Psicologia Escolar e Educacional no Estado do Ceará.
Não se pode deixar de lado ainda o principal papel da escola, que trata-se do desenvolvimento da aprendizagem. Os registros apontam para um elevado índice de analfabetismo funcional, que aponta para a baixa produtividade e eficiência do processo de aprendizagem, e ainda a importante questão de distorção idade e série, que desafia o aluno a vivenciar um processo de desenvolvimento descompassado do processo de aprendizagem, fenômeno que entendemos poderia ser objeto de intervenção da psicologia educacional.
Segundo Cruces, na área escolar “convivem, lado a lado, modelos de atuações e práticas extremamente críticas e inovadoras e atuações permeadas pela visão curativa e individualizadas, que é denunciada por ser estigmatizadora” (2003). Provocando assim, a partir da década de noventa, estudos que buscam encontrar as condições e o preparo necessários ao profissional da Psicologia Educacional, e das Políticas Educacionais de forma a privilegiar uma prática que atenda aos interesses da educação para a cidadania.
A legislação e a constante mobilização nos debates das instituições acadêmicas ou representativas da psicologia, encaminhando a temática sobre o protagonismo social como linha norteadora para a ação do psicólogo, e balizador para ações que possam efetivamente contribuir para a emancipação das pessoas e compromisso com a transformação social.
De maneira geral, observa-se um aumento dos encaminhamentos das questões que envolvem a criança e o adolescente na escola, como se o problema fosse individual e específico de cada um deles, que por qualquer razão – que o psicólogo teria que avaliar – não acompanham o processo de aprendizagem ou não apresentam o perfil de comportamento esperado,
Como verificamos anteriormente, as funções do psicólogo trazem algumas distinções dependendo de sua área de atuação, o Catálogo Brasileiro de Ocupações (CBO) já trazia definições sobre as ações dos psicólogos, antes mesmo das resoluções do Conselho Federal de Psicologia, e assim encontramos:
0-74.25 Psicólogo Educacional
Atua, no âmbito da educação, realizando pesquisas, diagnósticos e intervenção psicopedagógica em grupo ou individual, procede ao estudo dos educadores e ao comportamento do aluno em relação ao sistema educacional, às técnicas de ensino empregadas e aquelas a serem adotadas, baseando-se no conhecimento dos programas de aprendizagem e das diferenças individuais para colaborar no planejamento de currículos escolares e na definição de técnicas de educação mais eficazes, a fim de uma melhor receptividade e aproveitamento do aluno e a sua auto-realização [...] participa do trabalho das equipes de planejamento pedagógico, currículo e políticas educacionais, concentrando sua ação nos aspectos que dizem respeito aos processos de desenvolvimento humano, da aprendizagem e das relações interpessoais e colaborando na constante avaliação e no redirecionamento dos planos e práticas educacionais, para implementar uma metodologia de ensino que favoreça a aprendizagem e o desenvolvimento [ ..] (CFP; 1999, p.141-142).
As taxas de evasão e repetência escolar, principalmente no Ensino Fundamental, infelizmente têm-se mantido constantes nos últimos anos. Sabemos que um dos fatores que causam o fracasso escolar está diretamente relacionado às precárias condições socioeconômicas e culturais da família das crianças com dificuldades de aprendizagem. Assim verificamos que uma ação efetiva com relação a todos os fatores expostos acima, somente terá êxito com a ação multiprofissional, principalmente do acompanhamento do(a) assistente social e do(a) psicólogo(a) educacional, como profissionais especializados, que visam ajudar à família, a escola e ao estudante a buscarem a redução das negativas conseqüências advindas dessas dificuldades existentes.
Acima de tudo buscamos com esta proposta, viabilizar um processo educacional que respeite a criança e o adolescente, auxiliando-os no seu desenvolvimento de forma livre, autônoma e saudável, de maneira a se tornar um adulto responsável. Compreendemos que a psicologia poderá efetivamente dar a sua contribuição neste processo, auxiliando a compreensão do fenômeno educativo através de uma leitura crítica da realidade social e educacional.
Pelas razões ora expostas, esperamos contar com o apoio de nossos ilustres pares no âmbito da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará para a aprovação do projeto em apreço.
Sala das Sessões, em 16 de maio de 2011.
Deputada Rachel Marques
Partido dos Trabalhadores - PT