PROJETO DE LEI N° 138.08
INSTITUI A POLÍTICA ESTADUAL DE COMBATE E PREVENÇÃO À DESERTIFICAÇÃO E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.
A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO CEARÁ.
D E C R E T A:
Art. 1º - Esta lei institui a Política Estadual de Prevenção e Combate à Desertificação, a qual tem por objetivos:
I - apoiar o controle ambiental nas áreas em processo de desertificação, por meio do estímulo ao uso sustentável dos recursos naturais, da conservação/ preservação do meio ambiente e do fomento de uma prática agroecológica adaptada às condições ambientais estaduais;
II - prevenir o processo de desertificação em áreas susceptíveis, recuperar/ remediar as áreas impactadas, em todo o território estadual;
III - instituir mecanismos de proteção, conservação e recuperação da flora/ fauna e de solos degradados, nas áreas de risco ou impactadas pela desertificação;
IV - estimular a política de gestão de recursos naturais que assegure a necessária integração territorial dessa gestão às ações de prevenção e combate à desertificação, articulando adequadamente os diferentes usos dos recursos naturais e a proteção do ambiente;
V - estimular o desenvolvimento de pesquisas científicas e tecnológicas voltadas ao aproveitamento sustentável dos recursos naturais;
VI - fomentar pesquisas e a ampliação do conhecimento sobre o processo de desertificação e a ocorrência de secas no Ceará;
VII - promover a agricultura familiar e a segurança alimentar nas áreas de risco ou afetadas pela desertificação;
VIII - promover a educação ambiental das comunidades afetadas e dos diferentes setores da população, inclusive gestores, sobre o problema da desertificação e sobre a promoção de tecnologias sociais de convivência com a seca;
IX - fortalecer as instituições responsáveis pelo combate à desertificação;
X - fomentar os sistemas agroecológicos, bem como a diversificação de produtos destinados ao consumo familiar e ao mercado.
Parágrafo único. Para efeitos desta Lei, entende-se por desertificação a degradação das terras nas zonas semi-áridas e sub-úmidas secas resultante de fatores diversos, entre os quais as variações climáticas e as atividades humanas capazes de causar redução ou perda da complexidade do solo e da produtividade biológica ou econômica, também deve-se entender a degradação da cobertura vegetal e o esgotamento dos recursos hídricos, tanto superficiais como subterrâneos.
Art. 2º - A Política Estadual de Combate e Prevenção à Desertificação deverá ser implantada com base nos seguintes princípios:
I - participação das comunidades impactadas ou situadas em áreas de risco no processo de elaboração e de implantação das ações de combate à desertificação;
II - incorporação do conhecimento tradicional sobre uso sustentável dos recursos naturais;
III - planejamento das ações com base na bacia hidrográfica e/ou aqüífera, em sintonia com as disposições do Plano de Gestão das Águas Superficiais e Subterrâneas;
IV – planejamento das ações de desenvolvimento agrário com base no processo de transição agroecológica;
V - integração entre ações locais, regionais estaduais e nacionais, visando otimizar a aplicação dos recursos financeiros, naturais e humanos;
VI - articulação com os planos, programas e projetos das diversas instituições (públicas, privadas), ONG’s, OSIP’s que tenham ações afins com a Política Nacional Prevenção e Combate à Desertificação e o Programa Nacional de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca (PAN-BRASIL), em especial aqueles dedicados à desenvolvimento agrário e à preservação/ conservação ambiental;
VII - cooperação entre órgãos de governo e organizações não-governamentais.
VIII - estímulo às inter-relações entre os procedimentos de aplicação da Política Nacional de Combate e Prevenção à Desertificação em consonância com a Convenção de Combate à Desertificação (CCD) e as convenções para a Conservação da Biodiversidade e Mudanças Climáticas (Aquecimento Global).
Art. 3º - Cumpre ao Poder Público:
I - diagnosticar o avanço do processo de degradação e desertificação ambiental nas áreas afetadas;
II - definir um plano de contingência para mitigação dos efeitos da degradação ambiental;
III - ampliar e alargar os apoios à manutenção dos sistemas agrícolas tradicionais geradores de externalidades ambientais positivas;
IV - estimular o uso sustentável dos recursos naturais e controlando a sua exploração, em especial a extração vegetal;
V - divulgar informações e capacitar as comunidades locais para a participação na tomada de decisões;
VI - capacitar os técnicos em extensão rural no tocante a sistemas de agricultura familiar e de agricultura e agroecológica;
VII - capacitar os agricultores, visando o empoderamento dos valores locais para fortalecer e garantir a participação social no processo de elaboração/implantação das ações;
VIII - estimular bancos comunitários de sementes de variedades tradicionais adaptadas à instabilidade climática e aos agroecossistemas, abastecidos pelos próprios produtores locais;
IX - estimular a troca de saberes entre técnicos extensionistas e agricultores, para disseminação de tecnologias de convivência com os recursos naturais;
X - estimular programas de educação ambiental voltados ao desenvolvimento de práticas agrícolas ambientalmente saudáveis, do associativismo, do cooperativismo e da agroecológica;
XI - estimular o desenvolvimento de agroindústrias baseadas em alimentos ambientalmente e culturalmente adaptados ao meio ambiente;
XII - estimular feiras de produtos agroecológicos de agricultura familiar;
XIII - criar e implantar unidades de conservação ambiental, de proteção integral e de uso sustentável;
XIV - estimular a manutenção e a recuperação das áreas de preservação permanente e de Reserva Legal, nos termos da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, que instituiu o Novo Código Florestal;
XV - reforçar e apoiar o fortalecimento de sistemas de prevenção de incêndios vegetais.
Art. 4º - Nas áreas susceptíveis à desertificação, o desenvolvimento agrário deverá priorizar as terras próximas a cursos de água e a obras hídricas e acessíveis aos mercados, assim como priorizar as nascentes e os entornos (mata ciliar) dos cursos de água.
Art. 5º- No tocante à agricultura irrigada, o Poder Público deverá:
I – Promover nas áreas suscetíveis à desertificação, o levantamento das áreas com potencial irrigável;
II - diagnosticar as áreas cujos solos sejam suscetíveis à salinização e acúmulo de compostos de sódio e fomentar a recuperação de solos afetados por salinização e acúmulo de compostos de sódio;
III - promover a agricultura familiar nos perímetros irrigados de projetos governamentais;
IV - difundir tecnologias poupadoras de água e controlar o desperdício de água nas áreas irrigadas;
V – Identificar os mananciais hídricos susceptível à eutrofização e assoreamento e promover o uso de sistemas eficientes de drenagem, nas áreas suscetíveis a salinização.
Art. 6º - No tocante à agricultura sequeiro, o Poder Público deverá:
I – apoiar as iniciativas de manejo florestal sustentável de uso múltiplo e manejo comunitário participativo das populações extrativistas;
II - incentivar o manejo sustentável dos recursos naturais, apoiando o desenvolvimento de sistemas agroflorestais e agrosilvopastoris diversificados e integrados como forma de conciliar a recuperação florestal e as atividades agrícolas.
Art. 7º - Esta Lei entra em vigor cento e oitenta dias após a data de sua publicação.
O Brasil é um dos cem países que assinaram a Convenção Internacional de Combate à Desertificação e à Seca, que foi promovida pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1993/1994. Essa Convenção foi adotada em continuidade à implementação das metas da Agenda 21.
Segundo a Agenda 21, define-se desertificação como "a degradação da terra nas zonas áridas, semi-áridas e sub-úmidas secas resultantes de fatores diversos tais como as variações climáticas e as atividades humanas" e degradação da Terra como "a degradação dos solos e dos recursos hídricos; a degradação da vegetação e da biodiversidade; e a redução da qualidade de vida da população afetada".
Os estados brasileiros mais afetados e mais sujeitos à desertificação de suas terras são do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo. As áreas do País, suscetíveis de desertificação e que se enquadram na Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação ocupam uma área total de 980.711,58 km2, o que representa 11,5 % do território nacional.
Apesar do grande potencial produtivo dessas regiões, fatores históricos e estruturais vêm condicionando seus padrões de organização social e exploração dos recursos naturais, provocando perdas econômicas e ambientais significativas, destruindo a produtividade da terra e contribuindo para o aumento da pobreza.
O desmatamento, que além de comprometer a biodiversidade, deixa os solos descobertos e expostos à erosão, ocorre como resultado das atividades econômicas, seja para fins de agricultura de sequeiro ou irrigada, seja para a pecuária, quando a vegetação nativa é substituída por pasto, seja diretamente para o uso da madeira como fonte de energia (lenha e carvão).
O uso intensivo do solo, sem descanso e sem técnicas de conservação, provoca erosão e compromete a produtividade, repercutindo diretamente na situação econômica do agricultor. A cada ano, diminuem a colheita, possibilidades de acumular reservas de alimentos para o período de estiagem. É comum verificar-se, no semi-árido, a atividade da pecuária ser desenvolvida sem levar em conta a capacidade de suporte da região, o que pressiona tanto pasto nativo como o plantado, além de tornar o solo endurecido, compacto.
A irrigação mal conduzida provoca a salinização dos solos, inviabilizando algumas áreas e alguns perímetros irrigados do semi-árido: o problema tem sido provocado tanto pelo tipo de sistema de irrigação, muitas vezes inadequado às características do solo, quanto, principalmente, pela maneira como a atividade é executada, fazendo mais um umedecimento que uma irrigação.
Além de serem correlacionados, esses problemas desencadeiam outros, de extrema gravidade para a região. É o caso do assoreamento de cursos d'água e reservatórios, provocado pela erosão, que, por sua vez, é desencadeada pelo desmatamento e por atividades econômicas desenvolvidas sem cuidados com o meio ambiente.
Em decorrência da degradação ambiental, os problemas econômicos crescem, principalmente no setor agrícola, com o comprometimento da produção de alimentos, além do custo quase incalculável de recuperação da capacidade produtiva de extensas áreas agrícolas e da extinção de espécies nativas.
Com o empobrecimento das regiões atingidas pela desertificação, estas se tornam frágeis frente às outras regiões do País, provocando a superexploração dos recursos disponíveis e a perda de seus técnicos que migram, principalmente, para o Sudeste, dificultando, ainda mais, a busca de soluções. Dentro desta perspectiva, pode-se esperar um aumento significativo de desnutrição, falência econômica, baixo nível educacional e concentração de renda.
Com isso, a população tende migrar para os maiores centros urbanos. Procurando condições mais favoráveis de sobrevivência, esses migrantes promovem o agravamento dos problemas de infra-estrutura (transporte, saneamento, abastecimento, dentre outros) já existentes nesses centros urbanos, além do impacto sobre oferta de emprego, educação, moradia e desestruturação das famílias.
Historicamente, as políticas públicas têm investido recursos financeiros para o combate à seca. No entanto, tais políticas têm se mostrado pouco eficientes para mudar a realidade da sofrida população nordestina. Um dos principais erros é considerar a seca um problema e buscar soluções somente quando ela já está instalada.
A seca é um fator climático natural daquela região e, portanto esse fator deve ser considerado na elaboração de todas as políticas públicas agrícola, de preservação ambiental, macroeconômicas, de expansão urbana, entre outras.
O que a região do Polígono das Secas precisa é ter instrumentos e recursos financeiros para conviver com o clima semi-árido. Muitas experiências bem sucedidas já foram realizadas pelas comunidades afetadas e temos vários centros de referência aptos a dar suporte técnico para a elaboração e a execução de projetos de desenvolvimento econômico e social sustentável naquela região, diminuindo o impacto negativo do clima.
Pelas razões expostas consideramos de elevada importância a participação dos nobres parlamentares no esforço para a aprovação do presente projeto de lei.
Sala das Sessões, 05 de junho de 2008.
Deputado Estadual Lula Morais
Líder do PC do B