PROJETO DE INDICAÇÃO Nº 36/14
Institui a Política Estadual sobre Mudança do Clima - PEMC e dá outras providências.
A ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ INDICA:
Art. 1º. Esta Lei institui a Política Estadual sobre Mudança do Clima - PEMC e estabelece seus princípios, objetivos, diretrizes e instrumentos.
Art. 2º. Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I - adaptação: iniciativas e medidas para reduzir a vulnerabilidade dos sistemas naturais e humanos frente aos efeitos atuais e esperados da mudança do clima;
II - efeitos adversos da mudança do clima: mudanças no meio físico ou biota resultantes da mudança do clima que tenham efeitos deletérios significativos sobre a composição, resiliência ou produtividade de ecossistemas naturais e manejados, sobre o funcionamento de sistemas socioeconômicos ou sobre a saúde e o bem-estar humanos;
III - emissões: liberação de gases de efeito estufa ou seus precursores na atmosfera numa área específica e num período determinado;
IV - fonte: processo ou atividade que libere na atmosfera gás de efeito estufa, aerossol ou precursor de gás de efeito estufa;
V - gases de efeito estufa: constituintes gasosos, naturais ou antrópicos, que, na atmosfera, absorvem e reemitem radiação infravermelha;
VI - impacto: os efeitos da mudança do clima nos sistemas humanos e naturais;
VII - mitigação: mudanças e substituições tecnológicas que reduzam o uso de recursos e as emissões por unidade de produção, bem como a implementação de medidas que reduzam as emissões de gases de efeito estufa e aumentem os sumidouros;
VIII - mudança do clima: processo direta ou indiretamente atribuído à atividade humana que altere a composição da atmosfera mundial e que se some àquela provocada pela variabilidade climática natural observada ao longo de períodos comparáveis;
IX - sumidouro: processo, atividade ou mecanismo que remova da atmosfera gás de efeito estufa, aerossol ou precursor de gás de efeito estufa; e
X - vulnerabilidade: grau de suscetibilidade e incapacidade de um sistema, em função de sua sensibilidade, capacidade de adaptação, e do caráter, magnitude e taxa de mudança e variação do clima a que está exposto, de lidar com os efeitos adversos da mudança do clima, entre os quais a variabilidade climática e os eventos extremos.
Art. 3º. A PEMC e as ações dela decorrentes serão executadas por órgãos da estrutura administrativa do Estado, cujas competências e finalidades tenham correlação com a temática, de forma intersetorial e interdisciplinar, em articulação com os Municípios, observados os princípios da precaução, da prevenção da participação cidadã, do desenvolvimento sustentável e o das responsabilidades comuns, porém diferenciadas e, quanto às medidas a serem adotadas na sua execução, será considerado o seguinte:
I - todos têm o dever de atuar, em benefício das presentes e futuras gerações, para a redução dos impactos decorrentes das interferências antrópicas sobre o sistema climático;
II - serão tomadas medidas para prever, evitar ou minimizar as causas identificadas da mudança climática com origem antrópica no território nacional, sobre as quais haja razoável consenso por parte dos meios científicos e técnicos ocupados no estudo dos fenômenos envolvidos;
III - as medidas tomadas devem levar em consideração os diferentes contextos socioeconômicos de sua aplicação, distribuir os ônus e encargos decorrentes entre os setores econômicos e as populações e comunidades interessadas de modo equitativo e equilibrado e sopesar as responsabilidades individuais quanto à origem das fontes emissoras e dos efeitos ocasionados sobre o clima;
IV - o desenvolvimento sustentável é a condição para enfrentar as alterações climáticas e conciliar o atendimento às necessidades comuns e particulares das populações e comunidades que vivem no território nacional;
V - as ações de âmbito estadual para o enfrentamento das alterações climáticas, atuais, presentes e futuras, devem considerar e integrar as ações promovidas no âmbito municipal por entidades públicas e privadas;
Art. 4º. A Política Estadual sobre Mudança do Clima - PEMC visará:
I - à compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a proteção do sistema climático;
II - à redução das emissões antrópicas de gases de efeito estufa em relação às suas diferentes fontes;
III - ao fortalecimento das remoções antrópicas por sumidouros de gases de efeito estufa no território
Estadual;
IV - à implementação de medidas para promover a adaptação à mudança do clima pelo Estado e Municípios, com a participação e a colaboração dos agentes econômicos e sociais interessados ou beneficiários, em particular aqueles especialmente vulneráveis aos seus efeitos adversos;
V - à preservação, à conservação e à recuperação dos recursos ambientais, com particular atenção aos biomas naturais do Estado Ceará;
VI - à consolidação e à expansão das áreas legalmente protegidas e ao incentivo aos reflorestamentos e à recomposição da cobertura vegetal em áreas degradadas;
Parágrafo único. Os objetivos da Política Estadual sobre Mudança do Clima deverão estar em consonância com o desenvolvimento sustentável a fim de buscar o crescimento econômico, a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais.
Art. 5º São diretrizes da Política Estadual sobre Mudança do Clima:
I – Contribuir com os compromissos assumidos pelo Brasil na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, no Protocolo de Quioto e nos demais documentos sobre mudança do clima dos quais vier a ser signatário;
II - as ações de mitigação da mudança do clima em consonância com o desenvolvimento sustentável, que sejam, sempre que possível, mensuráveis para sua adequada quantificação e verificação a posteriori;
III - as medidas de adaptação para reduzir os efeitos adversos da mudança do clima e a vulnerabilidade dos sistemas ambiental, social e econômico;
IV - as estratégias integradas de mitigação e adaptação à mudança do clima nos âmbitos local, regional e Estadual;
V - o estímulo e o apoio à participação dos governos federal, estadual e municipal, assim como do setor produtivo, do meio acadêmico e da sociedade civil organizada, no desenvolvimento e na execução de políticas, planos, programas e ações relacionados à mudança do clima;
VI - a promoção e o desenvolvimento de pesquisas científico-tecnológicas, e a difusão de tecnologias, processos e práticas orientados a:
a) mitigar a mudança do clima por meio da redução de emissões antrópicas por fontes e do fortalecimento das remoções antrópicas por sumidouros de gases de efeito estufa;
b) reduzir as incertezas nas projeções regionais futuras da mudança do clima;
c) identificar vulnerabilidades e adotar medidas de adaptação adequadas;
VII - a utilização de instrumentos financeiros e econômicos para promover ações de mitigação e adaptação à mudança do clima, observado o disposto no art. 6o;
VIII - a identificação, e sua articulação com a Política prevista nesta Lei, de instrumentos de ação governamental já estabelecidos aptos a contribuir para proteger o sistema climático;
IX - o apoio e o fomento às atividades que efetivamente reduzam as emissões ou promovam as remoções por sumidouros de gases de efeito estufa;
X - a promoção da cooperação nacional e internacional para o financiamento, a capacitação, o desenvolvimento, a transferência e a difusão de tecnologias e processos para a implementação de ações de mitigação e adaptação, incluindo a pesquisa científica, a observação sistemática e o intercâmbio de informações;
XI - a promoção da disseminação de informações, a educação, a capacitação e a conscientização pública sobre mudança do clima;
XIII - o estímulo e o apoio à manutenção e à promoção:
a) de práticas, atividades e tecnologias de baixas emissões de gases de efeito estufa;
b) de padrões sustentáveis de produção e consumo.
Art. 6º. São instrumentos da Política Estadual sobre Mudança do Clima:
I - o Plano Estadual sobre Mudança do Clima;
II - os Planos de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento nos biomas Caatinga e Mata Atlântica;
III - as resoluções da Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima;
IV - as medidas fiscais e tributárias destinadas a estimular a redução das emissões e remoção de gases de efeito estufa, incluindo alíquotas diferenciadas, isenções, compensações e incentivos, a serem estabelecidos em lei específica;
V - as linhas de crédito e financiamento específicas de agentes financeiros públicos e privados;
VI- o desenvolvimento de linhas de pesquisa por agências de fomento;
VII - as dotações específicas para ações em mudança do clima no orçamento do Estado;
VIII - os mecanismos financeiros e econômicos referentes à mitigação da mudança do clima e à adaptação aos efeitos da mudança do clima que existam no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e do Protocolo de Quioto;
IX - os mecanismos financeiros e econômicos, no âmbito nacional, estadual e municipal referentes à mitigação e à adaptação à mudança do clima;
X - as medidas existentes, ou a serem criadas, que estimulem o desenvolvimento de processos e tecnologias, que contribuam para a redução de emissões e remoções de gases de efeito estufa, bem como para a adaptação, dentre as quais o estabelecimento de critérios de preferência nas licitações e concorrências públicas, compreendidas aí as parcerias público-privadas e a autorização, permissão, outorga e concessão para exploração de serviços públicos e recursos naturais, para as propostas que propiciem maior economia de energia, água e outros recursos naturais e redução da emissão de gases de efeito estufa e de resíduos;
XI - os registros, inventários, estimativas, avaliações e quaisquer outros estudos de emissões de gases de efeito estufa e de suas fontes, elaborados com base em informações e dados fornecidos por entidades públicas e privadas;
XII - as medidas de divulgação, educação e conscientização;
XIII - o monitoramento climático do Estado Ceará;
XIV - os indicadores de sustentabilidade;
XV - a avaliação de impactos ambientais sobre o microclima e o macroclima.
Art. 7º. Os instrumentos institucionais para a atuação da Política Estadual de Mudança do Clima incluem:
I – o Conselho de Políticas e Gestão do Meio Ambiente - Conpam;
II - a Superintendência Estadual do Meio Ambiente – Semace;
III – a Secretaria da Ciência, Tecnologia e Educação Superior - Secintece;
IV - a Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos - Funceme;
V – o Fórum Cearense de Mudanças Climáticas e de Biodiversidade ;
VI - a Política Estadual de Prevenção e Combate à Desertificação;
VII- e o Programa de Educação Ambiental – PEACE
Art. 8º. As instituições financeiras oficiais poderão disponibilizar linhas de crédito e financiamento específicas para desenvolver ações e atividades que atendam aos objetivos desta Lei e voltadas para induzir a conduta dos agentes privados à observância e execução da PEMC, no âmbito de suas ações e responsabilidades sociais.
Art. 9º. Os princípios, objetivos, diretrizes e instrumentos das políticas públicas e programas governamentais deverão compatibilizar-se com os princípios, objetivos, diretrizes e instrumentos desta Política Estadual sobre Mudança do Clima.
Parágrafo único. Decreto do Poder Executivo estabelecerá, em consonância com a Política Estadual sobre Mudança do Clima, os Planos setoriais de mitigação e de adaptação às mudanças climáticas visando à consolidação de uma economia de baixo consumo de carbono, na geração e distribuição de energia elétrica, no transporte público urbano e nos sistemas modais de transporte interestadual de cargas e passageiros, na indústria de transformação e na de bens de consumo duráveis, nas indústrias químicas fina e de base, na mineração, na indústria da construção civil, nos serviços de saúde e na agropecuária, com vistas em atender metas gradativas de redução de emissões antrópicas quantificáveis e verificáveis, considerando as especificidades de cada setor, inclusive por meio do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo - MDL e das Ações de Mitigação Nacionalmente Apropriadas - NAMAs.
Art. 10. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 11. Revogam-se as disposições em contrário.
Sala das Sessões da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, em 31 de março de 2014.
ANTONIO CARLOS
DEPUTADO ESTADUAL
JUSTIFICATIVA
O Nordeste brasileiro ocupa 1.600.000 km2 do território nacional e tem incrustado em 59% da sua área o chamado “Polígono das Secas”, uma região semiárida de 940 mil km2, que abrange nove estados do Nordeste e enfrenta um problema crônico de falta de água e chuva abaixo de 800 mm por ano. Na região semiárida vivem mais de 20 milhões de pessoas, sendo a região seca mais densamente povoada do mundo. A região é um enclave de escassa precipitação, que abrange desde os litorais do estado do Ceará e do Rio Grande do Norte até o médio do rio São Francisco, com uma vegetação de Caatinga. A região semiárida é uma região heterogênea, sendo composta de muitos microclimas com diferentes espécies vegetais, que também incluem microclimas com remanescentes de Mata Atlântica. Essas regiões encontram-se ameaçadas pela pressão antrópica, com crescente degradação ambiental.
As mudanças climáticas trarão consequências sociais e econômicas sobre a região Nordeste do país, uma vez que o novo clima poderá influenciar a economia e o movimento migratório das populações nordestinas, que vão precisar se adaptar às novas condições climáticas.
Segundo revela o estudo “Mudanças Climáticas, Migrações e Saúde: Cenários para o Nordeste Brasileiro, 2000-2050”, há uma previsão de aumento médio na temperatura do Nordeste em 4 graus celsius e queda de 11,4% no Produto Interno Bruto (PIB) da região em 2050 em relação ao crescimento do PIB que seria verificado sem as mudanças climáticas, o que corresponderá a dois anos sem crescimento econômico, em decorrência somente do impacto negativo nas atividades agropecuárias. Os estados do Ceará, Paraíba, Piauí e Pernambuco terão suas áreas agricultáveis reduzidas em mais de 50%. Essas e outras razões indicadas pela pesquisa farão a população se deslocar para outras regiões do país ou mesmo dentro do próprio Nordeste, em busca de trabalho em setores da economia menos afetados pelas mudanças climáticas e de qualidade de vida.
A mudança global do clima é o resultado do aumento pela ação dos seres humanos da concentração na atmosfera dos chamados gases de efeito estufa, dióxido de carbono, metano, óxido nitroso e outros gases de origem industrial. Há evidência científica de que, pelo menos parcialmente, o aumento de cerca de meio grau Celsius na temperatura média da superfície do planeta observado nos últimos cento e cinqüenta anos já seja devido a emissões de gases de efeito estufa pela ação humana. Prevê-se que, no próximo século, esse aumento poderá chegar até três graus Celsius, acompanhado de um aumento do nível médio do mar de cerca de meio metro.
Os biomas cearenses abrigam uma porção da biodiversidade brasileira, constituindo importantes centros de biodiversidade pela combinação de índices importantes de riqueza e endemismo. Além das alterações recentes nas paisagens naturais, mudanças climáticas constituem uma ameaça à biodiversidade dos biomas cearense, com especial ênfase para aqueles predominantemente florestais e com riqueza de espécies e endemismos: a Caatinga e a Mata Atlântica.
Segundo a Rede Clima, as mudanças ambientais e climáticas globais, que vêm se intensificando nas últimas décadas, podem produzir impactos sobre a saúde humana com diferentes vias e intensidades. Algumas dessas mudanças impactam de forma direta a saúde e o bem estar da população, como a ocorrência de eventos extremos – secas, ondas de calor, furacões, tempestades, enchentes, dentre outros.
No entanto, na maior parte das vezes, esse impacto é indireto, sendo mediado por mudanças no ambiente como a alteração de ecossistemas, sua biodiversidade e de ciclos biogeoquímicos. Para se estabelecer políticas de saúde de adaptação às mudanças climáticas é necessário identificar esses mecanismos que atuam no agravamento ou atenuação dos efeitos das mudanças climáticas sobre a saúde.
O tema das energias renováveis é fundamental para controle das emissões de gases de efeito estufa em níveis global e nacional. Além disso, do ponto de vista do desenvolvimento científico e tecnológico, as possibilidades de expansão da produção de fontes renováveis no Brasil são uma realidade, visto que já perfazem atualmente aproximadamente 45% da matriz energética nacional.
A Rede Clima e sua sub-rede Recursos Hídricos iniciou seus trabalhos em junho de 2009 e tem como principal motivação a análise dos impactos das mudanças do clima sobre o regime hidrológico nas bacias dos principais biomas brasileiros. Pesquisas capazes de auxiliar nessa análise têm utilizado modelos matemáticos, climáticos e hidrológicos, como principais ferramentas para avaliação dos impactos. A maior parte dos estudos preocupa-se com a disponibilidade de água nas bacias para os diversos usos como abastecimento humano, industrial, geração de energia e irrigação. Um aspecto que deve ser explorado em maior profundidade é a influência da mudança do clima sobre eventos extremos que causam cheias ribeirinhas e urbanas, que trazem como consequência prejuízos para a população.
A maior parte dos estudos preocupa-se com a disponibilidade de água nas bacias para os diversos usos como abastecimento humano, industrial, geração de energia e irrigação. Um aspecto que deve ser explorado em maior profundidade é a influência da mudança do clima sobre eventos extremos que causam cheias ribeirinhas e urbanas, que trazem como consequência prejuízos para a população.
O Plano Estadual de Mudanças Climáticas tem o objetivo de balizar a identificação dos obstáculos e dos catalisadores de ações e políticas públicas, além de gerar e disseminar conhecimentos e tecnologias para que o Ceará possa responder aos desafios representados pelas causas e efeitos das mudanças climáticas no Estado.
É objetivo ainda do PEMC realizar estudos sobre os impactos das mudanças climáticas regionais no Ceará, com ênfase nas vulnerabilidades do estado, bem como estudar alternativas de adaptação dos sistemas sociais, econômicos e naturais cearenses às mudanças climáticas, levando-se em conta as seguintes temáticas: Agricultura, Biodiversidade e Ecossistemas, Cidades, Desenvolvimento Regional, economia, Energias Renováveis, Recursos Hídricos, Saúde, Serviços Ambientais dos Ecossistemas e Zonas Costeiras.
ANTONIO CARLOS
DEPUTADO ESTADUAL