PROJETO DE LEI 279.11

 

Dispõe SOBRE O Programa de Iniciação aos Direitos e Cidadania nas escolas públicas do estado do Ceará.

(LEI DJALMA PINTO)

 

Faço saber que a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará decreta:

Art. 1º Fica criado o Programa de Iniciação aos Direitos e Cidadania nas escolas públicas estaduais de ensino fundamental e médio do Estado do Ceará.

Art. 2º O Programa objetiva estimular na população em geral, nas crianças e nos adolescentes:

I - a compreensão e a vivência dos valores essenciais à harmonia na sociedade, tais como a virtude da justiça, que se resume em não fazer com o outro aquilo que alguém não deseja que lhe façam; 

II – a demarcação dos limites da liberdade, cujo término se dá no momento em que a ação praticada possa causar dano ao outro, não podendo assim ocorrer a sua fruição de forma absoluta;

III – a noção sobre a finalidade do Estado que se resume em realizar o bem estar da população, produzir as leis e dirimir os conflitos;

IV – a conscientização sobre a supremacia do interesse coletivo a exigir que o ocupante de qualquer função pública realize todas as suas ações, na busca do melhor para a comunidade, afastando o corporativismo de qualquer espécie, o seu interesse pessoal e o patrimonialismo.

Art. 3º O conteúdo pedagógico do Programa versará, dentre outros temas, prioritariamente sobre:

I - a defesa dos direitos fundamentais e seus respectivos deveres;

II - as garantias individuais;

III - os direitos do consumidor:

IV - da criança, do adolescente, da mulher e das minorias;

V - a proteção do meio ambiente;

VI – visão teológica da vida.

Art. 4º A Secretaria de Estado de Educação Básica do Estado do Ceará - SEDUC, poderá firmar convênios com as Universidades e Faculdades, públicas e particulares existentes no Estado do Ceará, e entidades do Terceiro Setor objetivando a elaboração de projetos, visando à implementação dos objetivos desta lei, bem como a cessão de material humano, para ministrar palestras, seminários e demais ações para a efetivação do Programa de Iniciação aos Direitos e Cidadania.

Art. 5º Poder Executivo poderá baixar Atos que se fizerem necessários para a regulamentação da presente lei.

Art. 6º Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Sala das sessões da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, em 11 de outubro de 2011.

Deputado Fernando Hugo

 

 

Justificativa

 

O Brasil vivencia um paradoxo que tem intrigado antropólogos, juristas, psicólogos, sociólogos, historiadores, os cidadãos que habitam a vasta extensão do seu território: o aumento crescente da violência e da compulsão pelo desvio de dinheiro público, paradoxalmente à difusão do saber nas diversas áreas do conhecimento.

As faculdades, responsáveis pela formação profissional, sobretudo pela propagação da Ciência do Direito, encontram-se instaladas em pequenos e grandes municípios de todos os Estados. A Constituição vigente é exaltada por juristas de diversos países como uma das melhores já produzidas em todo o planeta. Estudiosos do Direito enfatizam que todo o aparato normativo que o gênio humano é capaz de redigir, para a garantia de um bom governo e da paz social, encontra-se na ordem jurídica do Brasil neste começo de milênio. Invocam para comprovação dessa verdade as normas contidas nos arts. 3º e 37 da Constituição, que dispõem: 

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II - garantir o desenvolvimento nacional;

 III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”.

Para tornar-se realidade, o objetivo fundamental da República de promover o bem de todos e a construção da sociedade livre, justa e solidária, é imprescindível que cada brasileiro tenha noção da justiça como a mais sublime das virtudes, de liberdade e de solidariedade, sob pena de conhecer alguém todos os conceitos utilizados pela ciência do Direito, propagar as doutrinas criadas pelos jurisconsultos, repetir de cor a jurisprudência dos mais renomados tribunais, todavia, agir de forma desleal nas suas relações com terceiros, pautando suas ações na má fé e na astúcia, contribuindo, assim, para a desarmonia social.

Alguns, é certo, atribuem exclusivamente à família a missão de propagar os valores, ditados pela moral e pela ética, que são essenciais para a boa convivência. Somente àquela caberia estimular, nas crianças e nos jovens, o cultivo do respeito à doutrina universal dos deveres sem os quais os direitos assegurados se transformam em letra morta nos preceitos legais. É o caso da liberdade de ir e vir, exaltada no texto constitucional, mas impossível de ser desfrutada na sua integralidade em algumas periferias de grandes cidades, às quais sequer a polícia tem condições de acesso.

O egoísmo excessivo, a completa falta de noção acerca da supremacia do interesse coletivo sobre o individual e a ausência de qualquer compreensão sobre a finalidade do Estado de servir à coletividade e não ao interesse pessoal de quem atua em seu nome, estão na raiz da violência e da corrupção, que angustiam o País neste início do segundo milênio.

Por sua vez, educadores, sociólogos e psicólogos renomados são enfáticos em apontar a necessidade de iniciar-se, já na escola do ensino fundamental, a formação para a cidadania.  Assim compreendida a preparação do homem para conviver em sociedade sem causar danos aos seus semelhantes, através da conscientização de que desfruta não apenas de direitos assegurados pela ordem jurídica, mas igualmente de deveres que não podem ser esquecidos, sob pena de instalar-se o caos.

A propósito, adverte Paulo Freire com sua autoridade de grande educador:

“NÃO É POSSÍVEL PENSAR OS SERES HUMANOS LONGE, SEQUER, DA ÉTICA, QUANTO MAIS FORA DELA. ESTAR LONGE OU PIOR, FORA DA ÉTICA, ENTRE NÓS MULHERES E HOMENS, É UMA TRANSGRESSÃO. É POR ISSO QUE TRANSFORMAR A EXPERIÊNCIA EDUCATIVA EM PURO TREINAMENTO TÉCNICO É AMESQUINHAR O QUE HÁ DE FUNDAMENTALMENTE HUMANO NO EXERCÍCIO EDUCATIVO: O SEU CARÁTER FORMADOR. SE SE RESPEITA A NATUREZA DO SER HUMANO, O ENSINO DOS CONTEÚDOS NÃO PODE DAR-SE ALHEIO À FORMAÇÃO MORAL DO EDUCANDO. EDUCAR É FUNDAMENTALMENTE FORMAR”. (Pedagogia da Autonomia  - Saberes  Necessários à Prática Educativa, Editor Paz e  Terra, 2010, São Paulo-SP, p. 33).

De forma ainda mais enfática, observa ÉMILE DURKHEIM, em seu livro: A Educação Moral

“Podemos distinguir duas idades, duas fases da infância: a primeira, que ocorre quase inteiramente no âmbito da família ou da escola maternal, sucedâneo da família, como indica o próprio nome; a segunda, que se passa na escola primária, quando a criança começa a sair do círculo familiar e a se inserir no meio que a circunda. Esse é o período que designamos como segunda infância. Iremos tratar aqui com maior ênfase precisamente da educação moral neste período da vida. Esse é o momento do caráter moral. Mais cedo, a criança é ainda muito jovem; sua vida intelectual ainda é muito rudimentar e sua vida afetiva demasiadamente simples e pobre; nesse momento não se tem matéria mental suficiente para a constituição das noções e sentimentos relativamente complexos que estão na base dessa moralidade. (...) Nesse período só é possível uma propedêutica bastante geral, uma iniciação preliminar a um pequeno número de idéias simples e de sentimentos elementares. Inversamente, depois da segunda infância, quer dizer, depois da idade escolar, SE AS BASES DA MORAL JÁ NÃO ESTIVEREM CONSTITUIÍDAS, JAMAIS O SERÃO.

(...)

AO CONTRÁRIO DA OPINIÃO MUITO DIFUNDIDA DE QUE A EDUCAÇÃO MORAL DEVERIA COMPETIR À FAMÍLIA, CREDITO QUE O PAPEL DA ESCOLA NA EDUCAÇÃO É E DEVE SER DA MAIS ALTA IMPORTÂNCIA”. (Editora Vozes, Petrópolis- RJ 2008, p. 34).

A orientação desses renomados mestres, de forma enfática, é no sentido de que a escola não deve ter por atribuição apenas o preparo do homem para o exercício de uma profissão, que lhe propicie condições dignas de vida no plano material, mas, igualmente, deve prepará-lo para a cidadania a fim de contribuir para a solidificação da paz e da prosperidade na sociedade.

O art. 205 da Constituição dispõe:

“A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”

 

Sala das sessões da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, em 11 de outubro de 2011.

Deputado Fernando Hugo